Exame da Creatinina: O que é e para que serve

Dr. Pedro Pinheiro
Dr. Pedro Pinheiro

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Creatinina

Tempo de leitura estimado do artigo: 6 minutos

Exames para avaliar a função dos rins

A forma mais simples de avaliar o grau de funcionamento dos rins, chamado de taxa de filtração glomerular, é através da dosagem sanguínea de 3 biomarcadores chamados creatinina, ureia e cistatina C.

Quando os rins do paciente ficam doentes e a sua capacidade de filtrar o sangue fica comprometida, as concentrações de ureia, creatinina e cistatina C no sangue tendem a se elevar. Quanto mais alta forem esses valores, mais grave é a insuficiência renal.

Cada uma desses três biomarcadores tem características próprias:

  • Ureia: é um produto do metabolismo das proteínas e seu nível sanguíneo pode ser influenciado por diversos fatores, incluindo a função renal, grau de hidratação do paciente, dieta, saúde do fígado e catabolismo muscular. A ureia é um exame barato e amplamente disponível, porém, dos 3, é o menos confiável e não deve ser utilizada sozinha para avaliar a função renal.
  • Creatinina: é um produto da degradação da creatina muscular, sendo o exame tradicionalmente utilizado para estimar a taxa de filtração glomerular (TFG). A precisão da creatinina pode ser afetada por variações na massa muscular, ingestão de proteínas ou de suplementos de creatina. A creatinina é um marcador amplamente disponível e de baixo custo, sendo atualmente o mais utilizado para avaliar o funcionamento dos rins.
  • Cistatina C: recentemente, a cistatina C emergiu como um marcador alternativo da função renal. Produzida constantemente por todas as células nucleadas, ela é independente da massa muscular e parece ser menos afetada por fatores externos do que a creatinina. Esse exame, porém, é mais caro e a maioria dos médicos não-nefrologistas não está habituada a trabalhar com ele.

Por ser a creatinina o exame mais utilizado na prática médica para avaliar os rins, focaremos nesse marcador ao longo do artigo, explicando quais doenças podem causar sua elevação e como interpretar os seus resultados.

Atenção: não confundir creatinina com creatina. São nomes parecidos, mas as substâncias são diferentes. Se você procura informações sobre o suplemento alimentar creatina, seu texto é este: Suplementos de creatina fazem mal?

Informações em vídeo

Antes de seguirmos em frente com o nosso artigo, veja esse curto vídeo de 3 minutos, produzido pela equipe do MD.Saúde, que explica de forma simples a insuficiência renal e o exame da creatinina:

YouTube video

O que é a creatinina?

Nossos músculos precisam de energia para exercer suas funções. O “combustível” que gera esta energia é uma proteína chamada creatina fosfato, sintetizada a partir das proteínas da nossa alimentação. A creatina fosfato é produzida no fígado e posteriormente armazenada nos músculos.

A nossa musculatura está permanentemente em atividade, mesmo quando estamos em repouso. Isto significa que estamos o tempo inteiro consumindo creatina fosfato. A creatinina é uma espécie de lixo metabólico resultante deste consumo constante. Após a sua geração, a creatinina é lançada na corrente sanguínea, sendo eliminada do corpo na urina, através dos rins.

Resumindo este ciclo:
proteínas ingeridas na dieta → produção de creatina fosfato pelo fígado → consumo da creatina fosfato pelos músculos para geração de energia → produção de creatinina → eliminação da creatinina pelos rins.

Diariamente, cerca de 2% de toda creatina fosfato armazenada em nosso corpo é convertida em creatinina pelo metabolismo dos músculos. É essa creatinina resultante que dosamos nas análises de sangue.

Por que a creatinina serve para avaliar a função dos rins?

A creatinina é uma substância inócua no sangue, sendo produzida e eliminada de forma constante pelo organismo. Se o paciente mantém sua massa muscular mais ou menos estável, mas apresenta um aumento dos níveis de creatinina sanguínea, isso é um forte sinal de que o seu processo de eliminação do corpo está comprometido, ou seja, os rins estão com algum problema para excretá-la.

Se os rins não estão conseguindo eliminar a creatinina produzida diariamente pelos músculos, eles provavelmente também estarão tendo problemas para eliminar diversas outras substâncias do nosso metabolismo, incluindo toxinas. Portanto, um aumento da concentração de creatinina no sangue é um sinal de insuficiência renal.

A ureia é outra substância produzida no fígado, também como resultado da metabolização de proteínas da alimentação. Assim como a creatinina, a ureia também é eliminada pelos rins. Elevações nos níveis sanguíneos de ureia são um sinal de mau funcionamento dos rins. Geralmente dosamos ambas as substâncias para avaliar a função dos rins, mas a creatinina é mais específica e confiável.

Qual é a importância da dosagem da creatinina e da ureia?

Estima-se que existam, em todo mundo, milhões de pessoas com algum grau de disfunção dos rins; 70% destes nem sequer desconfiam que possam estar doentes. O método mais eficiente para se diagnosticar precocemente as doenças do rim é através da dosagem da creatinina.

Inúmeras doenças podem levar à doença renal crônica, mas seis delas correspondem a grande parte dos casos:

É muito comum nós médicos ouvirmos a seguinte frase:
— Ah, doutor, meus rins estão ótimos, eu urino muito bem e eles não doem.

Isto é um grande equívoco! A insuficiência renal crônica não costuma causar sintomas até fases bem avançadas da doença. O fato de não sentir dor nos rins não significa nada. Em geral, o rim só provoca dor quando há cálculo renal ou infecção. Todas as outras doenças renais não costumam cursar com dor nos rins.

Existe também o mito de que urinar bem é um sinal de saúde renal. Na verdade, o controle da água corporal é apenas uma das atribuições dos rins. Inicialmente, o rim torna-se incapaz de filtrar as toxinas, mas consegue eliminar água sem maiores problemas. A redução do volume da urina é um sinal muito tardio, que muitas vezes só ocorre depois que a insuficiência renal está muito grave e o paciente já precisa entrar em programa de hemodiálise.

Portanto, o fato de urinar bons volumes e a ausência de dor nos rins não é garantia de saúde dos mesmos (leia: 10 Sintomas dos rins).

A dosagem da creatinina é importante para se detectar a insuficiência renal em fases precoces, evitando, assim, as complicações da doença. Os rins, além do controle da água corporal, também agem no(a):

  • Excreção de substâncias sanguíneas, como remédios ou toxinas.
  • Níveis sanguíneos de eletrólitos, como potássio, sódio, magnésio, cálcio e fósforo.
  • Produção de hormônios que controlam os glóbulos vermelhos (hemácias).
  • Controle da massa dos ossos.
  • Controle da função da coagulação do sangue.
  • Controle do pH do sangue.
  • Controle da pressão arterial.

A insuficiência renal crônica é uma doença que costuma progredir lentamente e de forma silenciosa ao longo de anos, fazendo com que todas as funções acima estejam comprometidas. Não diagnosticar a doença renal precocemente significa não agir em tempo hábil sobre esses problemas.

Para saber mais detalhes sobre a insuficiência renal crônica, leia: Insuficiência renal crônica – Sintomas e tratamento.

Quem deve dosar?

Qualquer indivíduo sob risco de desenvolver doença renal deve dosar sua creatinina sanguínea. Isto inclui pessoas que apresentam:

  • Hipertensão.
  • Diabetes.
  • Idade maior que 50 anos.
  • História familiar de rins policísticos.
  • História familiar de glomerulonefrite.
  • História familiar de insuficiência renal crônica.
  • Uso crônico de anti-inflamatórios.
  • Infecção urinária frequente.
  • Cálculos renais de repetição.
  • Edemas (inchaços) sem causa definida.
  • Anemia sem causa definida.
  • Doenças cardíacas graves, principalmente insuficiência cardíaca.
  • Alterações na urina, como sangramento (urina cor de Mate ou Coca-Cola) ou excesso de espuma, que é um sinal de proteinúria.
  • Pessoas com emagrecimento, perda de apetite, náuseas matinais e fraqueza intensa sem causa aparente.
  • Obesos.
  • Fumantes.
  • Crianças com problema de crescimento.

Como saber se os rins estão funcionando adequadamente

Em geral, para avaliação dos rins, solicita-se a ureia e a creatinina conjuntamente. Todavia, a creatinina é um melhor marcador, já que a ureia pode vir alterada em casos de desidratação, uso de diuréticos, sangramento digestivo, alimentação rica em proteínas, doença do fígado, etc.

O raciocínio é simples: as duas substâncias (ureia e creatinina) são produzidas constantemente pelo organismo e são eliminadas pelos rins. Deste modo, a sua concentração mantém-se sempre estável. Se os rins passam a não funcionar bem, elas começam a acumular no sangue. Portanto, quanto pior for a função renal, mais elevados serão os valores de ureia e creatinina.

Além das dosagens de creatinina e da ureia, o médico também pode solicitar um exame simples de urina, chamado de EAS ou urina tipo 1.

Quais são os valores normais da creatinina?

Os níveis normais da creatinina variam entre 0,6 a 1,3 mg/dl. Esses valores, porém, não são absolutos e devem ser interpretados pelo seu médico.

Como a creatinina é produzida pelos músculos, pessoas musculosas apresentam taxas basais maiores. Um jovem esportista e musculoso pode apresentar até 1,4 mg/dl de creatinina sem ter doença renal, enquanto uma senhora idosa e magra, com 1,2 mg/dl, pode ter rins doentes.

Portanto, não se interpreta a creatinina como um valor absoluto. Deve-se levar em conta sexo, idade e peso do paciente. Em geral, porém, valores de creatinina acima de 1,5 ou 1,6 mg/dl são sinal de doença renal na imensa maioria dos casos.

Calcule a sua taxa de filtração glomerular

Através do resultado da creatinina, seu médico pode calcular a taxa de filtração glomerular (também chamada de clearance de creatinina), que é basicamente o volume de sangue filtrado pelo rim a cada minuto. Rins normais filtram até 180 litros de sangue por dia (aproximadamente 120 ml/min). Valores abaixo de 60 ml/min são indicativos de insuficiência renal crônica.

Abaixo fornecemos uma calculadora para você estimar sua taxa de filtração glomerular. O resultado abaixo é apenas uma estimativa, que deve ser confirmada por um médico.



Acesse as nossas calculadoras online na página: Calculadoras do clearance de creatinina (TFG).

Como baixar a creatinina?

Não há um medicamento específico para baixar a creatinina. É importante lembrar que a creatinina é apenas um marcador de disfunção dos rins. Não é a creatinina em si que faz mal ao organismo. Ela sobe quando os rins estão funcionando mal.

A recuperação da função renal é possível nos casos de insuficiência renal aguda, quando a agressão ao rim é pontual. Nestes casos, o tratamento deve ser direcionado à doença aguda que está provocando injúria aos rins.

Nos casos de insuficiência renal crônica, os rins já apresentam lesão irreversível por anos de agressão causada pelo diabetes, hipertensão, drogas tóxicas aos rins, etc. Sendo assim, é pouco provável que ainda exista a possibilidade de iniciar algum tratamento que recupere a função renal e, consequentemente, abaixe os valores da creatinina.

Dúvidas comuns

Quando a creatinina alta é preocupante?

Toda creatinina elevada deve ser valorizada. Na dúvida, a opinião de um nefrologista costuma ser útil. Valores entre 1,1 e 1,4 mg/dl podem ser causados por alguns medicamentos, dietas muito ricas em carnes, suplementos de creatinina ou podem ser normais em jovens com grande massa muscular. Valores acima de 1,5 mg/dl quase sempre indicam algum grau de lesão renal e sua causa deve ser investigada. Quanto mais elevado é o valor da creatinina, mais grave é a disfunção dos rins.

Creatina fosfoquinase é o mesmo que creatinina?

Não, a creatina fosfoquinase (CPK ou CK) e a creatinina são substâncias diferentes, cada uma com funções distintas no organismo e utilizadas em contextos clínicos diferentes.

A creatina fosfoquinase é uma enzima encontrada principalmente no coração, cérebro e músculos esqueléticos. A CPK desempenha um papel vital na produção de energia nas células musculares. A medição dos níveis de CPK no sangue é frequentemente usada para diagnosticar e monitorar várias condições que causam danos musculares, como infarto do miocárdio, distrofias musculares e lesões musculares agudas. Falamos da elevação da CPK no artigo: Rabdomiólise: causas, sintomas e tratamento.

Por outro lado, a creatinina é um produto residual da degradação da creatina, um composto envolvido na geração de energia rápida nas células musculares. A creatinina é filtrada pelos rins e excretada na urina. A dosagem de creatinina no sangue é um indicador da função renal, pois os rins são responsáveis pela sua eliminação do corpo.

Para que serve o exame de creatinina?

Em resumo, o exame de creatinina é utilizado principalmente para avaliar a função dos rins. A creatinina é produzida pelo metabolismo normal da creatina, uma substância encontrada nos músculos. Normalmente, os rins filtram a creatinina do sangue e a eliminam através da urina. Dessa forma, a medição dos níveis de creatinina no sangue oferece informações importantes sobre o quão bem os rins estão funcionando.

Quais são os sintomas de creatinina alta?

Em geral, o paciente não apresenta sintoma algum até fases bem avançadas da insuficiência renal. Portanto, é bastante comum o paciente ter creatinina alta e não sentir nada. Esse é o motivo pelo qual muitos pacientes com doença renal crônica não sabem que estão doentes.

Nas fases mais avançadas da doença renal crônica, geralmente (mas nem sempre) quando a creatinina está acima de 2,5 a 3,0 mg/dl, o paciente pode começar a apresentar anemia, inchaços, hipertensão (ou agravamento de uma hipertensão já existente) ou urina espumosa. Em fases terminais da doença renal, náuseas e vômitos, cansaço aos esforços, mau hálito e perda de apetite são comuns.

Qual valor da creatinina indica tratamento com hemodiálise?

Depende da idade, do sexo e da massa muscular do paciente. Uma creatinina de 3,5 mg/dl em uma idosa magra de 85 anos é bem mais grave que o mesmo valor em um homem jovem de 25 anos e grande massa muscular. Portanto, não é o valor isolado da creatinina que define quando iniciar a hemodiálise, mas sim a taxa de filtração glomerular e a presença de sintomas de uremia.

Tomar creatina interfere no exame da creatinina?

Tomar suplementos de creatina pode interferir nos níveis de creatinina no sangue e na urina, pois a creatina suplementar é convertida em creatinina no corpo. Esse aumento nos níveis de creatinina pode afetar os resultados dos exames, fazendo com que pareçam mais elevados do que realmente são devido à suplementação de creatina. Nesses casos, o ideal é fazer também uma dosagem da cistatina C, pois esse marcador não sofre interferência da creatina.


Referências


Autor(es)

Dr. Pedro Pinheiro

Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.

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