O que é edema?
Edema é o nome que se dá ao inchaço localizado em alguma parte do corpo. As pernas são os locais onde mais frequentemente surgem os edemas, mas o inchaço pode ocorrer em qualquer ponto do corpo. Só como exemplo, existem os edemas de pulmão, edema cerebral, edema de glote, edema de língua, etc.
Quando o inchaço ocorre de forma generalizada pelo corpo, ele recebe o nome de anasarca.
Neste artigo vamos explicar como surgem os edemas, quais são as suas causas e como eles devem ser tratados.
Como surge o edema?
Ao contrário do que se possa imaginar, os nossos vasos sanguíneos não são impermeáveis, eles apresentam poros que permitem a saída e entrada de células, bactérias, proteínas e água. O inchaço ocorre quando há uma saída excessiva de líquidos dos vasos para os tecidos.
Quando a nossa perna incha, o que ocorre, na verdade, é um acúmulo de líquido no tecido subcutâneo. Os líquidos que deveriam estar dentro nos vasos sanguíneos ou linfáticos extravasam e se acumulam na pele.
Existem basicamente 4 situações que favorecem esse extravasamento de água dos vasos para os tecidos. É importante destacar que, na maioria dos casos os pacientes apresentam mais de um desses mecanismos ao mesmo tempo. Vamos a eles:
Inflamação dos vasos ou tecidos
Quando existe um processo inflamatório, seja por infecção, processo alérgico ou por trauma, os vasos sanguíneos próximos a este local tornam-se mais permeáveis para facilitar a chegada das células de defesa ao local da inflamação (leia: O que é o pus ? O que é um abscesso? O que é uma inflamação?). Com o alargamento dos poros, há um maior extravasamento de líquidos para os tecidos ao redor. Por isso, quando damos uma topada ou quando alguma região da pele fica inflamada, eles ficam inchados.
Pacientes com doenças muito graves, geralmente internados no CTI, podem estar sofrendo um processo inflamatório generalizado, por isso, podem ficar com o corpo inteiro inchado. Este fato é muito comum em casos de sepse grave, quando os vasos estão com a sua permeabilidade aumentada de forma difusa (leia: O QUE É SEPSE? e ENTENDA O QUE ACONTECE COM PACIENTES NO CTI (UTI)).
Um famoso grupo de drogas usadas no tratamento da hipertensão, chamado de inibidores dos canais de cálcio, cujo membros mais conhecidos são a nifedipina e a amlodipina, também podem causar edemas nos membros inferiores por aumentarem a permeabilidade dos vasos.
Aumento da pressão dentro das veias e capilares
Quando há um aumento da pressão dentro das veias, chamada pressão hidrostática, a tendência é que a água no interior dos vasos seja “empurrada” em direção aos poros, facilitando o seu extravasamento.
O aumento da pressão dentro das veias nada tem a ver com hipertensão arterial, que é a elevação da pressão nas artérias. Não custa lembrar que as artérias levam os sangue do coração aos órgãos e tecidos, enquanto as veias fazem o caminho inverso, recebem o sangue dos tecidos e o leva de volta ao coração.
O aumento da pressão venosa costuma ocorrer por dois motivos: excesso de água dentro dos vasos ou quando há uma dificuldade no escoamento do sangue de volta ao coração, conhecido como retorno venoso.
Problemas no retorno venoso
Um conhecido exemplo que ilustra bem um problema no retorno venoso é quando surge edema nas pernas formado pela presença de varizes.
As varizes são veias defeituosas que apresentam dificuldade de drenar o sangue das pernas de volta ao coração. As veias das pernas precisam agir contra a gravidade, quando elas estão doentes, como no caso das varizes, a tendência é que parte do sangue fique represado nos membros inferiores. O sangue acumulado nas veias, aumenta a pressão dentro das mesmas e facilita o extravasamento de líquidos para o tecido subcutâneo. Este quadro é chamado de insuficiência venosa dos membros inferiores (leia: VARIZES | Causas e Tratamento). Além do inchaço é comum haver também um escurecimento da pele, que ocorre porque alguns pigmentos do sangue também extravasam para a pele. Se a estase for prolongada, a pele também tende a ficar avermelhada e brilhosa.
Outro mecanismo semelhante ocorre na insuficiência cardíaca, pois um coração fraco não consegue bombear o sangue de modo eficaz, principalmente nas pernas, que estão na extremidade do corpo e precisam de força para vencer a gravidade (leia: INSUFICIÊNCIA CARDÍACA).
Tanto na insuficiência cardíaca quanto na insuficiência venosa dos membros inferiores, o edema surge e piora quando o paciente fica muito tempo em pé e tende a desaparecer após algumas horas deitado, quando a gravidade não exerce força contrária. Por isso, é tão comum o paciente acordar sem edemas, mas ao final da tarde já ter as pernas todas inchadas.
Um dos sinais típicos do edema nas pernas é o cacifo, também chamado de sinal de Godet, que é a presença de um pequeno afundamento na pele quando a pressionamos com o dedo. Este é um sinal de excesso de líquido no tecido subcutâneo. Repare que na foto que ilustra o início do artigo, a paciente, além do inchaço nos pés e nas pernas, apresenta também cacifo, pele avermelhada e manchas escurecidas típicas da insuficiência venosa.
Uma outra situação comum que pode provocar edema por obstrução do retorno venoso é a trombose venosa profunda. Nesta doença, há formação de um trombo dentro de uma grande veia dos membros inferiores, obstruindo a drenagem do sangue em direção ao coração. O quadro clínico da trombose venosa nas pernas é um edema assimétrico, que acomete apenas em uma das pernas. Ele costuma ser duro, quente, de início súbito e doloroso. Para saber mais sobre a trombose venosa profunda, leia: TROMBOSE VENOSA PROFUNDA (TVP).
Excesso de líquidos nos vasos
Em algumas doenças, principalmente as de origem renal, pode ocorrer um acumulo de sódio (sal) no organismo. Esse excesso de sal aumenta a quantidade de água corporal, que, consequentemente, aumenta não só a pressão arterial, mas também a pressão venosa, favorecendo o aparecimento de inchaços ( leia: SAL E HIPERTENSÃO).
O paciente com insuficiência cardíaca também costuma apresentar esse mecanismo de formação de edema. O que ocorre, de forma bem resumida, é que quando o coração está fraco, menos sangue chega aos rins. A redução do aporte de sangue é equivocadamente interpretado pelos rins como um baixo volume de sangue nos vasos. Como resposta, os rins passam a reter mais sódio e água, numa tentativa de restabelecer o volume de sangue. Como o problema é a capacidade do coração bombear o sangue e não um baixo volume de sangue, essa reposta do rim leva a uma grande retenção de líquidos, que só agrava os edemas.
Redução da pressão oncótica
Um outro mecanismo para a formação dos inchaços é a diminuição da viscosidade sanguínea, chamada de pressão oncótica. Essa pressão oncótica é criada pela concentração de proteínas no sangue. Quando o sangue tem uma concentração de proteínas menor que os tecidos, ou seja, quando a pressão oncótica encontra-se baixa, a tendência é que a água extravase do sangue para os tecidos por osmose. Portanto, enquanto o aumento da pressão dentro das veias (pressão hidrostática) favorece o extravasamento de líquidos, a pressão oncótica faz o trabalho inverso.
Quando o paciente tem alguma doença que diminua as proteínas sanguíneas, como cirrose, desnutrição ou síndrome nefrótica, a tendência é que ele forme edemas pela baixa pressão oncótica, mesmo que a pressão hidrostática dentro das veias seja normal. Neste caso, o edema costuma ser generalizado, já que a falta de proteína ocorre por todo o corpo. Além do edema nas pernas, também é muito comum a ocorrência de ascite, nome que damos ao acúmulo de líquido dentro da cavidade abdominal.
As duas doenças que mais provocam edemas por falta de proteínas são a cirrose e a síndrome nefrótica. Na cirrose, o fígado doente torna-se incapaz de produzir quantidades adequadas de proteínas, principalmente a albumina, que é a principal proteína do sangue. Na síndrome nefrótica o que ocorre é uma perda exagerada de proteínas pela urina, o que resulta em níveis baixos se proteínas no sangue.
Essas duas doenças são as principais causas, mas, na verdade, qualquer doença crônica grave e prolongada pode inibir a produção de albumina pelo fígado e causar edema.
Linfedema
Outro tipo edema, esse menos comum, é o de origem linfática. É chamado de linfedema e ocorre por obstrução dos vasos linfáticos.
O linfedema é comum na elefantíase, nos cânceres e na obesidade mórbida. Edema de origem linfática também é comum nos braços de pacientes que fazem mastectomia com retirada dos gânglios da axila. Na insuficiência venosa grave e não tratada, pode ocorrer também linfedema associado.
O linfedema não costumar ter cacifo, é mais deformante que o edema venoso e costuma acometer os membros de forma assimétrica.
Principais causas de edema
Vamos resumir as principais causas de edema de acordo com o seu mecanismo.
a) Causas de inchaços por aumento da pressão hidrostática e/ou retenção de sódio:
- Insuficiência venosa.
- Insuficiência cardíaca (leia: INSUFICIÊNCIA CARDÍACA | Causas e sintomas).
- Insuficiência renal (leia: INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA | Sintomas e tratamento).
- Gravidez.
- Trombose venosa.
- Medicamentos (anti-inflamatórios, corticoides, pílula anticoncepcional, insulina, rosiglitazona, tamoxifeno, hidralazina, minoxidil…)
- Gravidez.
- Estado pré-menstrual.
b) Causas de inchaços por diminuição da pressão oncótica:
- Cirrose e doenças hepáticas (leia: CIRROSE HEPÁTICA | Sintomas e causas).
- Síndrome nefrótica (leia: PROTEINÚRIA, URINA ESPUMOSA E SÍNDROME NEFRÓTICA).
- Doenças crônicas.
- Desnutrição.
c) Causas de inchaços por aumento da permeabilidade vascular:
- Sepse (leia: O QUE É SEPSE).
- Grandes queimados (leia: QUEIMADURAS | Graus e complicações).
- Inflamações (edema local).
- Traumas.
- Reação alérgica (leia: ANAFILAXIA).
- Medicamentos (inibidores do canal de cálcio, hidralazina e metildopa).
- Diabetes mellitus (leia: SINTOMAS DO DIABETES).
d) Causas de inchaços por linfedemas:
- Câncer (leia: CÂNCER | Sintomas e tipos).
- Ressecção cirúrgica de gânglios (como no tratamento do câncer de mama).
- Elefantíase (filariose).
- Obesidade (leia: OBESIDADE E SÍNDROME METABÓLICA).
- Hipotireoidismo grave (mixedema) (leia: HIPOTIREOIDISMO (TIREOIDITE DE HASHIMOTO)).
Tratamento do edema
Um dos maiores erros ao se tratar um edema é achar que diuréticos devem sempre ser prescritos. Os diuréticos só servem se a causa do edema for um acúmulo de líquidos. Se o paciente tem uma trombose, um edema linfático, uma infecção ou qualquer outra causa que o mecanismo principal não seja retenção de sal e líquidos, os diuréticos podem fazer mais mal do que bem.
Os diuréticos costumam ser muito importantes no tratamento do edema provocado por insuficiência cardíaca, insuficiência renal ou cirrose. Nas outras situações, o seu uso pode ser indicado, mas é preciso ter cuidado para não desidratar o paciente e provocar lesão nos rins. É muito comum vermos pacientes com insuficiência venosa por varizes serem entupidos de diuréticos. Uma dose baixa pode até ajudar, mas doses levadas com certeza são desnecessárias.
O mais importante antes de indicar um tratamento é tentar entender a causa e os mecanismos envolvidos na formação do inchaço. Nos casos dos pacientes que usam amlodipina, por exemplo, basta reduzir a dose ou suspender o medicamento par ao inchaço sumir. Nos obesos, a simples perda de peso costuma ajudar. Em muitos casos, uma dieta pobre em sal é capaz de reduzir bastante o inchaço nas pernas.
Edema sem causa aparente (edema idiopático)
Existe um tipo de edema, chamado edema idiopático, que ocorre principalmente em mulheres jovens e sadias, normalmente associado ao período menstrual. Também está associado à obesidade e à depressão. A origem desse tipo de edema ainda não foi totalmente esclarecida, mas acredita-se que seja uma junção de retenção de líquidos com aumento da permeabilidade dos vasos.
O edema idiopático costuma ser cíclico, vai e volta de acordo com o período menstrual. Muitas mulheres tratam esse edema por conta própria tomando diuréticos próximo ao período menstrual para alívio dos sintomas. Na verdade, tomar diurético para esse tipo de edema só PIORA o quadro. Uso crônico de diurético sem indicação é uma causa de edema por mais paradoxal que isso possa parecer. (leia: PARA QUE SERVEM OS DIURÉTICOS?).
O diurético mal indicado aumenta a retenção de sódio, principalmente nos intervalos entre as tomadas. O doente acaba ficando dependente do remédio e não consegue estabelecer uma ligação causal da persistência do edema com o diurético. Na verdade, o paciente acha que só o diurético alivia seu edema, pois, quando ele suspende o diurético, o inchaço piora. O que esse paciente não sabe é que após algumas semanas sem diurético, o edema tende a regredir sozinho.
Portanto, não se usa diuréticos em pessoas saudáveis com pequenos edemas nos membros inferiores, principalmente se associados ao período menstrual. O melhor é reduzir o consumo de sal e suspender drogas que possam causar edemas como Nifedipina, amlodipina, rosiglitazona, anti-inflamatórios e minoxidil. Naqueles com excesso de peso, emagrecer é necessário.
Referências
- Clinical manifestations and evaluation of edema in adults – UpToDate.
- General principles of the treatment of edema in adults – UpToDate.
- Edema: Diagnosis and Management – American Family Physician.
- Edema – Harvard Health Publishing.
- Papadakis MA, et al, eds. Common symptoms. In: Current Medical Diagnosis & Treatment 2018. 57th ed. New York, N.Y.: McGraw-Hill Education; 2018
- Longo DL, et al., eds. Edema. In: Harrison’s Principles of Internal Medicine. 19th ed. New York, N.Y.: McGraw-Hill Education; 2015
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.
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