Inchaço nas pernas (edema e retenção de líquidos)

O edema é o acúmulo anormal de líquido nos tecidos, resultando em inchaço visível, especialmente em membros inferiores. Pode ter causas locais ou sistêmicas, como insuficiência cardíaca, renal ou hepática. O diagnóstico adequado é essencial para o tratamento eficaz.

Dr. Pedro Pinheiro
Atualizado:
Edema nos pés

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O que é edema?

Edema é o termo médico utilizado para descrever o acúmulo anormal de líquido nos tecidos do corpo, resultando em inchaço perceptível. Esse líquido se acumula, principalmente, no espaço intersticial — ou seja, no espaço entre as células — e pode ser resultado de diversos mecanismos fisiopatológicos.

As pernas e os pés são os locais mais comuns de surgimento do edema, principalmente por ação da gravidade, especialmente em pessoas que permanecem longos períodos em pé ou sentadas. Esse tipo de inchaço é chamado de edema periférico. No entanto, o edema pode ocorrer em praticamente qualquer parte do corpo, dependendo da causa subjacente. Alguns exemplos incluem:

  • Edema pulmonar: é o acúmulo de líquido nos pulmões, frequentemente associado à insuficiência cardíaca e que pode causar grave dificuldade respiratória.
  • Edema cerebral: caracterizado pelo inchaço do tecido cerebral, o que pode levar a aumento da pressão intracraniana e sintomas neurológicos.
  • Edema de glote: geralmente relacionado a reações alérgicas graves, como na anafilaxia, podendo causar obstrução das vias aéreas.
  • Edema de língua: também observado em reações alérgicas, especialmente como parte do angioedema.

Quando o edema ocorre de maneira difusa e afeta praticamente todo o corpo, o quadro recebe o nome de anasarca, uma condição mais grave que pode estar associada a insuficiência cardíaca avançada, doenças renais como a síndrome nefrótica, insuficiência hepática, ou ainda à desnutrição severa (kwashiorkor).

É importante destacar que o edema não é uma doença em si, mas um sinal clínico que indica a presença de algum desequilíbrio ou patologia subjacente. O diagnóstico correto da causa do edema é fundamental para o tratamento adequado. A abordagem terapêutica pode incluir desde medidas simples, como elevação dos membros inferiores e uso de meias compressivas, até o uso de diuréticos ou tratamento específico da doença de base.

Como surge o edema?

Ao contrário do que muitos imaginam, os vasos sanguíneos não são estruturas completamente impermeáveis. Suas paredes possuem pequenas aberturas (poros) que permitem a passagem seletiva de substâncias como células, proteínas, bactérias e, principalmente, água. O edema se forma quando há um extravasamento excessivo de líquido dos vasos para os tecidos ao redor, superando a capacidade de reabsorção desses fluidos.

Quando ocorre inchaço nas pernas, por exemplo, o que está acontecendo é o acúmulo anormal de líquido no tecido subcutâneo. Esse líquido, que normalmente deveria permanecer dentro dos vasos sanguíneos ou linfáticos, escapa para o espaço intersticial e provoca o inchaço visível.

Diversos mecanismos fisiopatológicos podem estar envolvidos na gênese do edema. De maneira geral, existem quatro principais fatores que contribuem para esse extravasamento de líquidos. É importante salientar que, na prática clínica, os pacientes frequentemente apresentam mais de um desses mecanismos atuando simultaneamente. São eles:

1. Aumento da permeabilidade vascular por inflamação

Em processos inflamatórios — causados por infecções, reações alérgicas ou traumas — os vasos sanguíneos tornam-se mais permeáveis. Esse aumento da permeabilidade facilita a migração de células do sistema imune para o local afetado, mas também permite a saída de proteínas e líquidos, levando ao edema local. Por isso, regiões traumatizadas ou inflamadas frequentemente apresentam inchaço.

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Em pacientes gravemente enfermos, como os internados em unidades de terapia intensiva (UTI), pode haver um quadro de inflamação sistêmica, como na sepse grave. Nesses casos, os vasos sanguíneos de todo o corpo tornam-se excessivamente permeáveis, o que pode causar edema generalizado ou anasarca.

Alguns medicamentos também podem aumentar a permeabilidade vascular. Um exemplo clássico são os bloqueadores dos canais de cálcio, como a nifedipina e a amlodipina, frequentemente utilizados no tratamento da hipertensão arterial. Esses fármacos podem levar à formação de edemas nos membros inferiores.

2. Aumento da pressão hidrostática intravascular

A pressão hidrostática é a força exercida pelo sangue contra as paredes dos vasos. Quando essa pressão está aumentada, ela favorece o extravasamento de água para o espaço intersticial. Esse fenômeno ocorre principalmente em situações em que há acúmulo de sangue nas veias ou capilares.

É fundamental distinguir esse aumento de pressão da hipertensão arterial sistêmica, que afeta as artérias. A pressão hidrostática elevada que leva ao edema costuma estar relacionada ao sistema venoso, cuja função é retornar o sangue ao coração.

Esse aumento da pressão venosa pode acontecer por dois motivos principais:

  • Dificuldade de escoamento do sangue venoso (prejuízo no retorno venoso).
  • Aumento do volume de sangue circulante (por retenção de líquidos).

2.1. Comprometimento do retorno venoso

Um exemplo clássico de prejuízo no retorno venoso são as varizes. As veias das pernas precisam trabalhar contra a gravidade para enviar o sangue de volta ao coração. Quando essas veias estão danificadas, como ocorre nas varizes, parte do sangue fica represada nos membros inferiores. Esse represamento aumenta a pressão dentro das veias e favorece o extravasamento de líquidos, caracterizando o quadro de insuficiência venosa crônica.

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Além do inchaço, é comum observar alterações na coloração da pele, como escurecimento por extravasamento de pigmentos sanguíneos. Em estágios avançados, a pele pode apresentar aspecto avermelhado, brilhante e endurecido.

A insuficiência cardíaca é outro exemplo de condição que compromete o retorno venoso. Um coração enfraquecido não consegue bombear o sangue de forma eficaz, sobretudo nas extremidades inferiores. Como consequência, o sangue se acumula nas pernas, levando ao edema.

Nesses dois casos, o edema tende a piorar ao longo do dia, principalmente quando o paciente permanece em pé por muito tempo, e melhora com o repouso em posição horizontal, quando a gravidade deixa de atuar desfavoravelmente.

Um sinal típico de edema nas pernas é o cacifo (ou sinal de Godet), que corresponde a um afundamento na pele após a aplicação de pressão com o dedo. Esse sinal é característico do acúmulo de líquido no tecido subcutâneo.

Edema com sinal de Godet
Edema com sinal de Godet

Outro exemplo importante de obstrução do retorno venoso é a trombose venosa profunda (TVP). Nesse caso, um coágulo obstrui uma veia profunda dos membros inferiores, dificultando a drenagem sanguínea. O edema geralmente é unilateral, de início súbito, doloroso, quente e endurecido.

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2.2. Retenção de sódio e água (expansão do volume intravascular)

Doenças renais, como a síndrome nefrótica, podem levar à retenção excessiva de sódio, o que aumenta o volume de água corporal e, por consequência, a pressão nos vasos. Essa sobrecarga de volume favorece o extravasamento de líquidos para os tecidos.

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Na insuficiência cardíaca, esse mecanismo também é comum. Quando o débito cardíaco está reduzido, o fluxo sanguíneo para os rins diminui. Os rins, interpretando erroneamente essa redução como um estado de hipovolemia, ativam mecanismos de retenção de sódio e água, exacerbando ainda mais a sobrecarga hídrica e os edemas.

3. redução da pressão oncótica

A pressão oncótica é determinada principalmente pela concentração de proteínas, como a albumina, no plasma. Essas proteínas ajudam a reter a água dentro dos vasos. Quando os níveis proteicos estão reduzidos, a força osmótica que mantém o líquido no interior vascular diminui, facilitando o extravasamento para os tecidos.

Esse mecanismo é comum em doenças como:

  • Cirrose hepática: doença na qual o fígado não consegue sintetizar proteínas adequadamente.
  • Síndrome nefrótica: doença na qual há perda excessiva de proteínas pela urina.
  • Desnutrição severa: compromete a ingestão e produção de proteínas.

O edema por hipoalbuminemia costuma ser mais difuso e pode vir acompanhado de ascite, que é o acúmulo de líquido na cavidade abdominal.

4. Obstrução linfática (linfedema)

O linfedema é causado pela obstrução dos vasos linfáticos, responsáveis por drenar o excesso de líquido intersticial. Essa forma de edema é menos comum, mas pode ocorrer em situações como:

  • Elefantíase (filariose linfática).
  • Tratamentos oncológicos, especialmente após mastectomia com retirada de linfonodos axilares.
  • Obesidade mórbida.
  • Insuficiência venosa avançada, em que pode haver linfedema associado.

O linfedema geralmente é assimétrico, não apresenta cacifo e tende a ser mais endurecido e deformante do que o edema de origem venosa.

Linfedema: edema linfático
Linfedema

Principais causas de edema

Vamos resumir as principais causas de edema conforme o seu mecanismo.

a) Causas de inchaços por aumento da pressão hidrostática e/ou retenção de sódio:

b) Causas de inchaços por diminuição da pressão oncótica:

c) Causas de inchaços por aumento da permeabilidade vascular:

d) Causas de inchaços por linfedemas:

  • Câncer.
  • Ressecção cirúrgica de gânglios (como no tratamento do câncer de mama).
  • Elefantíase (filariose).
  • Obesidade.
  • Hipotireoidismo grave (mixedema).

Tratamento do edema

O tratamento do edema deve ser individualizado, sempre baseado na identificação da causa subjacente. Um dos erros mais comuns é considerar que todo edema deve ser tratado com diuréticos. Embora esses medicamentos tenham papel importante em algumas situações, seu uso indiscriminado pode ser ineficaz ou até prejudicial, especialmente quando o edema não decorre de sobrecarga de volume.

Os diuréticos são particularmente úteis quando o edema está associado à retenção de sódio e água, como ocorre na insuficiência cardíaca, na insuficiência renal e na cirrose hepática com hipoalbuminemia. Nesses casos, os diuréticos ajudam a eliminar o excesso de líquido, aliviando o inchaço e melhorando os sintomas clínicos, como dispneia e ortopneia.

No entanto, mesmo nessas condições, o uso dos diuréticos deve ser cuidadosamente monitorado, uma vez que o excesso pode levar à hipovolemia, hipotensão, distúrbios eletrolíticos e lesão renal aguda.

Por outro lado, em edemas cuja origem não está relacionada à retenção hidrossalina, os diuréticos raramente trazem benefício e podem causar mais danos do que vantagens. Exemplos incluem:

  • Trombose venosa profunda, em que o problema é mecânico (obstrução venosa);
  • Edema linfático (linfedema), caracterizado por falha no sistema de drenagem linfática;
  • Edemas inflamatórios ou infecciosos, nos quais o processo inflamatório local altera a permeabilidade vascular.

Nessas situações, o tratamento deve estar direcionado à causa primária do edema:

  • No caso da trombose, utiliza-se anticoagulação;
  • Nos linfedemas, a abordagem envolve fisioterapia, drenagem linfática, meias compressivas e, eventualmente, intervenção cirúrgica.
  • Nos edemas induzidos por medicamentos (como os causados por anlodipino ou nifedipino), o simples ajuste da dose ou a substituição da medicação geralmente é suficiente para resolução do quadro.

É igualmente importante reconhecer condições que favorecem o aparecimento ou a piora do edema, como a obesidade, o sedentarismo, o consumo excessivo de sal e a permanência prolongada em pé ou sentado. A adoção de medidas não farmacológicas pode ser extremamente eficaz em diversos casos:

  • Redução do consumo de sódio na dieta;
  • Elevação dos membros inferiores ao longo do dia;
  • Uso de meias de compressão graduada, especialmente em pacientes com insuficiência venosa;
  • Prática regular de atividade física leve, que melhora o retorno venoso;
  • Perda de peso, em pacientes com sobrepeso ou obesidade.

Casos de insuficiência venosa são frequentemente tratados de forma inadequada com doses elevadas de diuréticos, o que não resolve o problema e pode levar à desidratação e à hipotensão. Nestes casos, uma dose baixa de diurético pode ser usada pontualmente para alívio sintomático, mas o foco principal deve ser a correção do distúrbio venoso com medidas físicas e, quando indicado, tratamento cirúrgico.

Em resumo, o tratamento eficaz do edema requer a compreensão do mecanismo fisiopatológico predominante em cada caso. Antes de prescrever qualquer medicamento, é essencial realizar uma avaliação clínica criteriosa para determinar a etiologia do edema, evitando terapias empíricas que possam ser ineficazes ou prejudiciais.

Edema sem causa aparente (edema idiopático)

O edema idiopático é um tipo particular de inchaço que ocorre na ausência de uma causa orgânica identificável. Ele acomete, com maior frequência, mulheres jovens e saudáveis, estando comumente associado ao período menstrual, obesidade e, em alguns casos, a distúrbios emocionais, como a depressão.

Sua fisiopatologia ainda não é completamente compreendida, mas acredita-se que envolva uma combinação de retenção de sódio e água com aumento transitório da permeabilidade capilar, fenômenos que se intensificam de maneira cíclica, geralmente acompanhando as variações hormonais do ciclo menstrual.

O edema idiopático caracteriza-se por:

  • Ser flutuante e intermitente, com piora em determinados períodos do mês;
  • Predominar nos membros inferiores, especialmente ao final do dia;
  • Não estar relacionado a doenças cardíacas, renais ou hepáticas;
  • Frequentemente se agravar com a permanência prolongada em pé, calor e ingestão excessiva de sal.

Muitas mulheres recorrem espontaneamente ao uso de diuréticos para alívio dos sintomas, sobretudo próximos ao período menstrual. No entanto, essa prática, além de ineficaz a longo prazo, pode agravar o quadro de forma paradoxal.

O uso crônico e indevido de diuréticos em indivíduos sem retenção hidrossalina verdadeira pode desencadear um fenômeno conhecido como edema de rebote, no qual o organismo, ao tentar compensar as perdas de sódio induzidas pelo diurético, aumenta sua reabsorção nos rins, promovendo ainda mais retenção nos períodos sem a medicação.

Com o tempo, o paciente desenvolve dependência psicológica e fisiológica do diurético, acreditando que apenas o seu uso controla o edema. O que muitas pessoas não sabem é que, com a suspensão gradual do diurético, o organismo tende a restabelecer o equilíbrio hidroeletrolítico e o edema idiopático frequentemente regride espontaneamente em algumas semanas.

O tratamento mais adequado para o edema idiopático é não farmacológico e visa o controle dos fatores predisponentes:

  • Redução da ingestão de sal;
  • Perda de peso, nos casos de sobrepeso ou obesidade;
  • Suspensão de medicamentos que favorecem a retenção hídrica, como:
    • bloqueadores dos canais de cálcio (nifedipina, amlodipina);
    • antidiabéticos da classe das tiazolidinedionas (rosiglitazona, pioglitazona);
    • anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs);
    • minoxidil.

Medidas complementares incluem o uso de meias de compressão elástica, a elevação dos membros inferiores durante o repouso e a prática regular de exercícios físicos leves, que favorecem o retorno venoso.


Referências


Dr. Pedro Pinheiro

Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.