O que é artrite reumatoide?
A artrite reumatoide (CID-10 M05; CID-11 FA20) é uma doença inflamatória crônica, que acomete mais as mulheres adultas e pode atacar vários órgãos e tecidos do corpo, mas apresenta uma clara preferência pelas articulações, principalmente as dos membros superior e inferior.
O que é artrite?
Damos o nome de artrite à inflamação de uma ou mais articulações. Uma articulação com artrite se apresenta inchada, avermelhada, quente e extremamente dolorida.
Quando apenas uma articulação está inflamada, chamamos monoartrite. Quando ocorre inflamação de várias articulações estamos diante de uma poliartrite. A artrite pode ainda ser simétrica quando acomete simultaneamente duas articulações irmãs como joelhos, punhos, tornozelos, etc.
A articulação é a região onde há conexão de dois ou mais ossos distintos. Exemplos: joelhos, cotovelo, punhos, tornozelo, ombros, etc.
As articulações ao longo do corpo não são todas iguais. Algumas articulações são conectadas por um tecido fibroso, que cola um osso ao outro, tornando-os imóveis, como no caso dos ossos do crânio; outras são ligadas por cartilagens e permitem uma pequena mobilidade, como os discos vertebrais que unem as vértebras da coluna; há ainda as articulações móveis, que são normalmente ligadas por uma cartilagem e uma bolsa cheia de líquido (líquido sinovial) permitindo amplo movimento dos ossos com mínimo atrito entre eles, como nos casos dos joelhos, cotovelos, ombros, etc.
Quando a articulação se apresenta inflamada damos o nome de artrite. Quando a articulação se encontra dolorida, mas sem sinais clínicos de inflamação (inchaço, calor e rubor) dizemos que há uma artralgia. Para saber mais, leia: Diferenças entre artrite e artrose.
Várias outras doenças acometem as articulações, manifestando-se com quadros de artrite, fazendo parte do diagnóstico diferencial da artrite reumatoide, entre elas podemos citar:
- Lúpus.
- Gota.
- Osteoartrite.
- Artrite séptica (infecção da articulação).
- Artrite psoriásica.
- Doença de Still.
- Espondilite anquilosante.
- Febre reumática.
Uma característica típica da inflamação articular da artrite reumatoide é o acometimento da sinóvia, tecido cheio de líquido que se localiza no centro das articulações, servindo para diminuir o atrito entre os ossos, como uma espécie de óleo lubrificante.
Não se sabe ainda o que causa a artrite reumatoide, mas fatores autoimunes estão presentes. (leia: Doenças autoimunes: causas, sintomas e tratamento). Por que o organismo passa a atacar as próprias articulações ainda é um mistério, mas o resultado é a destruição de tecidos pelo próprio sistema imune. Fatores genéticos parecem ser importantes e a presença de determinados genes está associada a um maior risco de se desenvolver a doença. Parentes de 1º grau de doentes, apresentam até três vezes mais chances de também apresentar AR.
A artrite reumatoide é mais comum em mulheres e em caucasianos (brancos). O pico de aparecimento da doença é entre 30 e 55 anos. Até 5% das mulheres acima de 65 anos apresentam AR.
O ato de fumar está associado a um maior risco de AR e a uma maior gravidade da doença. A nuliparidade (ausência de filhos) também parece ser outro fator de risco.
Sintomas
O quadro de artrite reumatoide costuma iniciar-se de forma insidiosa, com sintomas leves e pouco específicos como cansaço, dor muscular, perda de peso, febre baixa, formigamento nas mãos, e, por vezes, pequenas dores articulares. É muito comum haver um intervalo de meses entre o início dos sintomas e a procura por atendimento médico.
Quando o quadro de artrite se inicia ele é caracteristicamente uma poliartrite simétrica. As articulações das mãos são, em geral, as primeiras a serem acometidas.
Conforme a doença progride, mais articulações são acometidas. Punhos, ombros, joelhos, pés, tornozelos, coluna, articulação da mandíbula, quadril e outras podem ser atacadas pelo sistema imune. Os sintomas podem ser cíclicos, alternando-se períodos de melhora com momento de grande piora, ou contínuos. Se não houver tratamento, deformidades podem surgir ao longo do tempo.
Uma lesão típica da AR deformante é desvio lateral dos dedos associado a uma deformidade chamada pescoço de cisne.
O acometimento das articulações é típico, mas a artrite reumatoide é uma doença sistêmica que pode também se apresentar com inflamação do pericárdio (membrana que envolve o coração), inflamação do pulmão e da pleura, inflamações dos olhos, lesões nos nervos periféricos, aumento do baço, sinais de vasculite e formação de nódulos subcutâneos, principalmente na região do antebraço e cotovelo.
Pacientes com artrite reumatoide apresentam maior risco para infarto do miocárdio e para síndrome do túnel do carpo.
Critérios diagnósticos
O Colégio Americano de Reumatologia estabeleceu critérios para AR. Para se fechar o diagnóstico o paciente precisa ter pelo menos 4 dos 7 critérios abaixo.
- Rigidez matinal: rigidez das articulações ao acordar com duração de pelo menos 1 hora.
- Artrite em pelo menos 3 articulações simultaneamente.
- Artrite de mãos e punhos
- Artrite simétrica
- Nódulos subcutâneos
- Fator reumatoide (FR) positivo em análise de sangue.
- Alterações típicas de AR nas radiografias de mãos e punhos
Os critérios de 1 a 4 devem estar presentes por pelo menos 6 semanas. Esses critérios só servem para pacientes com doença plenamente estabelecida. Como já foi dito, no início do quadro, esses achados podem não estar presentes.
A artrocentese é a coleta de líquido sinovial através da punção com agulha de uma articulação inflamada. Este exame serve para se avaliar a composição do líquido sinovial e descartar outras causas de artrite. A artrocentese também pode ser usada para se injetar medicamentos para alívio da artrite.
Exames: pesquisa de autoanticorpos no sangue
Até 80% dos pacientes com artrite reumatoide apresentam pesquisa positiva do Fator Reumatoide (um autoanticorpo). Esse anticorpo sozinho, porém, não é suficiente para se estabelecer o diagnóstico. Outras doenças como lúpus, Sjögren e crioglobulinemia também podem apresentar fator reumatoide positivo. Além disso, até 10% da população saudável pode ter FR positivo sem isso indicar qualquer doença.
Um novo anticorpo foi descoberto recentemente. Trata-se do anti-CCP. Este anticorpo é mais específico para a artrite reumatoide que o Fator Reumatoide, sendo que até 95% dos pacientes com resultado positivo têm AR.
Quando os autoanticorpos estão presentes, há um maior risco de doença mais grave e deformante.
O FAN (fator antinuclear) pode estar positivo em até 40% dos casos. Este é um anticorpo que ajuda pouco no diagnóstico da artrite reumatoide, já que costuma estar positivo em várias outras doenças que cursam com artrite e, portanto, fazem parte do diagnóstico diferencial. No entanto, ele serve para se sugerir a presença de uma doença autoimune como causa dos sintomas.
Tratamento
Não existe cura para artrite reumatoide. O tratamento é voltado para redução dos processos inflamatórios e prevenção das deformidades.
O tratamento não medicamentoso inclui exercícios físicos controlados, fisioterapia e orientação nutricional para se evitar sobrepeso e controlar o colesterol. Não existe dieta específica para a AR.
A terapia com fármacos é o principal tratamento da artrite reumatoide. Existem 4 classes diferentes de medicamentos que podem ser usados conforme a gravidade do caso.
Anti-inflamatórios não esteroides (AINES)
Os anti-inflamatórios são fármacos que agem aliviando os sintomas da artrite. Os mais usados são o Ibuprofeno e o Naproxeno.
Os anti-inflamatórios demoram de 2 a 4 semanas para se alcançar o efeito máximo e apresentam muitos efeitos colaterais quando são usados a longo prazo. Além disso, eles não impedem que ocorram lesões deformantes nas articulações.
Drogas antirreumáticas modificadoras de doença (DMARD)
Este é o grupo de drogas capaz não só de diminuir o processo inflamatório das artrites, mas também de impedir a progressão para doença deformante.
As principais drogas deste grupo são a hidroxicloroquina, metotrexato, sais de ouro, penicilamina, sulfassalazina, azatioprina, leflunomide e ciclosporina.
Muitos desses medicamentos são drogas imunossupressoras e devem ser usadas sob estrito controle médico. Os efeitos dos DMARD só são sentidos após semanas/meses de tratamento.
Modificadores da resposta biológica
São o grupo mais novo de drogas para a artrite reumatoide. São medicamentos que agem diretamente nos mediadores inflamatórios e nas células envolvidas na artrite. Também têm efeito imunossupressor. Sua ação é mais rápida que dos DMARD, aparecendo já em 2 semanas.
No entanto, são drogas caríssimas cujo custo anual beira os 15.000 dólares. Por isso, são reservadas para os casos mais graves, não responsivos a terapia convencional. São todas drogas por via injetável, o que dificulta ainda mais o uso domiciliar.
As principais drogas desta categoria são:
- Etanercept (Enbrel®).
- Infliximab (Remicade®).
- Adalimumab (Humira®).
- Anakinra (Kineret®).
- Abatacept (Orencia®).
- Rituximab (Rituxan®).
Corticoides
Glicocorticoides, como a prednisona, agem rapidamente reduzindo o processo inflamatório e aliviando os sintomas da artrite reumatoide. Podem ser tomadas por via oral ou injetadas diretamente nas articulações acometidas. Sua capacidade de prevenir deformidades é restrita e seus efeitos colaterais são inúmeros.
O seu uso é indicado no início do tratamento, normalmente junto com os AINES, para um rápido alívio dos sintomas enquanto se espera o efeito completo dos DMARD.
Medicina alternativa para artrite reumatoide
Até o momento nenhum dos tratamentos ditos alternativos conseguiu se mostrar superior ao efeito placebo.
Medicamentos do tipo colágeno ou cartilagem de tubarão não apresentam nenhuma evidência científica de que funcionem.
Todos os trabalhos com homeopatia e acupuntura não conseguiram evidenciar qualquer benefício com o uso destas modalidades terapêuticas.
Pulseiras magnéticas também não servem para nada.
Referências
- Canadian Rheumatology Association Recommendations for Pharmacological Management of Rheumatoid Arthritis with Traditional and Biologic Disease-modifying Antirheumatic Drugs – Journal of Rheumatology.
- 2015 American College of Rheumatology Guideline for the Treatment of Rheumatoid Arthritis – American College of Rheumatology.
- EULAR recommendations for the management of rheumatoid arthritis with synthetic and biological disease-modifying antirheumatic drugs: 2016 update – British Medical Journal.
- Rheumatoid arthritis in adults: management – The National Institute for Health and Care Excellence (NICE).
- Clinical manifestations of rheumatoid arthritis – UpToDate.
- Diagnosis and differential diagnosis of rheumatoid arthritis – UpToDate.
- Initial treatment of rheumatoid arthritis in adults – UpToDate.
- Goldman L, et al., eds. Rheumatoid arthritis. In: Goldman-Cecil Medicine. 25th ed. Philadelphia, Pa.: Saunders Elsevier; 2016.
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.