O que é o diabetes tipo 1?
A diabetes mellitus tipo 1 (DM1), também chamada de diabetes juvenil, é uma doença crônica que surge quando o pâncreas se encontra doente e produz pouca ou nenhuma insulina.
A insulina é um hormônio que age permitindo a entrada de glicose (açúcar) para dentro das células, onde elas são utilizadas como combustível para gerar energia para o corpo. Sem insulina, a glicose não consegue entrar nas células e acaba ficando acumulada no sangue, levando a um quadro que é chamado de hiperglicemia.
A hiperglicemia é extremamente maléfica ao organismo, provocando, a longo prazo, lesão de vários tecidos e órgãos.
Apesar de ser mais comum em crianças e adolescentes, a diabetes tipo 1 também pode surgir em adultos.
Causas
Na maioria dos casos, a diabetes tipo 1 é uma doença de origem autoimune, na qual os anticorpos do próprio paciente atacam e destroem parte do pâncreas, especificamente as células produtoras de insulina, conhecidas como células beta das ilhotas de Langerhans.
Para entender o que é uma doença autoimune, leia: Doenças autoimunes.
O processo autoimune de destruição das células beta do pâncreas ocorre em indivíduos geneticamente suscetíveis e é provavelmente desencadeado por um ou mais agentes ambientais, como alguns tipos de vírus.
O processo de destruição é lento e demora de vários meses a alguns anos até que ocorra dano celular suficiente para que a produção de insulina se torne escassa.
Existem dois picos na incidência do diabetes, o primeiro ocorre entre os 4 e 7 anos e o segundo entre os 10 e 14 anos.
Em resumo, o paciente já nasce com as alterações genéticas que favorecem o surgimento da diabetes tipo 1, desenvolve os autoanticorpos nos primeiros anos de vida e só vai apresentar a doença mesmo no meio para o final da infância.
O diabetes tipo 1 de origem autoimune é chamado tipo 1A. Existe ainda o diabetes tipo 1B, que é mais raro, também ocorre por destruição das células beta do pâncreas, mas a origem é desconhecida, não havendo autoanticorpos envolvidos na gênese da doença.
Diabetes mellitus tipo 1 é hereditário?
A história familiar é relevante, mas não é estritamente necessária. O risco de uma criança desenvolver diabetes tipo 1 é de:
- 0,4%, se não houver história familiar.
- 1 a 4%, se a mãe for diabética tipo 1.
- 3 a 8%, se o pai for diabético tipo 1.
- 2 a 6%, se um dos irmãos tiver DM1.
- 30%, se ambos os pais tiverem a doença.
- 30% se um irmão gêmeo univitelino (idêntico) tiver a doença.
Nos casos de diabetes mellitus tipo 2 (DM2), hereditariedade é um fator de risco muito mais forte, com mais de 75% dos pacientes apresentando história familiar positiva.
Qual é a diferença entre o diabetes tipo 1 e o diabetes tipo 2?
Ao contrário do que ocorre na maioria dos casos de diabetes tipo 1, a diabetes mellitus tipo 2 não tem origem autoimune e ocorre principalmente em adultos que são obesos, sedentários e com histórico familiar positivo.
A DM2 é um tipo de diabetes que ocorre por uma insuficiente ação da insulina na circulação sanguínea. O pâncreas produz insulina, mas os tecidos não reconhecem sua presença, impedindo que a glicose possa entrar para dentro das células, um processo conhecido como resistência à insulina.
Para mais informações sobre o diabetes tipo 2, leia:
Sintomas
Os sintomas do diabetes tipo 1 costumam ser provocados pela hiperglicemia. São eles:
- Sede excessiva.
- Cansaço.
- Micção frequente.
- Perda do controle da bexiga durante o sono (voltar a fazer xixi na cama).
- Perda de peso.
- Visão turva.
- Fome frequente.
- Irritação.
- Infecções frequentes
- Lenta cicatrização de feridas.
- Mau hálito.
Cetoacidose diabética
Em algumas crianças, o primeiro sinal da diabetes pode ser uma complicação conhecida como cetoacidose diabética.
Sem insulina, as células não recebem a quantidade adequada de glicose e precisam utilizar os estoques de gordura do corpo como fonte de energia. A quebra das gorduras gera substâncias ácidas, chamadas corpos cetônicos, como o β-hidroxibutirato e o acetoacetato.
O excesso de cetoácidos provoca queda do pH do sanguíneo, podendo acidificar o sangue até níveis fatais, motivo pelo qual a cetoacidose é considerada uma emergência médica. Cerca de 80% das mortes de crianças e adolescentes diabéticos são provocadas por quadros de cetoacidose.
A cetoacidose costuma surgir quando a glicemia se encontra muito descontrolada, geralmente com valores acima de 500 mg/dl. Seus sinais e sintomas mais comuns são
- Náuseas.
- Vômitos.
- Dor abdominal.
- Confusão mental.
- Prostração.
- Dificuldade respiratória.
- Coma.
Para mais informações sobre os sintomas da diabetes, leia: 10 primeiros sintomas da diabetes.
Complicações
Com o passar dos anos, a hiperglicemia crônica pode provocar lesões em vários tecidos do corpo. Entre os órgãos mais afetados estão o coração, vasos sanguíneos, nervos, olhos e rins.
A taxa e a gravidade das complicações estão diretamente relacionadas com os níveis de açúcar no sangue (glicemia). A longo prazo, quanto mais descontrolada for a glicemia e quanto mais antiga for a diabetes, maior é o risco de surgirem múltiplas doenças.
São várias as complicações do diabetes tipo 1, algumas diretamente ligadas à hiperglicemia crônica, outras relacionadas às restrições que a doença provoca. Entre as mais comuns, podemos citar:
- Doença arterial coronariana (angina).
- Infarto agudo do miocárdio.
- AVC.
- Hipertensão arterial.
- Lesão das artérias dos membros inferiores: pode causar obstrução grave dos vasos sanguíneos das pernas e necessidade amputação do membro.
- Neuropatia diabética: lesão dos nervos periféricos, habitualmente dos pés e pernas, provocando formigamento, dormência, queimação ou dor.
- Danos aos nervos do trato gastrointestinal, levando a problemas como náuseas, vômitos, diarreia ou constipação.
- Disfunção erétil.
- Nefropatia diabética: lesão dos rins, provocando insuficiência renal crônica e perda de grandes quantidades de proteínas na urina.
- Retinopatia diabética: lesão dos vasos sanguíneos da retina, podendo causar cegueira.
- Complicações na gravidez: pré-eclâmpsia, aborto espontâneo, morte fetal e defeitos congênitos.
- Depressão.
- Transtornos alimentares, como bulimia e anorexia nervosa.
- Infecções de repetição, como candidíase vaginal e infecção urnária.
- Atraso no crescimento.
- Surgimento de outras doenças autoimunes: tireoidite autoimune e doença celíaca são as mais comuns.
Diagnóstico
O diagnóstico do DM1 é realizado através da dosagem sanguínea da glicemia ou da hemoglobina glicosilada.
São necessários dois exames de sangue, colhidos em dias diferentes, com pelo menos um dos três critérios listados abaixo:
- Glicemia em jejum acima de 126 mg/dl.
- Glicemia em qualquer momento do dia acima de 200 mg/dl.
- Hemoglobina glicosilada (HbA1c) maior que 6,5%.
Uma vez diagnosticada a diabetes, o endocrinologista pode também pesquisar a presença de autoanticorpos no sangue.
Explicamos o diagnóstico da diabetes com mais detalhes nos artigos:
- Como é feito o diagnóstico do diabetes mellitus?
- Hemoglobina glicada – O que é, valores normais e como baixar.
Tratamento
Não existe cura para a diabetes tipo 1. O tratamento visa o controle da glicemia a longo prazo, de forma a reduzir a incidência das complicações.
O controle da glicemia é feito através de várias abordagens, sendo as mais importantes:
- Administração regular de insulina (até 6 vezes por dia).
- Controle da dieta.
- Monitoramento frequente da glicemia por parte do paciente.
- Prática de exercícios físicos.
O objetivo do tratamento é manter o valor da hemoglobina glicosilada abaixo de 7%. Para tanto, o paciente deve procurar manter a glicemia antes das refeições entre 80 e 130 mg/dl e após as refeições abaixo de 180 mg/dl.
Se os valores estiverem descontrolados, a dieta e a dose da insulina devem ser reavaliadas.
Tratamento com insulina
Como na diabetes tipo 1 o pâncreas produz pouca ou nenhuma insulina, os pacientes precisam substituir a insulina natural por insulina artificial, que pode ser administrada por meio de injeções regulares ao longo do dia ou através de uma bomba de insulina.
O nível de insulina administrado deve ser cuidadosamente definido de acordo com a dieta e os hábitos de exercício do paciente. Quantidades insuficientes podem não controlar a glicemia e aumentar o risco de complicações, enquanto quantidades excessivas podem provocar hipoglicemia.
Os tipos de insulina mais utilizados são:
- Insulina de ação rápida: tem início de ação com cerca de 15 minutos, atinge o pico em 1 hora e continua a funcionar por 2 a 4 horas.
- Tipos: Insulina glulisina (Apidra), insulina lispro (Humalog) e insulina aspártico (NovoLog).
- Insulina regular ou de ação curta: tem início de ação com cerca 30 minutos após a injeção, atinge um pico em torno de 2 a 3 horas e é eficaz por aproximadamente 3 a 6 horas.
- Tipos: Humulin R, Novolin R.
- Insulina de ação intermediária: tem início de ação com cerca de 2 a 4 horas, atinge o pico com 4 a 12 horas e é eficaz por cerca de 12 a 18 horas.
- Tipos: NPH (Humulin N, Novolin N).
- Insulina de ação prolongada: atinge a corrente sanguínea várias horas após a injeção e tende a diminuir os níveis de glicose de forma bastante uniforme ao longo de um período de 24 horas.
- Tipos: insulina detemir (Levemir) e insulina glargina (Lantus).
Referências
- Epidemiology, presentation, and diagnosis of type 1 diabetes mellitus in children and adolescents – UpToDate.
- Complications and screening in children and adolescents with type 1 diabetes mellitus – UpToDate.
- Management of blood glucose in adults with type 1 diabetes mellitus – UpToDate.
- Symptoms & Causes of Diabetes – National Institute of Diabetes and Digestive and Kidney Diseases (NIDDK).
- Type 1 Diabetes – Centers for Disease Control and Prevention (CDC).
- Diagnosis of Diabetes – New England Journal of Medicine.
- Papadakis MA, et al., eds. Diabetes mellitus & hypoglycemia. In: Current Medical Diagnosis & Treatment 2017. 56th ed. New York, N.Y.: McGraw-Hill Education; 2017.
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.