Angina: tipos, causas, sintomas e tratamento

Dr. Pedro Pinheiro

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O que é angina?

A angina, também chamada de angina de peito ou angina pectoris, é um tipo de dor no peito de origem isquêmica que surge quando o miocárdio (músculo do coração) recebe menos sangue que o necessário para o seu normal funcionamento.

Assim como qualquer músculo do organismo, o músculo cardíaco precisa de oxigênio para poder desempenhar adequadamente suas funções, que nesse caso específico é bombear o sangue para todo o corpo. Quando fazemos esforço, a demanda por oxigênio do coração aumenta proporcionalmente à intensidade do exercício. Em contrapartida, quando estamos em repouso, o coração pode bater mais lentamente e a sua demanda por oxigênio fica mais baixa.

A angina de peito surge sempre que o suprimento de sangue ao coração não corresponde à demanda. Por isso, o aparecimento da angina é muito mais comum em situações de esforço. A dor anginosa surge tipicamente nos momentos de atividade física e desaparece quando o paciente fica em repouso.

Pessoas jovens e saudáveis conseguem suprir a demanda cardíaca por oxigênio em praticamente qualquer situação. Mesmo após vários minutos de atividade física intensa. Por outro lado, pacientes idosos e/ou com doenças cardiovasculares podem desenvolver angina após esforços pequenos, como subir um lance de escadas.

A angina pode ser considerada um pré-infarto do miocárdio. Não chega a ser um infarto porque não há morte de tecido cardíaco. Há isquemia, mas não há necrose.

O que é isquemia?

Isquemia é um termo médico que indica um suprimento inadequado de sangue para determinado tecido. A isquemia pode surgir em qualquer área do corpo: pele, membros, olhos, intestinos, cérebro, rins, fígado, etc. Um tecido ou órgão isquêmico é aquele cujas células estão recebendo menos sangue e oxigênio que o necessário para o seu funcionamento normal.

O aporte insuficiente de sangue faz com que as células tenham que mudar do metabolismo aeróbico para o anaeróbico, o que acarreta em progressivo comprometimento das funções metabólicas, mecânicas e elétricas do tecido em sofrimento.

O que é infarto?

O infarto é uma fase posterior à isquemia. Se a falta de sangue e oxigênio for grave ou longa demais, as células que estão sofrendo isquemia começam a morrer e o tecido acometido sofre necrose. A morte celular provocada pela falta de suprimento sanguíneo é chamada de infarto. O infarto também pode surgir em qualquer parte do corpo. Quando a morte de tecido ocorre no músculo cardíaco, dizemos que o paciente sofreu um infarto do miocárdio.

Classificação de acordo com a gravidade

A gravidade da angina pectoris pode ser graduada de acordo com o sistema de classificação desenvolvido pela Canadian Cardiovascular Society (CCS). Esse sistema divide o processo anginoso em 4 classes:

  • Classe 1: Atividades físicas comuns e leves, como andar e subir escadas, não desencadeiam dor. A angina só surge com esforço extenuante, rápido ou prolongado.
  • Classe 2: Ligeira limitação das atividades normais. A dor no peito pode surgir ao andar ou subir escadas rapidamente, subir colinas, andar mais de dois quarteirões ou caminhar ou subir escadas sob condições específicas, como após as refeições, durante tempo frio ou no vento, sob estresse emocional ou nas primeiras horas da manhã.
  • Classe 3: Limitação marcada da atividade física normal. A dor pode surgir ao andar apenas um quarteirão em terreno plano ou subir um lance de escadas.
  • Classe 4: Incapacidade de realizar qualquer atividade física ou surgimento da dor mesmo em repouso.

Tipos de angina de peito

A angina pectoris é habitualmente dividida em dois tipos: estável e instável.

O que é angina estável?

A angina estável é um quadro de dor no peito típica e previsível, que surge quando o paciente faz alguma atividade física ou sofre algum estresse emocional. A dor desaparece após alguns minutos em repouso ou quando o paciente utiliza um medicamento dilatador das artérias coronarianas, como nitrato sublingual.

O que caracteriza uma angina como estável é o fato dela ter curta duração (menos de 20 minutos) e ser desencadeada sempre por esforços físicos de intensidade semelhantes, mantendo-se na mesma classe por vários meses ou anos, de forma que o paciente mais ou menos saiba o tipo de esforço que pode fazer sem desencadear dor.

O que é angina instável?

A angina instável é um quadro de isquemia mais grave, que se caracteriza por:

  • Angina de início recente já com classe 3 ou 4.
  • Angina que surge em repouso.
  • Dor anginosa que dura mais de 20 minutos.
  • Dor anginosa que surge de forma imprevisível.
  • Angina em crescendo, ou seja, angina previamente diagnosticada que apresenta rápido agravamento, subindo de uma classe para outra em pouco tempo.

Distinguir clinicamente uma angina instável de um infarto agudo do miocárdio é muito difícil, pois os sintomas são praticamente iguais. Para tal, costumam ser necessários o eletrocardiograma e a dosagem das enzimas cardíacas (explicaremos as formas de diagnóstico mais à frente).

Os pacientes com angina instável apresentam elevado risco de evoluírem para infarto agudo do miocárdio a curto/médio prazo.

Como surge

Como já referido, a isquemia cardíaca surge sempre que há um desequilíbrio entre a quantidade de sangue que chega ao miocárdio e a demanda do mesmo por oxigênio. O aporte insuficiente de sangue habitualmente surge em pacientes com aterosclerose, quando uma ou mais artérias coronárias apresentam obstrução do fluxo por placas de colesterol, também chamadas de ateromas.

O acúmulo de colestrol nas artérias coronárias reduz de forma significante o volume de sangue que chega ao miocárdio. A angina estável costuma surgir quando pelo menos 50% da luz da artéria encontra-se obstruída.

Angina - doença ateromatosa das artérias coronárias

Além da própria obstrução mecânica ao fluxo de sangue, a doença ateromatosa também torna as artérias mais rígidas, com menor capacidade de se dilatarem em períodos de maior demanda de sangue. Uma artéria coronária saudável é capaz de aumentar em até seis vezes o fluxo de sangue durante atividade física. Já uma artéria com aterosclerose tem muito mais dificuldade de controlar o seu fluxo sanguíneo e frequentemente é incapaz de atender às demandas do músculo cardíaco.

Explicamos a origem nas síndromes coronárias agudas com mais detalhes no artigo: Infarto do Miocárdio – Causas e Prevenção.

Fatores precipitantes

Na maioria dos casos, o esforço físico é o gatilho para o surgimento da dor anginosa. Nos casos mais graves, mesmo esforços mínimos, como tomar banho ou trocar de roupa, podem ser suficientes para desencadear a dor.

O esforço físico, porém, não é a única causa de aumento de demanda de oxigênio pelo coração. Qualquer situação que estimule o aumento do trabalho cardíaco pode servir de gatilho. Alguns exemplos:

A anemia pode desencadear episódios de angina não só porque aumenta o trabalho cardíaco, mas também devido à redução da oxigenação do sangue pelo menor número de hemácias circulantes.

Angina de Prinzmetal (angina variante)

A angina de Prinzmetal, também chamada de angina variante, é uma forma atípica de dor no peito que ocorre em cerca de 2% dos pacientes com isquemia cardíaca. Nesses casos, não há obstrução mecânica das coronárias, mas sim episódios súbitos de espasmos da artéria, que provocam redução aguda do fluxo sanguíneo para o miocárdio com duração média de 2 a 5 minutos.

Falaremos sobre a angina de Prinzmetal em um texto à parte, que será publicado em breve.

Fatores de risco

Os fatores de risco para angina são basicamente os mesmos da aterosclerose. Os principais são:

Sintomas

A angina é tipicamente uma dor na região central ou à esquerda do tórax, que pode irradiar para as costas, mandíbula ou para o braço esquerdo. A dor costuma ser descrita como um aperto ou uma sensação de pressão no peito e é tipicamente desencadeada por esforço ou emoção. Quando o paciente fica em repouso ou faz uso de nitrato sublingual, a dor desaparece.

Já a angina instável é uma emergência médica, pois, nesse caso, a dor anginosa é habitualmente indistinguível da dor do infarto agudo do miocárdio. Ela tem as mesmas características da angina estável, mas é de longa duração, costuma ser mais intensa e não melhora com repouso. O nitrato sublingual pode causar algum alívio, mas não elimina a dor totalmente.

Nem todos os pacientes sentem dor durante um episódio de isquemia miocárdica, especialmente os mais idosos e os diabéticos. Em algum casos, o paciente sente desconforto, queimação no estômago, mal-estar, falta de ar, palpitação, cansaço súbito ou sensação de desmaio. Esses sintomas são chamados de equivalentes anginosos. São apresentações clínicas de isquemia cardíaca sem a dor anginosa típica.

Também existem os episódios de isquemia miocárdica silenciosa, que ocorrem sem que o paciente refira qualquer sintoma.

Sintomas da angina estável

  • Dor de curta duração, geralmente menor que 5 minutos.
  • Previsível.
  • Semelhante a outros episódios de angina estável.
  • Desencadeada por esforço e aliviada com repouso ou nitrato sublingual.

Sintomas da angina instável

  • Dor que surge subitamente, mesmo em repouso.
  • Imprevisível.
  • Duração maior que 20 minutos.
  • Diferente das crises anteriores de angina.
  • Não desparece com nitratos.
  • Apresenta outros sintomas associados, como falta de ar, sudorese e mal-estar.

Se você quiser saber mais sobre as principais causas de dor no peito e os sinais de gravidade, leia: Dor Torácica – Sinais de Gravidade.

Diagnóstico

O diagnóstico da angina pode ser feito com base apenas nas características clínicas da dor e no histórico pessoal do paciente. Estudos mostram que a taxa de acerto é de 93% quando o paciente tem múltiplos fatores de risco e apresenta sintomas típicos da angina.

Porém, a investigação não acaba no momento do diagnóstico. A angina é um sinal de isquemia cardíaca, sendo um forte fator de risco para o infarto do miocárdio. Por isso, todo paciente com angina costuma ser avaliado inicialmente com eletrocardiograma, prova de esforço e ecocardiograma, que servem para avaliar a gravidade da doença isquêmica.

Se os testes citados acima sugerirem que o paciente apresenta elevado risco de evoluir para infarto do miocárdio, ele deve ser submetido a um cateterismo cardíaco, também chamado de cineangiocoronariografia.

Explicamos esse exame com detalhes no texto: Cateterismo cardíaco e Angioplastia com Stent.

Diagnóstico da angina instável

Como já referido, a angina instável deve ser encarada como um infarto. O paciente precisa ser atendido, de preferência, em um serviço de emergência. O diagnóstico diferencial é feito através da dosagem das enzimas cardíacas, principalmente da troponina, que é um marcador de necrose do tecido cardíaco. No caso de infarto, a troponina costuma estar elevada, enquanto na angina instável ela encontra-se dentro dos valores de referência.

Tratamento

O tratamento dos pacientes com angina se baseia em um tripé: mudanças de estilo de vida, medicamentos e procedimentos médicos. Vamos resumi-los.

Mudanças de estilo de vida

O paciente com angina precisa controlar ao máximo os fatores de risco modificáveis. Isso inclui perder peso, melhorar a dieta, praticar atividade física (com orientação do cardiologista), controlar a pressão arterial e o diabetes, reduzir o consumo de bebidas alcoólicas e evitar o estresse.

Parar de fumar é outra medida de suma importância, pois além do tabaco acelerar o processo de aterosclerose, a nicotina tem ação direta sobre as artérias coronarianas, induzindo a constrição das mesmas e aumentando o risco de evento isquêmico. Além disso, o cigarro também reduz a oxigenação do sangue. O resultado é um aumento de 20 vezes no risco de apresentar um episódio de angina quando comparamos pacientes fumantes com não fumantes.

Medicação

O tratamento farmacológico da angina é feito habitualmente com medicamentos antianginosos, que atuam na prevenção e no controle das crises de dor, e com inibidores da agregação plaquetária, que reduzem o risco de trombose e de infarto agudo do miocárdio.

1. Nitratos

Nitratos são medicamentos antianginosos. Os mais utilizados são a nitroglicerina e os nitratos sublinguais, principalmente o mononitrato de isossorbida e dinitrato de isossorbida. Os nitratos são frequentemente usados na prevenção da dor e no tratamento das crises agudas de angina, pois eles relaxam e dilatam os vasos sanguíneos, permitindo que mais sangue flua para o músculo cardíaco. Já existem nitratos em forma de adesivo transdérmico, que podem ser utilizados para prevenir as crises de dor anginosa.

2. Beta-bloqueadores

Os medicamentos da classe dos beta-bloqueadores também devem ser utilizados pelos pacientes com angina. Os beta-bloqueadores atuam reduzindo a frequência cardíaca, a contratilidade do coração e a pressão arterial, principalmente durante o exercício. Todos os tipos de betabloqueadores parecem ser igualmente eficazes no controle da angina de esforço.

3. Bloqueadores dos canais de cálcio

Em geral, os bloqueadores dos canais de cálcio são usados em combinação com beta-bloqueadores ou como um substituto destes quando eles são contraindicados ou causam efeitos colaterais intoleráveis. Os bloqueadores dos canais de cálcio provocam vasodilatação coronária, reduzem a pressão arterial e a contratilidade cardíaca. Os mais utilizados são diltiazem, verapamil, amlodipina e felodipina.

4. Ranolazina

A ranolazina é um antianginoso relativamente novo, que pode ser utilizado em substituição ou em associação com os beta-bloqueadores.

5- Aspirina ou clopidogrel

A aspirina e o clopidogrel são medicamentos que inibem a agregação das plaquetas. Esse efeito ajuda a reduzir o risco de infarto agudo do miocárdio, pois a agregação plaquetária é o primeiro passo na formação de trombos que obstruem por completo a artérias coronárias e provocam necrose miocárdica.

6- Estatinas

Estatinas são medicamentos que ajudam a reduzir os níveis de colesterol. A longo prazo, as estatinas previnem e reduzem a aterosclerose, tendo efeito positivo na prevenção do infarto do miocárdio.

Procedimentos médicos

Nos pacientes com angina instável ou naqueles com angina estável que não melhoram com o tratamento farmacológico, o cateterismo cardíaco está indicado. Se durante o cateterismo o cardiologista identificar alguma artéria coronária gravemente obstruída, ele pode fazer uma angioplastia, que é uma técnica que restabelece o fluxo sanguíneo.

Nos pacientes com múltiplas lesões nas artérias coronárias, o tratamento mais indicado é a cirurgia de revascularização miocárdica, conhecida popularmente como ponte de safena.


Referências


Autor(es)

Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.

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Comentários e perguntas

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6 respostas para “Angina: tipos, causas, sintomas e tratamento”

  1. Michele Nowak

    Dr. eu fiz todos os exames para descobrir a dor no peito, do mais simples até uma angitomografia com score de cálcio, e não deu nada, a única coisa foi que aparece no exame de sangue que estou com o colesterol alto, mesmo assim é indicado fazer um cateterismo,? meu pai era cardíaco e acabou falecendo por isso….

    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro
      Dr. Pedro Pinheiro

      Difícil opinar à distância, mas da forma que você descreve, não parece haver indicação para cateterismo.

  2. marciel

    dr. pedro boa tarde, minha filha sentiu uma dor muito forte do lado do coração e desmaiou e deu tipo uma convulsao entortou o pescoço e fechou as mãos; ela tem arritimia e toma propranolol 40mg 2x ao dia ela te 15anos, o que pode ter acontecido dr.??

    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro
      Dr. Pedro Pinheiro

      De longe é difícil opinar, mas ela pode ter uma arritmia. Justifica a dor no peito e a convulsão.

  3. Paula

    Dr. quem tem angina de peito pode fazer esforço?

    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro
      Dr. Pedro Pinheiro

      Pode fazer sob orientação do cardiologista. Se for angina estável, o médico pode ajudar o paciente a iniciar exercícios leves de forma a melhorar sua capacidade cardiorrespiratória.