O que é o herpes zoster?
O herpes zóster (HZ), conhecido popularmente pelos nomes cobreiro ou zona, é uma doença infecciosa provocada pelo vírus Varicella-Zoster (Human Herpesvirus-3 – HHV-3), o mesmo que causa a catapora (varicela).
Apesar de ser o mesmo vírus, tecnicamente o herpes zóster não é catapora. Os sintomas, a epidemiologia e as complicações são bem diferentes. É o mesmo agente infeccioso, mas não é a mesma doença.
O herpes zóster também não tem a ver com o herpes labial ou herpes genital. Os nomes são semelhantes e eles são causados por vírus da mesma família, Herpesviridae, mas herpes zóster e herpes são duas doenças completamente distintas.
Este texto abordará apenas o herpes zóster. Se você está à procura de informações sobre catapora (varicela), acesse o seguinte link: Catapora (varicela) – Transmissão, sintomas e tratamento.
Como surge o herpes zóster?
Quando somos expostos ao vírus Varicella-Zoster pela primeira vez, fato que ocorre habitualmente durante a infância, desenvolvemos catapora, que é uma doença que se caracteriza por febre e erupções avermelhadas por todo o corpo.
Após uma ou duas semanas de sintomas, o nosso sistema imunológico consegue criar anticorpos, controla a replicação do vírus e a doença desaparece espontaneamente.
O problema é que a cura dos sintomas não é necessariamente a cura do vírus.
Durante a fase inicial da catapora, o vírus invade as terminações nervosas da pele e migra até algumas cadeias de gânglios localizadas próximo à medula espinhal e ao cérebro, conseguindo, assim, permanecer “escondido” do sistema imunológico por períodos que podem durar décadas.
O paciente, portanto, cura-se da catapora, mas permanece infectado pelo vírus Varicella-Zoster pelo resto da vida.
Em geral, isso não é um problema, pois toda vez que o vírus tenta sair do seu “esconderijo” nos gânglios nervosos, o nosso sistema imunológico, que agora possui anticorpos específicos contra o vírus Varicella-Zoster, consegue impedi-lo.
O paciente mantém o vírus encurralado, não apresenta sintoma e nem é capaz de transmiti-lo para outras pessoas.
Entretanto, a nossa batalha contra o Varicella-Zoster depende de um sistema imunológico forte. O vírus pode ficar décadas à espera de um evento que provoque enfraquecimento imunológico para voltar a se multiplicar.
Quando isso ocorre, a reativação do Varicella-Zoster não provoca um novo quadro de catapora, mas sim uma doença diferente, chamada herpes zóster.
Sintomas
Quando o vírus se reativa, ele faz o caminho inverso, viajando do nervo de volta à pele.
Ao chegar à pele, o vírus provoca as lesões típicas do herpes zóster: múltiplas vesículas (bolhas) avermelhadas, que ficam restritas a uma pequena zona do corpo, exatamente aquela inervada pelos nervos que “escondiam” o vírus.
A forma como as lesões do herpes zóster se agrupam, geralmente em “faixa” e nunca ultrapassando a linha média do corpo, é a característica mais importante para o diagnóstico da infecção.
Para entender o porquê da lesão pelo herpes zóster ter esse comportamento é preciso conhecer um pouco sobre a anatomia da medula espinhal e seus nervos. Explicaremos de forma simples.
A medula espinhal está conectada ao cérebro, possui mais ou menos 45 cm de comprimento e fica dentro da coluna vertebral. Ela vai da primeira vértebra cervical, lá em cima do pescoço, até a segunda vértebra lombar.
Ao longo da medula saem vários plexos de nervos periféricos para todo o corpo, que são responsáveis pela inervação de regiões específicas. Cada região do corpo que recebe um ramo dos nervos oriundos da medula é chamada dermátomo.
Cada vértebra lança um par de nervos, cada um inervando uma metade do corpo. A região do mamilo esquerdo e direito, por exemplo, são inervadas por um par de nervos que nasce na altura da 4.ª vértebra da coluna torácica (T4). Já a região do umbigo é inervada por nervos que nascem na altura da 10.ª vértebra torácica (T10).
Portanto, se o vírus Varicella-Zoster estiver escondido em gânglios próximos à raiz do nervo à esquerda da vértebra T10, por exemplo, quando houver reativação, ele viajará até a região do umbigo e causará erupções em uma faixa do abdômen que fica à esquerda do umbigo.
Na foto abaixo, é possível ver uma lesão de herpes zóster acometendo a região inervada por T1 e T2. Repare que a lesão é “em faixa” e termina exatamente na metade do corpo, já que apenas um par do nervo costuma transportar o vírus.
O dermátomo acometido pelo herpes zóster costuma apresentar sensação de queimação ou formigamento durante um ou dois dias antes das lesões surgirem. Também são comuns sintomas gerais de virose, tais como febre e mal-estar.
Quando o herpes zóster aparece, ele costuma começar como uma erupção bem dolorosa e avermelhada, evoluindo rapidamente para as típicas vesículas (bolhas). A região torácica, abdominal e lombar são as mais acometidas.
Novas vesículas vão surgindo ao longo de 3 a 5 dias, geralmente aliviando após 7 a 10 dias, quando as bolhas secam e começam a formar crostas. As lesões e a dor podem demorar até um mês para desaparecem completamente. Em alguns casos, a lesão do zóster deixa cicatriz.
Ao contrário da catapora, que aparece apenas uma vez na vida, o herpes zóster pode recidivar sempre que houver uma queda da imunidade do paciente.
Para ver mais imagens das lesões de pele do herpes zóster, acesse o link: Fotos do herpes zoster.
Complicações
A nevralgia pós-herpética é uma complicação que se caracteriza pela permanência da dor no local acometido, mesmo depois de muito tempo da resolução da lesão. A infecção desaparece, mas a dor fica. Em alguns casos, a dor da nevralgia pós-herpética é tão intensa e contínua, que pode levar o paciente à depressão e à incapacidade física (leia: Neuralgia pós-herpética: o que é, sintomas e tratamento).
Habitualmente, o herpes zóster é autolimitado e acomete uma região pequena do corpo, geralmente só um dermátomo. Se após 7 a 10 dias ainda estiverem surgindo novas bolhas ou se o quadro estiver acometendo vários dermátomos em simultâneo, deve-se pensar na possibilidade de uma doença debilitante do sistema imunológico, como câncer ou AIDS.
A reativação do zóster na face pode ser perigosa, principalmente se acometer a área dos olhos, o que pode levar à perda da visão.
A síndrome de Ramsey Hunt é uma paralisia facial que ocorre pelo acometimento dos nervos faciais pelo herpes zóster. Também é comum nesta síndrome a ocorrência de labirintite.
Formas de transmissão
O paciente com zóster ativo é contagioso apenas para as pessoas que nunca tiveram catapora, ou seja, para aquelas que nunca foram infectadas pelo vírus Varicella-Zoster.
Quem nunca teve catapora, caso entre em contato com algum paciente com cobreiro, irá desenvolver catapora e não herpes zóster, pois a primeira é sempre a forma inicial de contaminação por esse vírus.
As lesões são altamente contagiosas e a transmissão do vírus se dá habitualmente através de mãos infectadas pelas lesões (basta coçar ou tocar na lesão para a haver risco de contaminação das mãos).
É bom reforçar que a doença herpes zóster em si não é transmissível. Ninguém desenvolve herpes zóster sem antes ter tido catapora.
Se você tem cobreiro e julga que nunca teve catapora na infância, o mais provável é que a sua catapora tenha sido tão branda, que ela passou despercebida ou foi confundida com qualquer outra virose comum.
O fato é que para ter herpes zóster, você precisa já ter o vírus Varicella-Zoster escondido no sistema nervoso. Ter contato com alguém com zóster não fará você tê-lo também.
As pessoas que já tiveram catapora ao longo da vida, ou que foram vacinadas, podem ter contato com pacientes com herpes zóster sem risco de desenvolver qualquer doença, pois elas possuem anticorpos contra o vírus Varicella-Zoster.
Fatores de risco
Como já referido, para ter herpes zóster é necessário já ter tido catapora em algum momento da vida. Até 20% dos pacientes com história de catapora na infância apresentarão pelo menos um episódio de cobreiro, que surge, geralmente, após os 50 anos. Entre os pacientes com mais de 85 anos essa taxa sobe para mais de 50%.
O herpes zóster surge quando há uma queda nas defesas imunológicas. Entre os fatores de risco podemos citar:
- Idade acima de 50 anos.
- Estresse físico ou psicológico.
- Privação do sono.
- Diabetes mellitus.
- Câncer.
- Quimioterapia.
- Doenças crônicas.
- Uso de drogas imunossupressoras.
- HIV / AIDS.
Tratamento
Na maioria dos casos, o herpes zóster desaparece espontaneamente após alguns dias.
O tratamento com antivirais por via oral, como o Aciclovir, Valaciclovir ou Fanciclovir, está indicado para acelerar o processo. Esses antivirais são medicamentos que, se iniciados nas primeiras 72 horas de doença, diminuem a severidade, a duração e os riscos de complicações do herpes zóster.
As doses habitualmente usadas para tratar o herpes zóster são as seguintes:
- Valaciclovir: 1000 mg três vezes ao dia por sete dias.
- Fanciclovir: 500 mg três vezes ao dia por sete dias.
- Aciclovir: 800 mg cinco vezes ao dia por sete dias.
Se a doença já tiver mais de 72 horas, mas ainda estiverem surgindo novas lesões, o tratamento com antivirais pode ser tentado.
Não há evidências de que antivirais tópicos, em creme ou pomada, sejam eficazes no herpes zóster.
Em alguns pacientes, a dor do herpes zóster pode ser intensa, e o uso de analgésicos está indicado. Há casos em que a dor é tão intensa, que é preciso lançar mão de opioides (derivados da morfina) para o controle.
Como a dor é de origem neurológica, medicamentos antidepressivos, como a Amitriptilina ou a Nortriptilina, ou anticonvulsivantes, como a Gabapentina ou Pregabalina, também podem ser usados para aliviar os sintomas, principalmente nos casos de nevralgia pós-herpética.
Leia também: Melhores remédios para diferentes tipos de dor.
Vacina contra herpes zóster
Nos últimos anos, a vacinação de crianças contra a varicela (catapora) foi adotada em muitos países e levantou a hipótese de ela também ser eficaz contra o herpes zóster.
As vacinas contra varicela e herpes zóster são basicamente as mesmas, mas para ser eficaz contra o herpes zóster, a vacina precisa ser, no mínimo, 14 vezes mais potente que a vacina contra catapora (i.e. possuir 14 vezes mais partículas virais).
Estudos recentes vêm mostrando que a vacina contra HZ é eficaz na população acima de 50 anos e reduz em até 70% o risco de um episódio de cobreiro.
Além de ser efetiva na prevenção, os pacientes que mesmo vacinados acabam desenvolvendo herpes zóster apresentam uma taxa de complicações bem mais baixa que a população não imunizada.
Portanto, como além de prevenir, ela também reduz a incidência de complicações, a imunização com a vacina contra herpes zóster pode ser utilizada em pessoas com mais de 50 anos, mesmo que elas já tenham tido catapora ou mesmo herpes zóster em algum momento da sua vida.
Atenção: a vacina contra o herpes zóster, como qualquer outra vacina, serve para prevenção da doença, não para o tratamento.
Explicamos as vacinas contra herpes zóster com detalhes no artigo: Vacinas Contra Herpes Zóster (Shingrix e Zostavax).
Herpes zóster na gravidez
O herpes zóster é mais comum em pacientes mais velhos, por isso, a incidência em mulheres em idade fértil é mais baixa. O quadro clínico costuma ser semelhante aos das pacientes que não estão grávidas.
O risco de transmissão do vírus ao feto é baixo, pois o herpes zóster resulta da reativação de um vírus latente e não de uma infecção nova. Não há evidências de que o herpes zóster cause malformações congênitas ou efeitos adversos significativos no desenvolvimento fetal.
O tratamento do herpes zóster na gravidez é feito preferencialmente com aciclovir 800 mg cinco vezes ao dia por sete dias.
Dúvidas comuns
Herpes zóster é contagioso?
Sim, mas apenas para pessoas que nunca tiveram contato com o vírus Varicella-Zoster. Que nunca teve catapora pode se infectar se tiver contato com algum paciente com herpes zóster. Porém, essa pessoa terá catapora e não herpes zóster, que é uma doença que surge apenas quando o vírus sofre reativação.
Quem já teve catapora antes não precisa se preocupar com um possível contágio, pois o sistema imunológico está preparado para impedir nova infecção.
Herpes zóster é perigoso?
O herpes zóster não costuma ser perigoso para indivíduos saudáveis, embora possa causar grande dor e desconforto durante a fase aguda da doença.
Qualquer pessoa com herpes-zóster na face, principalmente próximo dos olhos, por mais leve que seja, deve procurar atendimento médico devido ao risco de danos permanentes aos olhos.
Uma em cada cinco pacientes com zóster desenvolve neuralgia pós-herpética, um quadro de dor permanente mesmo após a resolução das lesões de pele.
Raramente, o herpes zóster pode provocar pneumonia, problemas auditivos, inflamação cerebral (encefalite) ou morte.
Existe herpes zóster interno?
Sim. Este quadro chama-se Zoster sine herpete.
O Zoster sine herpete é uma das manifestações clínicas atípicas do herpes zóster e deriva reativação do vírus varicella-zoster no nervo craniano, nervo espinhal, vísceras ou nervos autonômicos.
Pacientes com Zoster sine herpete apresentam neuralgia (dor de origem neurológica), porém, não manifestam as lesões de pele típicas do herpes zóster, o que torna o diagnóstico clínico bem difícil.
O Zoster sine herpete não só causa sintomas iniciais, como dor neuropática no nervo afetado, como também paralisia de Bell, síndrome de Ramsay Hunt, neuralgia pós-herpética e complicações potencialmente fatais, como encefalite ou acidente vascular cerebral.
Herpes zóster é uma doença autoimune?
Não, o herpes zóster é uma doença infecciosa que surge quando há algum enfraquecimento do sistema imunológico, mas não tem origem autoimune (para ler sobre as doenças autoimunes acesse: Doenças autoimunes: causas, sintomas e tratamento).
Herpes zóster pode ter origem emocional?
Traumas ou estresses psicológicos podem servir de gatilho para o surgimento do herpes zóster. Exemplos são perda do emprego, falecimento de familiares, vida profissional muito estressante, falta de sono adequado, etc.
Quanto tempo dura a dor do herpes zóster?
Na maioria dos pacientes, a dor dura de 2 a 4 semanas. Em alguns pacientes, porém, a dor pode levar até 3 meses para desaparecer completamente. Se após 90 dias não houver melhora, o paciente provavelmente apresenta um quadro de neuralgia pós-herpética.
Referências
- Varicella and herpes zoster vaccines: WHO position paper, June 2014 – World Health Organization.
- Shingles (Herpes Zoster) – Centers for Disease Control and Prevention (CDC).
- Shingles (herpes zoster) – Public Health England.
- Epidemiology, clinical manifestations, and diagnosis of herpes zoster – UpToDate.
- Treatment of herpes zoster – UpToDate.
- Vaccination for the prevention of shingles (herpes zoster) – UpToDate.
- Zoster sine herpete: a review – The Korean journal of pain.
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.
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