O que são a síndrome de Stevens-Johnson e a necrólise epidérmica tóxica?
A síndrome de Stevens-Johnson (SJS) e a necrólise epidérmica tóxica (NET), também conhecida como síndrome de Lyell, são formas diferentes de uma mesma condição clínica, caracterizada por uma reação imunológica grave, geralmente desencadeada por medicamentos. Ambas afetam principalmente a pele e as mucosas, causando inflamação, dor, bolhas e descamação da pele — em alguns casos, semelhante a queimaduras de segundo grau.
Essas reações são classificadas como doenças dermatológicas graves de hipersensibilidade e representam uma emergência médica, com risco elevado de complicações, incluindo infecções graves, comprometimento de órgãos internos e até morte.
Apesar de muitas vezes serem descritas como uma “alergia medicamentosa”, a síndrome de Stevens-Johnson e a necrólise epidérmica tóxica são reações idiossincráticas, ou seja, imprevisíveis e raras. Elas não estão relacionadas à dose do medicamento nem ocorrem em todos os indivíduos expostos, mas sim por uma resposta imune anormal em pessoas geneticamente predispostas.
As duas condições fazem parte de um espectro de gravidade da mesma doença, com a diferença principal sendo a extensão da pele acometida:
- Síndrome de Stevens-Johnson: forma mais leve, com descolamento da pele em até 10% da superfície corporal.
- Necrólise epidérmica tóxica: forma mais grave, com envolvimento superior a 30% da pele.
- Casos com descolamento entre 10% e 30% são considerados formas intermediárias (SJS/NET sobrepostas).
A estimativa é de que apenas 1 a 2 pessoas em cada 1 milhão por ano desenvolvam SJS ou NET, o que caracteriza essas reações como raras, embora extremamente importantes devido à sua gravidade.
Importante: tanto a síndrome de Stevens-Johnson quanto a NET exigem internação hospitalar imediata, idealmente em unidades especializadas no cuidado de grandes queimados, devido à extensão das lesões cutâneas e ao risco de complicações sistêmicas.
Diferenças entre síndrome de Stevens-Johnson e necrólise epidérmica
Como já referido, a síndrome de Stevens-Johnson e a necrólise epidérmica tóxica são manifestações de uma mesma condição clínica, diferenciando-se principalmente pela extensão da área da pele comprometida. Ambas envolvem necrose e descolamento da epiderme, mas com gravidades distintas.
A seguir, um resumo das características mais relevantes:
Característica | Síndrome de Stevens-Johnson | Necrólise Epidérmica Tóxica |
---|---|---|
Porcentagem de pele afetada | Até 10% da superfície corporal | Mais de 30% da superfície corporal |
Acometimento de mucosas | Quase sempre presente | Quase sempre presente |
Sintomas sistêmicos | Menos intensos | Mais intensos |
Mortalidade estimada | Cerca de 3% | Até 30% dos casos |
Risco de sequelas | Moderado | Elevado (incluindo cegueira) |
Em ambas as formas, há comprometimento grave das mucosas — como olhos, boca, vias respiratórias e genitais —, o que contribui para a dor intensa, dificuldade para se alimentar e risco de infecções. A extensão das lesões cutâneas e o estado geral do paciente são os principais determinantes do prognóstico.
Em casos raros, a NET pode evoluir de forma fulminante, com descolamento de quase toda a epiderme em poucas horas, exigindo cuidados imediatos em unidades de queimados.
O que causa a síndrome de Stevens-Johnson e a necrólise epidérmica tóxica?
A síndrome de Stevens-Johnson e a necrólise epidérmica tóxica são desencadeadas, na maioria absoluta dos casos, por uma reação imunológica grave a medicamentos. O organismo responde de forma desproporcional e agressiva a uma substância que, para a maioria das pessoas, seria inofensiva ou bem tolerada.
Esse tipo de reação é considerado idiossincrático, o que significa que é raro, imprevisível e não dependente da dose do remédio. Ou seja, uma pessoa pode desenvolver SJS/NET mesmo com uma dose comum e adequada de um medicamento amplamente usado.
Embora mais comum em adultos, a síndrome também pode afetar crianças. Nestes casos, o gatilho pode ser tanto um medicamento quanto uma infecção viral ou bacteriana. Algumas das infecções mais associadas incluem:
- Pneumonia por Mycoplasma pneumoniae.
- Infecção pelo vírus do herpes simples (HSV).
- Influenza.
- Varicela (catapora) ou herpes zoster.
- HIV.
- Hepatites virais.
- Difteria.
Em casos ainda mais raros, reações semelhantes podem ser desencadeadas por vacinas, exposição a produtos químicos, consumo de ervas naturais, alimentos contaminados ou até neoplasias (tumores).
Quais medicamentos podem causar a síndrome de Stevens-Johnson?
Mais de 200 fármacos já foram implicados como possíveis gatilhos para SJS e NET, mas alguns medicamentos apresentam risco significativamente maior. Os principais são:
- Anticonvulsivantes:
- Carbamazepina.
- Fenitoína (hidantoína).
- Fenobarbital.
- Lamotrigina.
- Ácido valproico.
- Antibióticos:
- Sulfonamidas (ex: sulfadiazina, sulfametoxazol + trimetoprim).
- Penicilinas (amoxicilina, ampicilina).
- Cefalosporinas.
- Nevirapina (antirretroviral).
- Antigotosos:
- Anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs):
- Piroxicam.
- Fenilbutazona.
- Outros imunomoduladores:
- Amitiozona.
- Sulfassalazina.
Fatores genéticos também podem aumentar o risco de reação a alguns desses medicamentos, especialmente em certas populações. Por exemplo, o gene HLA-B*1502 está associado a risco elevado de Stevens-Johnson induzido por carbamazepina em pacientes de origem asiática.
Importante: O início dos sintomas geralmente ocorre entre 1 e 3 semanas após o uso do medicamento, mesmo que ele tenha sido usado anteriormente sem problemas. Por isso, qualquer novo medicamento deve ser informado ao médico se surgirem sintomas suspeitos.
Sintomas
Os sintomas da síndrome de Stevens-Johnson e da necrólise epidérmica tóxica costumam surgir de forma gradual, com um quadro inicial que pode ser confundido com uma infecção viral comum. A progressão é rápida e, em poucos dias, pode haver comprometimento grave da pele e das mucosas.
Evolução dos sintomas: o que observar
Fase inicial (1 a 3 dias)
Os primeiros sintomas costumam surgir entre 1 e 3 semanas após o uso do medicamento desencadeante, e podem parecer um resfriado forte ou gripe. Nesta fase, é comum haver:
- Febre alta.
- Dor de garganta.
- Tosse seca.
- Mal-estar generalizado.
- Ardência, coceira ou vermelhidão nos olhos.
- Dor muscular e articular.
Fase cutânea (após 3 a 5 dias do início dos sintomas)
Logo após o quadro febril, surgem as lesões de pele:
- Máculas eritematosas (manchas avermelhadas), inicialmente simétricas, que podem ter centro violáceo.
- Evolução para bolhas (flictenas), que rapidamente se rompem.
- Descamação da pele (descolamento epidérmico), especialmente em áreas de atrito: rosto, tórax, braços, pernas e virilhas.
- A pele pode apresentar aspecto de queimadura, com dor intensa ao toque.
O couro cabeludo geralmente é poupado. As palmas das mãos e plantas dos pés podem ou não estar envolvidas.

Comprometimento das mucosas
A inflamação das mucosas ocorre em mais de 90% dos casos de SJS e NET e costuma envolver duas ou mais áreas ao mesmo tempo:
- Olhos: conjuntivite intensa, dor, fotofobia, secreção, risco de cicatrizes e até cegueira.
- Boca e garganta: lesões ulceradas, sangrantes e extremamente dolorosas, dificultando a alimentação.
- Lábios: rachaduras profundas, formação de crostas hemorrágicas.
- Região genital e anal: úlceras dolorosas, podendo causar retenção urinária e desconforto intenso.
- Vias aéreas superiores: em casos graves, há risco de obstrução e necessidade de suporte ventilatório.
Outras manifestações clínicas possíveis
Nos casos mais graves, principalmente na necrólise epidérmica tóxica, pode haver comprometimento sistêmico com risco de falência de órgãos. Isso inclui:
- Pulmões: bronquite, insuficiência respiratória.
- Rins: insuficiência renal aguda.
- Fígado: alterações nas enzimas hepáticas.
- Coração: miocardite, arritmias.
- Sepse (infecção generalizada): como a pele funciona como barreira de proteção, o descolamento extenso facilita a entrada de bactérias, levando à infecção grave do sangue (sepse). Essa é uma das principais causas de morte nos casos graves de NET e exige tratamento imediato com antibióticos e suporte intensivo (leia: Sepse: o que é, causas, sintomas e tratamento).
O descolamento da pele pode atingir mais de 30% da superfície corporal em poucas horas nos casos fulminantes de NET, exigindo cuidados semelhantes aos de pacientes com grandes queimaduras.
Quanto tempo duram os sintomas?
A duração total da doença costuma variar entre 2 e 4 semanas, com melhora progressiva após a fase aguda. A regeneração da pele pode demorar dias ou semanas, e o paciente pode apresentar sequelas permanentes, especialmente oculares, cutâneas ou genitais.
Quanto maior a área de pele e mucosa afetada, maior o risco de complicações graves, como sepse, falência de múltiplos órgãos e morte. Por isso, o reconhecimento precoce dos sintomas é fundamental para iniciar o tratamento o quanto antes.
Como é feito o diagnóstico da síndrome de Stevens-Johnson e da necrólise epidérmica tóxica?
O diagnóstico da síndrome de Stevens-Johnson e da necrólise epidérmica tóxica é clínico, ou seja, baseado nos sinais e sintomas apresentados pelo paciente, no exame físico detalhado e na história recente de uso de medicamentos ou infecções. Exames complementares podem ser úteis, mas não são indispensáveis para confirmar o diagnóstico.
O que o médico avalia?
Durante a avaliação clínica, o médico busca por:
- Lesões cutâneas típicas (máculas eritematosas, bolhas, áreas de descamação).
- Comprometimento de mucosas (oral, ocular, genital).
- Distribuição das lesões (geralmente simétrica).
- Evolução rápida da pele afetada.
- Presença de sintomas sistêmicos (febre, mal-estar, dor ocular, dificuldade para comer).
- Histórico recente de uso de medicamentos de alto risco (até 4 semanas antes).
A quantidade de pele descolada (em porcentagem da superfície corporal) é um dos principais critérios para diferenciar SJS de NET, conforme explicado anteriormente.
Exames que podem ser solicitados
Embora o diagnóstico seja baseado na clínica, exames complementares podem ser realizados para:
Confirmar o diagnóstico ou excluir outras doenças:
- Biópsia de pele: pode ser feita em casos atípicos ou quando há dúvida diagnóstica. A análise histológica mostra morte das células da epiderme (necrose queratinocítica) com separação da derme.
- Cultura de lesões ou exames de sangue: para investigar infecção secundária ou sepse.
Avaliar a gravidade clínica:
- Exames laboratoriais gerais:
- Hemograma completo.
- Função renal
- Transaminases (para avaliar função hepática).
- Eletrólitos (sódio, potássio, cálcio, etc.).
- Proteína C reativa (PCR).
- Gasometria arterial (em casos graves).
- Oximetria de pulso e avaliação respiratória: para monitorar oxigenação, especialmente se houver lesão em mucosa respiratória.
Sistema SCORTEN: avaliando o risco de morte
Em hospitais especializados, pode ser utilizado o SCORTEN, um sistema de pontuação que ajuda a estimar o risco de mortalidade no paciente com NET, baseado em fatores como:
- Idade acima de 40 anos.
- Presença de câncer ou doença maligna.
- Frequência cardíaca elevada.
- Níveis elevados de ureia ou glicose.
- Extensão da área de pele descolada.
- Bicarbonato sérico reduzido.
Quanto maior a pontuação no SCORTEN, maior o risco de complicações graves e necessidade de cuidados intensivos.
Diagnóstico diferencial da síndrome de Stevens-Johnson
O diagnóstico da síndrome de Stevens-Johnson e da necrólise epidérmica tóxica pode ser desafiador nas fases iniciais, especialmente porque outras doenças dermatológicas e sistêmicas também causam lesões na pele e mucosas, febre e sintomas sistêmicos.
Por isso, é fundamental que o médico conheça as principais condições que podem simular um quadro de SJS/NET, para evitar atrasos no diagnóstico e na suspensão do agente causador.
Doenças que podem ser confundidas com SJS ou NET
1. Eritema multiforme maior
- Lesões em alvo (“target lesions”), geralmente associadas a infecção por herpes simples.
- Pode envolver mucosas, mas costuma ser menos grave.
- A descamação extensa da pele é incomum.
- Mais comum em adolescentes e jovens.
2. Pênfigo vulgar
- Doença autoimune bolhosa que afeta pele e mucosas.
- Progressão mais lenta e crônica.
- Confirmação por biópsia e imunofluorescência direta.
3. Penfigoide bolhoso
- Também autoimune, mais comum em idosos.
- Bolhas mais tensas e profundas, com menor acometimento de mucosas.
4. Doença do enxerto contra o hospedeiro (GVHD)
- Ocorre após transplantes de medula óssea.
- Pode causar erupções e descamação semelhantes à NET.
5. Síndrome estafilocócica da pele escaldada (SSSS)
- Causada por toxinas produzidas por Staphylococcus aureus.
- Afeta mais lactentes e crianças pequenas.
- Ao contrário da NET, as mucosas geralmente não são comprometidas.
6. Lúpus eritematoso sistêmico (LES)
- O lúpus pode causar lesões cutâneas bolhosas ou ulceradas, além de febre e sintomas sistêmicos.
- O envolvimento de múltiplos sistemas pode confundir o diagnóstico.
7. Reações medicamentosas com eosinofilia e sintomas sistêmicos (síndrome DRESS)
- Pode causar erupção cutânea extensa, febre, linfadenopatia e envolvimento de órgãos internos.
- Evolui de forma mais lenta do que SJS/NET.
Como diferenciar?
A diferenciação é feita com base em:
- História clínica detalhada (exposição a medicamentos, início dos sintomas).
- Distribuição e tipo das lesões cutâneas.
- Acometimento das mucosas.
- Velocidade de progressão.
- Exames laboratoriais e biópsia de pele (em casos duvidosos).
Em muitos casos, a biópsia de pele é decisiva, pois ajuda a confirmar o diagnóstico e excluir doenças autoimunes ou infecciosas com apresentações semelhantes.
Tratamento
O tratamento da síndrome de Stevens-Johnson e da necrólise epidérmica tóxica é considerado uma emergência médica e deve ser iniciado o mais rápido possível. Idealmente, o paciente deve ser internado em unidade de terapia intensiva ou em centros especializados no tratamento de grandes queimados, dada a extensão das lesões cutâneas e o elevado risco de complicações sistêmicas.
A primeira medida fundamental é a suspensão imediata do medicamento suspeito, mesmo que tenha sido iniciado semanas antes dos sintomas. A interrupção precoce do agente causador está diretamente associada à redução da gravidade do quadro e da mortalidade. Após a alta, esse fármaco deve ser evitado por toda a vida.
Uma vez removido o gatilho, o tratamento passa a ser essencialmente suporte clínico intensivo, com atenção especial a:
- Hidratação vigorosa e reposição de eletrólitos, já que a perda de líquidos pela pele lesada pode ser substancial.
- Controle da dor, muitas vezes com uso de analgésicos potentes ou sedação leve.
- Cuidados com feridas, incluindo curativos estéreis e, se necessário, desbridamento das áreas de necrose.
- Prevenção e tratamento de infecções secundárias, com vigilância rigorosa para sinais de sepse.
- Nutrição adequada, por via oral, enteral ou parenteral, a depender do grau de acometimento das mucosas.
- Controle da temperatura corporal, uma vez que a pele danificada compromete a regulação térmica.
As mucosas frequentemente exigem cuidados especializados. Lesões oculares devem ser avaliadas precocemente por oftalmologia, e o uso de colírios lubrificantes, antibióticos tópicos ou lentes terapêuticas pode ser necessário para evitar cicatrizes e perda visual. Já as lesões genitais e orais demandam manejo cuidadoso para prevenir complicações como estenoses e aderências.
Medicamentos
Além dos cuidados de suporte intensivo, algumas terapias farmacológicas adjuvantes vêm sendo estudadas com o objetivo de modular a resposta imune e reduzir a gravidade da doença.
Entre essas opções, a ciclosporina oral vem se consolidando como a mais promissora. Estudos observacionais sugerem que, quando iniciada precocemente (nas primeiras 24 a 48 horas), a ciclosporina pode reduzir a progressão das lesões cutâneas e melhorar o prognóstico. A dose geralmente recomendada varia entre 3 a 5 mg/kg/dia. Por isso, a ciclosporina tem sido a terapia adjuvante preferencial, especialmente nos casos mais graves ou rapidamente progressivos.
Em pacientes nos quais a ciclosporina é contraindicada, uma alternativa viável é o uso de etanercepte, um inibidor do fator de necrose tumoral (TNF-alfa), administrado em dose única. Embora o número de estudos ainda seja limitado, os resultados preliminares são encorajadores, com possível redução da mortalidade.
Já os corticoides sistêmicos, amplamente utilizados no passado, seguem sendo motivo de debate. Ainda que alguns estudos apontem para uma leve redução do risco de morte quando usados precocemente, as evidências continuam inconclusivas. Além disso, não há consenso sobre qual a melhor via, dose ou duração. Por isso, o uso rotineiro de corticoides não é recomendado pelas diretrizes mais atuais, devendo ser avaliado caso a caso.
O uso isolado de imunoglobulina intravenosa (IVIG) também não é recomendado como terapia padrão. Embora tenha sido inicialmente promissor, estudos mais recentes e meta-análises falharam em demonstrar benefício consistente na sobrevida. Seu uso combinado com corticoides ainda está sendo investigado, mas também carece de evidência robusta.
O curso clínico costuma durar entre duas e quatro semanas, mas a recuperação completa da pele pode levar mais tempo. As sequelas variam conforme a gravidade da doença e a extensão das lesões, e podem incluir cicatrizes, alterações na pigmentação, perda de unhas e pelos, além de danos permanentes à visão. A mortalidade gira em torno de 3% nos casos de SJS e pode ultrapassar 30% na NET.
A reabilitação exige abordagem multidisciplinar, com participação de fisioterapeutas, fonoaudiólogos, nutricionistas, psicólogos e especialistas em saúde ocular e urogenital, especialmente nos casos que evoluem com sequelas funcionais.
Complicações e sequelas da síndrome de Stevens-Johnson
A síndrome de Stevens-Johnson e a necrólise epidérmica tóxica são doenças graves que podem deixar sequelas duradouras mesmo após a recuperação clínica. A extensão das complicações está diretamente relacionada à gravidade do quadro, à porcentagem de superfície corporal acometida, à velocidade do tratamento e ao suporte multidisciplinar oferecido durante a internação e após a alta.
Nos casos mais leves, as lesões cutâneas e de mucosas podem cicatrizar completamente, sem deixar marcas significativas. No entanto, formas mais extensas, especialmente as de NET, frequentemente evoluem com sequelas funcionais, estéticas e psicológicas importantes.
Principais complicações agudas
Durante a fase ativa da doença, o paciente está vulnerável a diversas complicações graves, incluindo:
- Sepse: a perda da barreira protetora da pele facilita a entrada de bactérias, podendo levar a infecções sistêmicas potencialmente fatais.
- Desidratação e distúrbios eletrolíticos: causados pela perda de líquidos pela pele exposta e pela dificuldade de ingestão oral.
- Insuficiência respiratória: pode ocorrer devido ao envolvimento das vias aéreas superiores ou por complicações infecciosas, como pneumonia.
- Falência de múltiplos órgãos: incluindo rins, fígado e coração, especialmente nos casos mais extensos e em pacientes com comorbidades.
- Hemorragias: úlceras profundas de mucosa podem sangrar, agravando o estado geral.
- Dor intensa e descontrole térmico: associados à extensa área de pele desnudada, exigem analgesia adequada e controle em ambiente monitorado.
Sequelas de longo prazo
Após a fase aguda, a recuperação completa da pele e das mucosas pode levar semanas ou meses. Algumas alterações, no entanto, são irreversíveis e podem afetar a qualidade de vida do paciente a longo prazo:
Sequelas oculares
- Uma das mais temidas complicações, especialmente nos casos com envolvimento conjuntival.
- Pode incluir olho seco crônico, úlceras de córnea, aderências, simbléfaro e, em casos graves, cegueira permanente.
- Requer acompanhamento oftalmológico precoce e de longo prazo.
Sequelas cutâneas
- Cicatrizes, áreas de hiperpigmentação ou despigmentação.
- Formação de crostas, placas atróficas, e perda de elasticidade da pele.
- Crescimento anormal de pelos ou alterações nas unhas.
Sequelas geniturinárias
- Estenoses uretrais, vaginais ou anais.
- Dor crônica, aderências e dificuldade para urinar ou evacuar.
- Disfunções sexuais, especialmente em mulheres.
Comprometimento do trato gastrointestinal e respiratório
- Estenoses esofágicas, disfagia.
- Lesões em vias aéreas com obstruções ou bronquiectasias.
Impacto psicológico e social
- Ansiedade, depressão e transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) são comuns, principalmente em casos graves ou em pacientes jovens.
- Alterações na aparência física podem causar baixa autoestima, isolamento social e impacto em relacionamentos.
Perguntas frequentes sobre a síndrome de Stevens-Johnson
A síndrome de Stevens-Johnson tem cura?
Sim. A síndrome de Stevens-Johnson e a necrólise epidérmica tóxica são doenças potencialmente graves, mas a maioria dos pacientes se recupera, especialmente quando o diagnóstico é precoce e o tratamento adequado é iniciado rapidamente.
No entanto, mesmo com a cura clínica, é possível que o paciente desenvolva sequelas permanentes, como alterações na visão, na pele ou nas mucosas. A recuperação completa pode levar semanas ou até meses.Quais são os primeiros sinais de alerta?
Os sintomas iniciais da síndrome de Stevens-Johnson costumam parecer com os de uma gripe ou virose, incluindo febre, dor de garganta, mal-estar e irritação nos olhos. O sinal mais importante a ser observado é o surgimento de manchas avermelhadas e dolorosas na pele, que podem evoluir rapidamente para bolhas e descamação, além de feridas na boca, olhos e genitais. A progressão rápida desses sintomas deve motivar busca imediata por atendimento médico.
Quem já teve a doença pode tomar o mesmo remédio novamente?
Não. Uma vez identificado o medicamento responsável pela reação, ele deve ser evitado permanentemente, pois a reexposição pode causar uma nova crise, frequentemente mais grave e com maior risco de morte.
O nome desse medicamento deve constar no prontuário do paciente, e a informação deve ser comunicada a todos os profissionais de saúde envolvidos no cuidado futuro. Em alguns casos, familiares de primeiro grau também devem ser avaliados, especialmente quando há fatores genéticos conhecidos (como o alelo HLA-B*1502 em pacientes asiáticos expostos à carbamazepina).A síndrome de Stevens-Johnson é contagiosa?
Não. A síndrome de Stevens-Johnson não é uma doença infecciosa e não é transmissível entre pessoas. Trata-se de uma reação imunológica individual, geralmente causada por medicamentos ou, em alguns casos, por infecções. Apesar disso, o paciente pode desenvolver infecções secundárias graves, devido à perda da barreira protetora da pele.
Quem teve Stevens-Johnson pode vacinar-se normalmente?
Depende da causa do episódio. Se a reação tiver sido causada por uma vacina específica — o que é bastante raro — essa vacina deverá ser evitada no futuro. Porém, na maioria dos casos — quando o quadro foi desencadeado por medicamentos —, as vacinas seguem indicadas normalmente, inclusive aquelas que previnem infecções respiratórias, que podem desencadear a doença em crianças. O médico responsável deve avaliar caso a caso.
Existe teste para saber se alguém tem risco de desenvolver SJS/NET?
Para a maioria dos medicamentos, não há teste preditivo disponível. No entanto, algumas populações específicas apresentam risco genético documentado. Por exemplo, indivíduos de origem asiática têm risco aumentado de desenvolver SJS com carbamazepina, e nesses casos recomenda-se o teste genético para o alelo HLA-B*1502 antes de iniciar o tratamento. Fora essas situações, ainda não existe rastreio genético universal para prevenir a doença.
Referências
- Stevens-Johnson syndrome and toxic epidermal necrolysis: Pathogenesis, clinical manifestations, and diagnosis – UpToDate.
- Stevens-Johnson syndrome and toxic epidermal necrolysis: Management, prognosis, and long-term sequelae – UpToDate.
- Stevens-Johnson Syndrome – StatPearls – NIH.
- Stevens-Johnson Syndrome and Toxic Epidermal Necrolysis – JAMA.
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.