Efeitos das bebidas alcoólicas sobre a saúde

Dr. Pedro Pinheiro
Dr. Pedro Pinheiro

4 Comentários

Alcoolismo

Tempo de leitura estimado do artigo: 5 minutos

Introdução

O álcool das bebidas, também chamado etanol ou álcool etílico, é uma substância que pode trazer grandes malefícios a vários órgãos do nosso corpo, principalmente ao fígado, pâncreas, coração e cérebro. Nos EUA, os gastos do sistema de saúde e as perdas de produtividades devido a doenças relacionadas ao álcool ultrapassam os 180 bilhões de dólares por ano.

Todavia, ao contrário do cigarro, que faz mal em qualquer quantidade, se as bebidas alcoólicas forem consumidas em pequena quantidade e de forma responsável, o risco de malefícios para saúde pode ser aceitavelmente baixo.

No entanto, são cada vez mais comuns os estudos mostrando que mesmo o consumo de pequena quantidade de etanol, quando feito diariamente, pode aumentar o risco de surgimento de vários tipos de câncer.

Neste artigo faremos uma rápida revisão sobre os possíveis benefícios e malefícios do consumo do álcool. Falaremos também sobre os critérios utilizados para definir alcoolismo e os efeitos agudos da intoxicação pelo álcool.

Após a conclusão deste texto, não deixe de ler também os seguintes artigos relacionados ao consumo de bebidas alcoólicas:

Informações em vídeo

Antes de seguirmos, assista a esse curto vídeo sobre os sinais e sintomas da intoxicação pelo álcool consoante a quantidade de bebida ingerida.

YouTube video

Intoxicação aguda pelo álcool

Em todo o mundo, a intoxicação aguda por etanol está associada a inúmeras complicações, incluindo acidentes de trânsito, violência doméstica, homicídio e suicídio. A morte por intoxicação por álcool continua sendo uma grande preocupação com aumentos substanciais nas últimas duas décadas.

O etanol é um álcool solúvel em água que atravessa rapidamente as membranas celulares. A absorção de etanol ocorre através do sistema gastrointestinal, principalmente no duodeno e no intestino delgado (aproximadamente 80%) e no estômago (aproximadamente 20%). Quando bebemos de estômago vazio, os níveis máximos de etanol no sangue são atingidos entre 30 e 90 minutos após a ingestão.

O consumo excessivo de álcool (binge drinking), que é definido como o consumo de cinco ou mais bebidas alcoólicas para homens e quatro ou mais bebidas para mulheres em uma única ocasião, geralmente resulta em intoxicação aguda por álcool.

Os sinais e sintomas de intoxicação aguda por etanol variam e podem incluir fala arrastada, nistagmo, comportamento desinibido, incoordenação motora, marcha instável, comprometimento da memória, estupor ou coma.

A intoxicação aguda por etanol também pode induzir vários distúrbios metabólicos, incluindo hipoglicemia (baixa glicose no sangue), hipocalemia (baixo potássio no sangue), hipomagnesemia (baixo magnésio no sangue), hipocalcemia (baixo cálcio no sangue) e hipofosfatemia (baixo fósforo no sangue).

Concentração de etanol no sangue

Os sintomas da intoxicação aguda variam consoante a concentração sanguínea de etanol.

A determinação exata da quantidade de álcool circulando no sangue pode ser obtida diretamente através da dosagem sanguínea por exame de sangue ou indiretamente através da respiração, com o chamado bafômetro.

A tabela abaixo resume os efeitos agudos da intoxicação por álcool segundo a concentração sanguínea de etanol:

Concentração de álcool no sangueEfeitos clínicos
20 a 50 mg/dL Coordenação motora fina reduzida.
50 a 100 mg/dLJulgamento prejudicado; coordenação motora prejudicada.
100 a 150 mg/dLDificuldade com a marcha e equilíbrio.
150 a 250 mg/dLLetargia; dificuldade de ficar sentado reto sem ajuda.
300 mg/dLComa (em pessoas não habituadas a beber muito).
400 mg/dLDepressão respiratória (em pessoas não habituadas a beber muito).

Os sinais e sintomas da intoxicação por etanol variam muito dependendo da genética do paciente, do tipo, quantidade e taxa de ingestão de etanol e da frequência e padrão de uso de álcool.

Em indivíduos que usam álcool com pouca frequência, os efeitos clínicos da intoxicação por etanol são mais previsíveis. Por outro lado, os efeitos da embriaguez em indivíduos com histórico de uso crônico de álcool são mais imprevisíveis e esses pacientes podem apresentar pouca evidência clínica de intoxicação mesmo com concentração sanguínea acima de 400 mg/dL.

Calculadora do nível de álcool no sangue

Abaixo fornecemos uma calculadora online para você estimar a sua concentração sanguínea de etanol consoante a ingestão de bebidas alcoólicas.



Existe uma grande variação com relação à velocidade com que cada organismo consegue metabolizar o etanol ingerido. O bebedor desabituado elimina o etanol da corrente sanguínea a uma taxa aproximada de 15 a 20 mg/dL por hora. Pacientes que fazem uso crônico de álcool podem eliminar o etanol a uma taxa de 25 a 35 mg/dL por hora, ou até mais rápido em alguns casos.

Ressaca é o nome dado ao grupo de sinais e sintomas que surgem após a intoxicação alcoólica, entre eles fraqueza, mal-estar, dor de cabeça e intensa sede.

Temos um texto específico sobre bebedeira e ressaca: Ressaca e por que ficamos bêbados.

Benefícios do álcool

Esse texto é basicamente sobre efeitos nocivos do álcool e alcoolismo, porém, não podemos deixar de falar rapidamente sobre os possíveis benefícios do uso responsável do álcool.

Não existem grandes trabalhos científicos sobre os efeitos benéficos do álcool, a maioria consiste em pequenos estudos a curto prazo e com número pequeno de pacientes. Apesar desses defeitos, os estudos que existem realmente sugerem que o consumo moderado possa trazer benefícios, como a redução das doenças cardíacas. Deve-se encarar essas vantagens como algo possivelmente real, mas não como uma verdade já aceita por toda comunidade médica.

Os trabalhos mostram que os benefícios parecem vir do álcool e não de um tipo específico de bebida, como o vinho, por exemplo. A história dos flavonoides do vinho serem cardioprotetores nunca foi comprovada. Parece que qualquer bebida alcoólica tem o mesmo efeito. Nenhuma é superior a outra.

O grande problema é que não existe uma dose ideal de álcool para todo mundo. Em geral, mulheres são mais susceptíveis aos danos do álcool que os homens. Aceita-se que a dose considerada benéfica seja 10 a 15 gramas de álcool, o que equivale a uma taça de vinho ou uma garrafa pequena de cerveja (355 ml) por dia para as mulheres. Homens podem beber um pouco mais como duas garrafas de cerveja ou duas taças de vinho por dia. Há quem julgue que o consumo não pode ser diário, sendo necessário 1 ou 2 dias de intervalo.

É importante salientar que em algumas pessoas, os benefícios cardiovasculares de uma ingestão moderada de álcool acabam não sendo vantajosos, visto que causam um aumento dos riscos de outras doenças como câncer de mama, doenças do fígado e acidentes automobilísticos.

A ingestão de álcool, mesmo que moderadamente, é contraindicada nas seguintes situações:

  • Grávidas.
  • Pessoas com passado de alcoolismo.
  • Pessoas com histórico familiar de alcoolismo.
  • Antecedentes de AVC hemorrágico.
  • Pessoas com doenças do fígado.
  • Pessoas com doenças do pâncreas.

Também devem evitar o consumo regular de álcool pessoas com doenças do estômago e esôfago e aquelas com história familiar forte de câncer de mama.

Não devem beber quantidade alguma de álcool pessoas que irão operar máquinas pesadas ou conduzir carros nas próximas horas.

Em resumo, não sabemos se quantidades pequenas de álcool trazem algum benefício para saúde. Os estudos que sugerem benefícios são de baixa qualidade e de curta duração, o que não nos permite tirar nenhuma conclusão.

Malefícios a longo prazo do consumo elevado de álcool

O consumo de álcool pode ser classifica da seguinte forma:

1. Consumo moderado de álcool (baixo risco de problemas com álcool):

  • Mulheres: no máximo 1 drink por dia e menos de 7 drinks por semana.
  • Homens: no máximo 2 drinks por dia e menos de 14 drinks por semana.
  • Pessoas com mais de 65 anos: no máximo 1 drink por dia e menos de 7 drinks por semana.

2. Consumo elevado de álcool (alto risco de problemas com álcool):

  • Mulheres: mais de 3 drinks por dia ou mais de 14 drinks por semana.
  • Homens: mais de 4 drinks por dia ou mais de 14 drinks por semana.

*1 drink equivale a uma taça de vinho, ou 355 ml de cerveja, ou 45 ml de uísque.

Portanto, mulheres que bebem diariamente duas taças de vinho já não estão enquadradas no grupo de alcoolismo seguro.

O consumo elevado de álcool elimina todos os possíveis benefícios do consumo leve e ainda pode trazer inúmeras complicações para saúde, como:

Além dos problemas acima, todos os benefícios cardiovasculares do consumo moderado se transformam em malefícios no caso de consumo pesado de álcool. Elevam-se os riscos de infartos, insuficiência cardíaca e arritmias.

Além dos problemas de saúde, quem já teve contato com uma pessoa alcoólatra, sabe o poder destrutivo desta droga. Mesmo sem nenhuma doença física, essas pessoas se tornam improdutivas.

O alcoólatra não trabalha, não cuida da família, muitas vezes se tornam violentos e perdem os contatos sociais, além de colocar a vida de outros em risco quando se encontram atrás do volante de um carro.

O alcoolismo é uma doença e apresenta elevada taxa de morbidade e mortalidade. Estima-se que até metade dos acidentes de trânsito fatais estejam de algum modo relacionados ao consumo de bebidas alcoólicas. Nos EUA, onde existem dados mais precisos, cerca de 80.000 pessoas morreram entre 2001 e 2005 por doenças relacionados ao uso abusivo de álcool e 70% dos casos de suicídio em estudantes universitários ocorrem em pessoas com problemas com bebidas.

Uso de álcool com outras drogas, remédios e energéticos

A associação de bebidas alcoólicas com medicamentos pode levar a efeitos colaterais graves, inclusive com risco de morte. O álcool pode tanto potencializar os efeitos de um medicamento quanto neutralizá-lo. Pode também ativar enzimas que metabolizam o medicamento em substâncias tóxicas para o organismo.

Atualmente tem sido muito comum entre jovens a associação de bebidas alcoólicas com energéticos, outras drogas e até com medicamentos para impotência como Viagra.

Falamos mais especificamente das interações do álcool no texto: Interação do álcool com remédios e energéticos

Abuso e dependência do álcool

Consideramos haver uso abusivo do álcool quando o paciente começa a apresentar pelo menos um dos problemas listados abaixo:

  • Dificuldades em desempenhar adequadamente suas tarefas profissionais ou estudantis.
  • Problemas legais relacionados ao uso de álcool com recorrência (por exemplo: agressões e acidentes de carro).
  • Uso continuado do álcool apesar dos problemas sociais e profissionais que o mesmo está causando.
  • Uso frequente do álcool em situações que ameaçam a sua integridade física (conduzir, operar máquinas pesadas, trabalhar na construção civil, etc.) ou uso frequente de álcool até perda da consciência.

O paciente com dependência do álcool, popularmente chamado alcoólatra, é definido quando existem pelo menos 3 dos problemas listados abaixo:

  • Tolerância aos efeitos tóxicos do álcool (necessidade de beber cada vez mais para ficar bêbado).
  • Necessidade de beber álcool depois de algum tempo sem consumi-lo.
  • Consumo de abundante de álcool, sempre maior do que inicialmente planejado.
  • Percepção de que precisa diminuir ou controlar o consumo de álcool, ou sentimento de culpa por beber.
  • Dificuldades profissionais ou sociais devido ao uso abusivo do álcool.
  • Perda de grande parte do dia bebendo, tentando obter álcool ou se recuperando da ressaca.
  • Uso persistente do álcool apesar da noção de que o mesmo o está prejudicando.

O abuso e a dependência do álcool têm estreita relação familiar. Parentes de primeiro grau de pessoas com problemas com álcool tem até 4 vezes mais chances de também tê-lo.

Tratamento do alcoolismo

O tratamento do alcoolismo visa a abstinência do álcool, ou pelo menos uma grande redução no seu consumo, e atualmente envolve psicoterapia e uso de drogas. O tratamento medicamentoso costuma ser usado por até 6 meses.

A naltrexona é atualmente a droga mais indicada. O dissulfiram, topiramato, acamprosato e baclofeno são outras opções.


Referências


Autor(es)

Dr. Pedro Pinheiro

Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.

Saiba mais

Artigos semelhantes

Ficou com alguma dúvida?

Comentários e perguntas

Deixe um comentário