Introdução
O câncer de mama é o câncer mais comum e o que mais leva à morte entre as mulheres. Entender os fatores de risco nos ajuda a identificar as mulheres mais propensas a terem o câncer e a reduzir sua incidência.
É bom salientar que quando falamos em fatores de risco, nos referimos a situações que aumentam a probabilidade do câncer aparecer. Mulheres com fatores de risco não necessariamente terão câncer, assim como a ausência de fatores de risco não elimina a chance de tê-lo. Obviamente, quanto mais fatores de risco um indivíduo possui, maiores são suas chances de desenvolver determinada doença.
No caso específico do câncer de mama, cerca de 70% das mulheres acometidas não apresentam um fator de risco claramente identificável. Porém, quando comparamos mulheres com fatores de risco e mulheres sem fatores de risco, a incidência de câncer é claramente maior no primeiro grupo.
Este texto abordará apenas os fatores de risco. Para saber mais sobre câncer de mama leia:
- Câncer de mama (genes BRCA1 e BRCA2).
- Câncer de mama – auto-exame e diagnóstico.
- 7 sintomas do câncer de mama.
- Classificação BI-RADS.
Podemos dividir os fatores de risco para o câncer da mama entre modificáveis e não modificáveis. Ou seja, há fatores de risco que podem ser eliminados ou atenuados, como consumo de álcool ou sobrepeso, e há fatores que são inerentes à pessoa e não podem ser alterados, tais como idade, etnia e sexo.
Fatores de risco para câncer de mama que não podem ser alterados
Sexo feminino
Este é meio óbvio. Mulheres têm 100 vezes mais chances de ter câncer de mama que homens. Nos Estados Unidos, mais de 280.000 mulheres são diagnosticadas com câncer de mama a cada ano, em comparação com menos de 3.000 casos que ocorrem anualmente em homens. Apenas 1% dos casos de câncer mama surgem em homens.
Idade
O risco de câncer de mama aumenta abruptamente a partir dos 45 anos de idade, chegando ao seu pico ao redor dos 70 anos. Cerca de 77% das mulheres com câncer de mama têm mais de 50 anos.
O risco de câncer de mama em mulheres com menos de 30 anos é de apenas 1 em 2000. Porém, conforme a idade aumenta, a incidência se eleva junto:
- Em mulheres de 50 a 59 anos, 1 em cada 42 desenvolve câncer.
- Em mulheres de 60 a 69 anos, 1 em cada 28 desenvolve câncer.
- Em mulheres acima de 70 anos, 1 em cada 14 desenvolve câncer.
Etnia
A incidência de câncer de mama varia entre diferentes grupos étnicos. Pessoas brancas (caucasianas) apresentam a maior incidência. Mulheres negras têm um risco levemente menor de desenvolver a doença, mas apresentam mortalidade mais alta. Isso se deve a vários fatores, incluindo o diagnóstico em estágios mais avançados, menor acesso a serviços de saúde e a maior frequência de tumores mais agressivos, como o subtipo triplo negativo. Populações hispânicas e asiáticas têm cerca de 30% menos risco de câncer de mama em comparação com mulheres brancas.
História familiar
Ter um parente de primeiro grau com câncer de mama aumenta o risco de tê-lo em 1,8 vezes. Ter dois parentes de primeiro grau com câncer de mama aumenta o risco em 2,9 vezes. Se você tem um parente de primeiro grau com diagnóstico de câncer de mama antes dos 40 anos, então seu risco de também tê-lo antes dos 40 aumenta em 5,7 vezes.
Entretanto, apesar destes dados, apenas 15% das mulheres com câncer de mama apresentam história familiar positiva. Os outros 85% dos casos ocorrem em mulheres sem história familiar.
A história familiar também é importante na identificação de algumas mutações genéticas que favorecem o surgimento do câncer de mama. Quando vários familiares apresentam a doença, provavelmente estamos lidando com uma família que possui mutações nos genes BRCA1 e BRCA 2. Mulheres com estes genes alterados apresentam 65% de chance de terem câncer de mama até os 70 anos.
Os genes BRCA 1 e BRCA 2 são responsáveis por algo em torno de 5% de todos os cânceres de mama. Portanto, a imensa maioria dos casos não está relacionada a estas mutações.
Para saber mais detalhes sobre os genes BCRA1 e BRCA, leia: Genes BRCA1 e BRCA2
História pessoal de câncer de mama
Quem já teve câncer de mama uma vez apresenta quatro vezes mais riscos de ter um segundo câncer de mama, seja na mesma ou na outra mama. Atenção: estou me referindo a um novo câncer de mama e não à recorrência do primeiro.
Lesões benignas da mama
A maioria das lesões benignas não aumenta o risco de câncer de mama. Exemplos incluem fibroadenomas simples, alterações fibrocísticas, papilomas e ectasia ductal. No entanto, algumas lesões, como a hiperplasia ductal atípica e a hiperplasia lobular atípica, são consideradas fatores de risco. Nessas condições, há um crescimento anormal das células nos ductos ou lóbulos mamários, aumentando em cerca de cinco vezes o risco de desenvolvimento de câncer. O acompanhamento médico regular é fundamental nesses casos.
Idade da menarca e da menopausa
Mulheres que tiveram menarca precoce (primeira menstruação antes dos 12 anos) e/ou menopausa tardia (após os 55 anos) apresentam maior risco de câncer de mama. Isso ocorre devido a um período mais prolongado de exposição aos hormônios estrogênio e progesterona. Além disso, a ausência de gravidez ao longo da vida também prolonga a exposição hormonal, contribuindo para o aumento do risco.
Exposição à radiação ionizante na região do tórax
A exposição à radiação ionizante na região do tórax aumenta o risco de câncer de mama, especialmente quando ocorre durante a infância ou adolescência. Isso inclui pessoas submetidas à radioterapia torácica para tratamento de linfomas e sobreviventes de acidentes nucleares. Embora o risco associado a exames diagnósticos que envolvem radiação, como tomografias computadorizadas, seja muito menor, recomenda-se cautela na realização frequente desses procedimentos, principalmente em pacientes jovens.
Altura
Não sabe bem o porquê, mas mulheres mais altas apresentam maior risco de câncer de mama. Mulheres com mais de 1,75 metro apresentam 20% mais risco que mulheres abaixo de 1,60 metro.
Densidade das mamas
As mamas são compostas por tecido adiposo (gordura), fibroso e glandular. Mamas mais densas têm uma proporção maior de tecido glandular e fibroso em relação ao adiposo. Mulheres com alta densidade mamária (quando o tecido denso constitui 75% ou mais do volume total da mama) têm um risco 4 a 5 vezes maior de desenvolver câncer de mama. Além disso, a densidade mamária elevada pode dificultar a detecção de tumores em mamografias, pois tanto o tecido denso quanto os tumores aparecem brancos nas imagens, tornando a diferenciação mais difícil.
Vale ressaltar que a densidade não está necessariamente relacionada ao tamanho das mamas.
Fatores de risco para câncer de mama que podem ser alterados
Idade do primeiro filho e número de filhos
Mulheres que têm o primeiro filho cedo apresentam menor risco de câncer de mama quando comparadas com mulheres que só dão a luz após os 30 anos de idade. Mulheres com o primeiro filho antes dos 20 anos apresentam menos riscos que mulheres com o primeiro filho aos 25 anos, que por sua vez, apresentam menor risco que as mulheres com primeiro parto após os 30 anos.
Mulheres acima dos 40 anos que nunca tiveram filhos são as que apresentam maior risco, cerca de 30% maior que mulheres com filhos. Estima-se que cada filho reduza em 7% o risco de câncer de mama.
Amamentação
A amamentação reduz o risco de câncer de mama. Estima-se uma redução de 4,3% para cada 12 meses de amamentação. Acredita-se que a amamentação diminui os níveis de estrogênio e induz a diferenciação das células mamárias, oferecendo proteção contra o desenvolvimento de células cancerosas. Mulheres que amamentam por períodos prolongados ou que têm vários filhos e amamentam cada um por um tempo significativo estão mais protegidas.
Pílulas anticoncepcionais
Ainda tema controverso, o uso de pílulas anticoncepcionais pode estar associado a um pequeno aumento no risco de câncer de mama, que diminui gradualmente após a suspensão do uso e retorna ao normal cerca de 10 anos depois. Os anticoncepcionais orais atuais contêm doses hormonais mais baixas do que as utilizadas no passado, o que pode reduzir esse risco. A decisão de usar anticoncepcionais deve ser discutida com um médico, considerando os benefícios e os possíveis riscos individuais.
Leia: 10 possíveis efeitos colaterais da pílula anticoncepcional.
Terapia de reposição hormonal
A terapia de reposição hormonal (TRH), especialmente a que combina estrogênio e progesterona, está associada a um aumento no risco de câncer de mama quando utilizada por mais de cinco anos. O risco diminui gradualmente após a interrupção da terapia. Em mulheres que fizeram histerectomia (retirada do útero) e utilizam apenas estrogênio, o impacto no risco parece ser menor. É essencial que a TRH seja usada na menor dose eficaz e pelo menor tempo necessário, sempre sob orientação médica.
Obesidade
O excesso de peso e a obesidade estão associados a um maior risco de câncer de mama, especialmente em mulheres pós-menopáusicas. Após a menopausa, o tecido adiposo se torna a principal fonte de estrogênio no corpo, e níveis elevados desse hormônio podem estimular o crescimento de células cancerosas nas mamas. Mulheres com índice de massa corporal (IMC) acima de 30 kg/m² apresentam um risco significativamente maior em comparação com aquelas com IMC normal.
Consumo de álcool
O consumo de álcool está associado a um aumento no risco de câncer de mama. Mesmo baixos níveis de consumo, como uma dose alcoólica por dia, podem elevar o risco. Existe uma relação dose-resposta: quanto maior o consumo de álcool, maior o risco. Além disso, o álcool pode potencializar o risco associado à terapia de reposição hormonal. Recomenda-se moderação no consumo de bebidas alcoólicas.
Cigarro
Evidências científicas fortalecem a associação entre o tabagismo e o câncer de mama, especialmente quando o hábito de fumar inicia antes do primeiro filho. O fumo passivo também pode aumentar o risco. Além disso, o tabagismo traz diversos outros malefícios à saúde, reforçando a importância de evitar o cigarro para prevenção do câncer e outras doenças.
Atividade física
A prática regular de atividade física reduz o risco de câncer de mama, independentemente do seu efeito sobre o peso corporal. Mesmo 40 minutos de caminhada três vezes por semana são suficientes para obter benefícios. Mulheres que praticam exercícios mais intensos, como até 10 horas semanais de caminhada ou 3 horas semanais de corrida, podem reduzir o risco em até 40%.
Além de diminuir o risco de câncer de mama, a atividade física regular traz benefícios para a saúde geral, incluindo a redução do risco de outras neoplasias e doenças cardiovasculares. A Sociedade Americana de Oncologia recomenda pelo menos 45 minutos de exercício moderado a vigoroso em pelo menos cinco dias da semana.
Trabalho noturno
Mulheres que trabalham em turnos noturnos apresentam um risco maior de desenvolver câncer de mama. Acredita-se que a exposição à luz durante a noite suprime a produção de melatonina, um hormônio que regula o ritmo circadiano e pode ter propriedades anticancerígenas.
A Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC) classifica o trabalho em turnos noturnos que desregulam o ritmo circadiano como possivelmente carcinogênico para humanos (Grupo 2A). É importante que pessoas que trabalham nesse regime adotem medidas para minimizar os impactos sobre a saúde.
Mitos sobre os riscos para o câncer de mama
Uso de sutiã
Circulam na internet rumores de que o uso de sutiã, especialmente modelos com aro ou muito apertados, aumentaria o risco de câncer de mama. Essa teoria sugere que o sutiã causaria constrição dos vasos linfáticos, levando à retenção de toxinas. No entanto, estudos científicos de qualidade não encontraram qualquer associação entre o uso de sutiã e o câncer de mama. As principais organizações de saúde, como o Instituto Nacional de Câncer (INCA) e a Sociedade Americana de Câncer, afirmam que não há evidências científicas que apoiem essa alegação.
O único trabalho que mostrou uma discreta elevação de risco apresentava uma falha metodológica, já que o número de mulheres obesas e com mamas densas, conhecidos fatores de risco, que usavam sutiã era maior que o de mulheres magras.
Existe também um livro chamado “Dressed to Kill” dos autores Sydney Ross Singer e Soma Grismaijer que levantam a hipótese do sutiã causar câncer de mama.
Traduzo aqui a parte da revisão de evidências do National breast and ovarian cancer centre do Governo Australiano que fala sobre o livro (link para a fonte no final do texto):
“O uso de sutiãs, especialmente aqueles com armação ou aqueles que ficam apertados, foi sugerido como fator de risco para o câncer de mama. Dois antropólogos fizeram essa afirmação em um livro chamado “Dressed to Kill”, que descreve um estudo realizado por eles. Vários websites também promoveram esta hipótese, que é baseada em uma teoria de que sutiãs causam constrição física que reduz circulação linfática, resultando na retenção de toxinas cancerígenas. No entanto, o estudo dos antropólogos falha em atender aos padrões científicos atuais para rigorosos testes de hipóteses. Até a atual data, não há estudos cientificamente válidos que apoiem a alegação de que usar sutiãs causa câncer de mama”.
Aborto
Alguns mitos sugerem que o aborto induzido ou espontâneo poderia aumentar o risco de câncer de mama. No entanto, grandes estudos de coorte e análises abrangentes não identificaram qualquer aumento de risco associado ao aborto. Instituições como a Organização Mundial da Saúde (OMS) confirmam que não há relação causal entre aborto e câncer de mama.
Desodorantes antitranspirante
Mais um dos rumores levantados por correntes de e-mail. Não há nenhum embasamento científico e a própria teoria por trás do mito é falha, já que o corpo não elimina toxinas pelo suor. Nosso suor é composto em 99% apenas de água e sais minerais. Quem elimina toxinas no nosso organismo são os rins e o fígado.
Portanto, usar desodorantes não causa câncer de mama.
Implantes mamários de silicone
Os implantes de silicone não aumentam o risco de câncer de mama. No entanto, eles podem criar cicatrizes e dificultar a detecção de tumores em mamografias, podendo ser necessário realizar imagens adicionais.
Recentemente, estudos identificaram uma associação entre implantes mamários texturizados e um tipo raro de linfoma, chamado linfoma anaplásico de grandes células associado ao implante mamário (BIA-ALCL). Embora o risco seja muito baixo, é importante que as pacientes estejam cientes e conversem com seu médico sobre os benefícios e riscos dos implantes.
Cafeína
Não existem trabalhos que atestem qualquer relação entre consumo de cafeína e câncer de mama.
Mamografias anuais
Outro rumor comum é de que a exposição à radiação em mamografias realizadas anualmente possa aumentar o risco de câncer de mama. Isto também é mito, uma vez que a radiação usada em cada exame é extremamente baixa. Na verdade, recebemos anualmente aproximadamente o dobro de radiação de uma radiografia apenas pela exposição solar natural do dia-a-dia.
Traumas
Não há nenhum estudo que demonstre relação entre traumas na mama e o desenvolvimento de câncer de mama.
Referências
- What Are the Risk Factors for Breast Cancer? – Division of Cancer Prevention and Control Centers for Disease Control and Prevention (CDC).
- Breast Cancer – The risk factors – Cancer Australia – Australian Government.
- Breast cancer risk factors – a review of the evidence – National breast and ovarian cancer centre.
- Factors that modify breast cancer risk in women – UpToDate.
- Breast Cancer Prevention (PDQ®) – Health Professional Version – National Cancer Institute – NIH.
- Breast cancer – Risk factors – Cancer Research UK.
- Common Fears With No Evidence: Antiperspirants and Bras – Breastcancer.org.
- Breast Cancer – Risk Factors – National Breast Cancer Foundation.
- Smoking and Risk of Breast Cancer in a Racially/Ethnically Diverse Population of Mainly Women Who Do Not Drink Alcohol: The MEC Study – American journal of epidemiology.
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.