O que é gripe?
A gripe é uma infecção das vias respiratórias provocada por um vírus chamado Influenza, que provoca surtos praticamente todos os anos na época do inverno. Quanto mais frio é o inverno, mais comum costumam ser os surtos de gripe.
A gripe é uma doença benigna na imensa maioria dos casos, possuindo uma taxa de mortalidade abaixo de 1%. Porém, por ser altamente contagiosa, ela é capaz de infectar milhões de pessoas em relativamente pouco tempo, fazendo com que uma taxa próxima de 1% represente, em números absolutos, uma quantidade grande de vítimas. Por isso, a vacinação contra o vírus Influenza tornou-se uma importante medida de saúde pública nos últimos anos.
Neste artigo explicaremos a vacina da gripe, abordando as dúvidas mais frequentes sobre o assunto.
Se você procura informações específicas sobre a gripe, incluindo sintomas, transmissão e tratamento e prevenção, acesse os seguintes artigos:
- Como prevenir a gripe: 8 dicas cientificamente comprovadas.
- 10 sintomas da gripe (e suas complicações).
- Gripe: sintomas, cepas, tratamento e vacina.
- Quais são as diferenças entre gripe e resfriado?
- Gripe H1N1.
O que é a vacina da gripe?
No Brasil e em Portugal, a vacina contra a gripe é feita com vírus morto. Ela contém apenas algumas proteínas específicas do vírus Influenza, chamadas de antígenos, que são capazes de estimular o sistema imunológico a produzir anticorpos.
O vírus Influenza é famoso pela sua elevada frequência de mutação, o que compromete a capacidade do sistema imunológico de criar anticorpos que sejam eficazes a longo prazo. Você pode ter uma gripe hoje e criar anticorpos altamente efetivos contra o vírus Influenza. O problema é que, nos próximos anos, há uma grande chance do vírus circulante já ser diferente daquele que lhe contaminou. Os anticorpos que você criou já não serão efetivos, ou serão apenas parcialmente efetivos, contra a nova cepa mutante.
As grandes epidemias de gripe que surgem de tempos em tempos, como a pandemia do H1N1 (gripe suína) de 2009, ocorrem toda vez que o vírus Influenza sofre mutações tão relevantes, que o tornam praticamente um vírus novo aos olhos do sistema imunológico da maioria da população. O vírus é tão diferente daqueles Influenzas que as pessoas tiveram ao longo das suas vidas, que praticamente ninguém tem imunidade contra o mesmo. Milhões de pessoas adoecem em todo o mudo, e a gripe torna-se manchete de jornais durante semanas.
Contudo, passado o período de crise, a população cria os anticorpos necessários, e a cepa do Influenza que tanto assustou torna-se um micróbio pouco temido e incapaz de infectar grandes multidões (até uma nova mutação aparecer e iniciar o ciclo todo de novo).
Como consequência desta característica do Influenza, existem várias cepas diferentes do vírus circulando ao redor do mundo. Portanto, para uma vacina ser efetiva, ela precisa ser eficaz contra mais de um tipo de Influenza e precisa ser frequentemente atualizada, de forma a estar sempre ativa contra as mutações mais recentes.
Por isso, novas vacinas são produzidas anualmente visando cobrir as cepas do vírus Influenza que circularam mais recentemente. No mundo inteiro há pesquisas para podermos saber exatamente quais são as cepas que estão circulando com mais intensidade, tanto no hemisfério norte quanto no hemisfério sul. São essas pesquisas que orientam a composição da vacina a cada ano.
Atualmente, a produção das vacinas leva, em média, seis meses a partir da seleção das cepas circulantes até o produto final disponível para distribuição. Como as campanhas de vacinação são feitas no outono, a vacina costuma ser elaborada nos meses anteriores, geralmente na primavera. Desta forma, excetuando-se casos de súbitas mutações de grande intensidade, raramente existem desemparelhamentos entre as cepas cobertas pela vacina e as cepas que circulam entre a população.
A escolha pelo outono deve-se pelo fato do sistema imunológico precisar de cerca de um mês para desenvolver plenamente uma imunidade contra as cepas presentes na vacina. Como o pico de incidência da gripe ocorre no inverno, a população vacinada terá tempo suficiente para estar preparada contra o vírus. Porém, mesmo que você não consiga se vacinar no outono, não há problema nenhum em se vacinar no inverno.
É bom destacar que a vacina contra a gripe não contém todas as cepas conhecidas do Influenza, apenas aquelas que provavelmente estarão mais ativas no próximo inverno.
Tipos de vírus Influenza
O Influenza é um vírus RNA da família do orthomyxovirus. Existem quatro tipos de vírus da gripe: A, B, C e D.
Somente os vírus Influenza A e B causam epidemias sazonais e, por isso, são os tipos incluídos nas vacinas contra a gripe. Os vírus Influenza C causam doença respiratória branda e não estão incluídas nas vacinas contra gripe. Os vírus da Influenza D afetam principalmente o gado e não são conhecidos por infectar ou causar doenças nas pessoas.
Os vírus influenza B infectam exclusivamente os seres humanos. Os vírus influenza C infectam humanos e suínos. Já os vírus Influenza A circulam principalmente em aves, mas também podem infectar humanos e várias outras espécies de animais, como porcos, cavalos e mamíferos marinhos.
Os vírus da Influenza A são divididos em subtipos baseados em dois antígenos de superfície: hemaglutinina (HA) e neuraminidase (NA). Existem 18 subtipos diferentes de HA e 11 subtipos diferentes de NA. Os subtipos atuais de vírus da gripe A encontrados em pessoas são os Influenza A (H1N1) e Influenza A (H3N2).
Os vírus da Influenza B não estão divididos em subtipos, mas podem ser classificados em linhagens. Atualmente circulam na comunidade os vírus Influenza B da linhagem B/Yamagata ou B/Victoria.
Vacinas da gripe em 2024-2025
Existem dois tipos de vacinas contra a gripe: trivalente ou tetravalente. As vacinas trivalentes protegem contra três vírus diferentes da influenza: dois vírus Influenza A e um vírus Influenza B. Vacinas quadrivalentes protegem contra quatro vírus diferentes da gripe: dois vírus Influenza A e dois vírus Influenza B.
No Brasil, e em todo hemisfério sul, segundo a recomendação da Organização Mundial da Saúde, as vacinas contra Influenza a serem usadas no país, no ano de 2025, devem conter três (trivalente) tipos de cepas de vírus em combinação, observando as seguintes especificações:
Vacinas trivalentes à base de ovo para hemisfério sul em 2025:
- Influenza A/Victoria/4897/2022 (H1N1)pdm09-like virus;
- Influenza A/Croatia/10136RV/2023 (H3N2)-like virus; and
- Influenza B/Austria/1359417/2021 (B/Victoria lineage)-like virus.
Vacinas baseadas em cultura de células ou recombinantes para hemisfério sul em 2025
- Influenza A/Wisconsin/67/2022 (H1N1)pdm09-like virus;
- Influenza A/District of Columbia/27/2023 (H3N2)-like virus; and
- Influenza B/Austria/1359417/2021 (B/Victoria lineage)-like virus.
Já em Portugal, e em todo hemisfério norte, segundo a recomendação da Organização Mundial da Saúde, as vacinas inativadas contra a gripe na época 2024-2025, devem incluir na sua composição:
Vacinas trivalentes à base de ovo para hemisfério norte em 2024-2025
- Influenza A/Victoria/4897/2022 (H1N1)pdm09-like virus;
- Influenza A/Thailand/8/2022 (H3N2)-like virus; and
- Influenza B/Austria/1359417/2021 (B/Victoria lineage)-like virus.
Vacinas baseadas em cultura de células ou recombinantes para hemisfério norte em 2024-2025
- Influenza A/Wisconsin/67/2022 (H1N1)pdm09-like virus;
- Influenza A/Massachusetts/18/2022 (H3N2)-like virus; and
- Influenza B/Austria/1359417/2021 (B/Victoria lineage)-like virus.
Quem deve tomar a vacina contra gripe?
Qualquer pessoa com mais de 6 meses de idade pode receber a vacina contra a gripe. Porém, há certos grupos que devem receber prioridade nas campanhas de vacinação, pois são eles que apresentam maior risco de desenvolverem complicações.
No caso da gripe, o objetivo das campanhas de vacinação não é eliminar a circulação do vírus, mas sim reduzir a incidência de complicações e, consequentemente, o número de óbitos.
Por isso, o público-alvo destas campanhas são profissionais de saúde, indivíduos com mais de 60 anos, crianças entre seis meses e cinco anos, gestantes durante o período de surto de gripe, indígenas, presos, portadores de doenças crônicas e transplantados.
Se você não faz parte do grupo alvo das campanhas e ainda assim deseja se imunizar contra gripe, não há problema nenhum. A vacina praticamente não apresenta contraindicações. Procure o seu médico ou centro de saúde e informe-se.
Contraindicações
Praticamente todas as pessoas com mais de 6 meses de vida podem ser vacinadas contra a gripe. Em alguns países existe a vacina contra gripe feita com vírus vivo atenuado. Esta vacina possui contraindicações próprias que não serão abordadas neste texto. Vamos nos ater apenas à vacina elaborada com vírus morto, que é a vacina habitualmente utilizada nas campanhas de vacinação.
A principal contraindicação à vacinação contra a gripe é a alergia ao ovo. Como o preparo da vacina utiliza ovos de galinha, as pessoas alérgicas podem desenvolver reações. Se você for alérgico a ovo, não tome a vacina da gripe sem orientação médica.
Também deve haver alguma precaução em relação às pessoas que já tiveram síndrome de Guillain-Barré (SBG). Na verdade, o risco de desenvolvimento desta doença após a vacina da gripe é extremamente baixo, cerca de 1 caso a cada 1 milhão de doses. Isso significa que o risco de se ter uma complicação da gripe é bem mais alto que o risco de desenvolver Guillain-Barré após a vacinação. Se você já teve SGB e faz parte do grupo de risco da gripe, converse com o seu médico sobre os riscos e benefícios da vacina.
Indivíduos com doenças febris agudas não devem tomar a vacina até estarem completamente recuperados.
Efeitos colaterais
As vacinas contra a gripe compostas por vírus mortos são geralmente bem toleradas, sendo o efeito colateral mais comum a dor e a inflamação no local da injeção. Nos estudos clínicos, os eventos adversos graves foram muito raros.
Outros efeitos adversos que podem ocorrer, mas são incomuns e geralmente de curta duração, incluem: dor de cabeça, febre, náuseas, tosse, irritação nos olhos e dor muscular.
Existem casos descritos de desmaios entre adolescentes, mas estes parecem estar mais ligados ao medo de agulha do que à vacina em si.
Perguntas mais comuns
É possível pegar gripe através da vacina?
Não. A vacina é feita com fragmentos do vírus. Não há nenhuma possibilidade de alguém ficar gripado devido à vacinação.
A vacina da gripe também previne resfriados?
Não, apesar de terem sintomas parecidos, a gripe e o resfriado são infecções diferentes, causados por vírus diferentes (leia: Diferenças entre gripe e resfriado).
Mesmo vacinado é possível ficar gripado?
Sim, a vacina cobre as principais cepas, mas não cobre todas. A taxa de sucesso é de cerca de 70 a 90%. Porém, a maioria das pessoas que refere ter ficado gripada mesmo tendo se vacinado, na verdade apresentam quadros de resfriado. Como a maioria da população não sabe distinguir uma gripe de um resfriado, essa confusão é frequente.
Grávidas podem receber a vacina da gripe?
Sim, não só podem como devem.
Pessoas imunossuprimidas, como portadores de HIV ou transplantados, podem ser vacinados.
Sim, não só podem como devem.
Posso tomar a vacina em qualquer altura do ano?
Até pode, mas como o pico de eficácia da vacina ocorre nos primeiros 3 meses, o ideal é tomá-la logo antes do inverno, que é a época que os surtos de gripe costumam surgir. Tomar a vacina muito antes da época de surto pode fazer com que a sua eficácia não seja a pretendida.
Se eu for viajar para o hemisfério norte, a vacina brasileira é eficaz?
Apenas parcialmente, pois as cepas selecionadas não são as mesmas. No ano de 2019, por exemplo, das 4 cepas escolhidas na vacina brasileira, somente 3 estavam presentes na vacina americana e europeia. Por outro lado, se a viagem for para outro país do hemisfério sul, a cobertura é total, pois a composição da vacina costuma ser a mesma.
A vacina da gripe interfere com alguma outra vacina?
Não, a vacina da gripe pode ser administrada no mesmo dia ou próxima de outras vacinas.
Quanto tempo demora para a vacina da gripe ter efeito?
Pelo menos 2 semanas são necessárias para que os anticorpos induzidos pela vacina possam ser produzidos.
É mesmo preciso se vacinar todos os anos?
Sim, a vacinação precisa ser reforçada todos os anos. A vacina que você tomou em 2022 não vai lhe proteger tão bem durante o surto de gripe do inverno de 2023.
Não faço parte do grupo de risco. Ainda assim preciso me vacinar?
Precisar não precisa, pois o risco de complicações da gripe no seu caso é muito baixo. Porém, como a taxa de efeitos adversos da vacina é muito baixa, você estará mais seguro se for vacinado. Na avaliação entre prós e contras, os prós saem vencedores com larga vantagem.
Você conhece alguém que já tenha sido vacinado?
Sim, eu mesmo. Por ser profissional de saúde, eu tomo a vacina contra gripe anualmente desde 2010, sem nunca ter tido qualquer problema. Eu não sou só eu, milhares de profissionais de saúde e pacientes em todo mundo são vacinados todos os anos contra a gripe no outono.
Como aliviar a dor e o inchaço no braço após a vacina?
Para reduzir o edema e a inflamação, compressas frias nas primeiras 24 a 48 horas são úteis. Após 48 horas, se ainda houver dor no local da vacina, as compressas quentes funcionam melhor. Se não houver contraindicações, o paciente pode tomar analgésicos comuns, como paracetamol ou dipirona (metamizol).
Se houver intensa vermelhidão, dor e edema no local após 48 horas, entre em contato com o seu médico.
É possível fazer a vacina da gripe junto com a da covid-19?
Sim, não há problema algum administrar as duas vacinas ao mesmo tempo.
Quem já teve covid-19 pode se vacinar contra a gripe?
Sim, uma coisa não influencia na outra.
A vacina contra gripe protege contra Covid-19 e vice-versa?
Não, a vacina contra gripe protege apenas contra gripe; já a vacina contra Covid-19 protege apenas contra Covid-19.
Referências
- Influenza (Flu) – Centers for Disease Control and Prevention (CDC).
- Influenza vaccines – World Health Organization (WHO).
- Influenza vaccines: challenges and solutions – Cell host and microbe.
- Influenza (flu) – Australian Technical Advisory Group on Immunisation (ATAGI).
- ANVISA
- Seasonal influenza vaccination in adults – UpToDate.
- Seasonal influenza in children: Prevention with vaccines – UpToDate.
- Influenza, Influenza-Associated Mortality, and Novel Influenza A – Missouri Department of Health and Senior Services.
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.