O que é o tromboembolismo pulmonar?
A embolia pulmonar, também chamado embolismo pulmonar ou tromboembolismo pulmonar (TEP), é um quadro grave que ocorre quando um trombo (coágulo) localizado em uma das veias das pernas ou da pelve se solta, viaja pelo organismo e se aloja em uma das artérias do pulmão, obstruindo o fluxo de sangue.
Dependendo do tamanho do trombo, a embolia pulmonar pode até provocar um quadro de morte súbita.
Neste artigo daremos ênfase ao TEP. Se você quiser informações mais aprofundadas sobre a trombose venosa profunda, acesse o link: O que é trombose venosa profunda (TVP).
Como surge a embolia pulmonar?
Para entender a embolia pulmonar é preciso antes saber alguns conceitos básicos como: trombose, embolia, isquemia e infarto. Leia com calma os conceitos abaixo que o resto do texto se tornará mais fácil.
Trombo é uma espécie de coágulo de sangue que se encontra aderido à parede de um vaso sanguíneo, obstruindo a passagem de sangue. A obstrução pode ser parcial ou total. Quando um trombo se forma e obstrui o fluxo normal de sangue, chamamos esse evento de trombose.
Êmbolo é um trombo que se solta da parede do vaso e viaja pela corrente sanguínea. O êmbolo viaja pelo corpo até encontrar um vaso com calibre menor do que ele próprio, causando obstrução da circulação do sangue. Quando o êmbolo impacta em um vaso, damos o nome de embolia. Se o vaso obstruído estiver no cérebro, chamamos embolia cerebral. Se for um vaso no pulmão, chamamos embolia pulmonar.
A trombose costuma ser um processo mais lento, com crescimento progressivo do trombo. Os trombos costumam surgir em áreas do vaso sanguíneo onde já há depósito de colesterol. Já a embolia é um evento mais agudo, que causa uma obstrução súbita do vaso acometido.
Isquemia é a falta de suprimento de sangue para algum tecido orgânico. Toda vez que a circulação de sangue não é suficiente para o funcionamento de um órgão ou tecido, ocorre a isquemia. É um processo reversível, se tratado a tempo. Tanto um trombo quanto um êmbolo podem ser a causa da isquemia.
Infarto é a morte dos tecidos por uma isquemia prolongada. Se a trombose ou a embolia não forem tratadas a tempo, todo o tecido que recebia sangue pela artéria obstruída morre.
Exemplos: se a trombose ocorre nas artérias coronárias, temos o infarto do miocárdio (ataque cardíaco); se ocorre em um vaso cerebral, temos um AVC; se ocorre no pulmão, como no tromboembolismo pulmonar, temos o infarto pulmonar.
A embolia pulmonar é, portanto, uma obstrução de uma das artérias do pulmão causada por um êmbolo, ou seja, um trombo que se soltou das pernas e viajou pela corrente sanguínea até o pulmão. A obstrução de uma artéria do pulmão causa isquemia e infarto do tecido pulmonar que dependia da artéria obstruída para receber sangue e oxigênio. Quanto mais extensa for a área de infarto pulmonar, mais grave será o quadro.
Se o trombo estava em uma veia da perna, como ele vai parar em artéria do pulmão?
Todo o sangue do corpo retorna ao coração pelas veias. Todas as veias do corpo acabam direta ou indiretamente escoando o sangue para a veia cava, a nossa veia mais calibrosa, que termina no coração (especificamente no ventrículo e átrio direito).
O sangue que as veias entregam ao coração é um sangue já “usado” pelos tecidos, ou seja, pobre em oxigênio e rico em gás carbônico. Assim que o sangue chega ao coração, ele é imediatamente bombeado para a artéria pulmonar, que por sua vez irá distribuí-lo por todo o pulmão para este poder se encher novamente de oxigênio. Uma vez suprido de oxigênio, o sangue volta ao coração para ser bombeado novamente para o resto do corpo.
Um trombo pequeno costuma se alojar em artéria pequena e periférica do pulmão. Um trombo grande pode impactar logo após a saída do coração, obstruindo toda a passagem de sangue, levando à morte de todo um pulmão e falência do coração por incapacidade de bombear o sangue contra uma grande obstrução. Os grandes tromboembolismos pulmonares são causas comuns de morte súbita.
Causas
A principal causa de embolia pulmonar são os êmbolos que se originam de tromboses nas veias dos membros inferiores, um quadro chamado trombose venosa profunda (TVP). São pedaços de trombos das veias das pernas, coxas ou pelve que costuma embolizar para os pulmões.
A trombose venosa profunda se manifesta como um quadro súbito de dor, inchaço e vermelhidão de uma das panturrilhas ou da coxas.
Abaixo, uma imagem de uma TVP. Reparem na assimetria das pernas. O lado inchado e avermelhado é onde ocorreu a trombose.
Portanto, um fator quase que obrigatório para haver um tromboembolismo pulmonar é a presença de uma trombose venosa profunda dos membros inferiores. Consequentemente, os fatores de risco para TVP acabam também sendo fatores de risco para embolia pulmonar. São eles:
- Obesidade.
- Tabagismo.
- Varizes e insuficiência venosa dos membros inferiores.
- Câncer.
- Idade avançada.
- Insuficiência cardíaca.
- Síndrome nefrótica.
- Gravidez.
- Pílula anticoncepcional.
- Reposição hormonal.
- Uso de tamoxifeno ou raloxifeno.
- Trombofilias (doenças da coagulação como anticorpo antifosfolipídio).
- Imobilização prolongada, como em casos de pessoas acamadas ou longas viagens de avião.
- Cirurgias, principalmente do quadril ou dos membros inferiores.
De todos os fatores de risco listados acima, gostaria de gastar algumas linhas sobre um deles: cirurgia recente.
Cirurgias, principalmente do quadril ou membros inferiores, apresentam elevado risco de surgimento de uma trombose venosa profunda das pernas nos primeiros dias de pós-operatório. Além do risco de formação de coágulos pela própria cirurgia, esses pacientes ainda ficam vários dias acamados sem poder andar, o que diminui a circulação de sangue nas pernas, favorecendo a formação de coágulos.
A morte súbita em pacientes submetidos a cirurgia recente é quase sempre causada por uma embolia pulmonar de grande volume. Nem sempre a TVP que dá origem ao êmbolo consegue ser identificada, principalmente se o paciente já tiver tido alta do hospital.
A TVP após as cirurgias pode ocorrer mesmo em pacientes jovens e sem outras doenças. Quanto mais fatores de risco um paciente acumular, maiores são suas chances de desenvolver uma trombose dos membros inferiores.
Sintomas
Veja abaixo a imagem de uma angiografia pulmonar. Repare na vascularização do pulmão. Os sintomas da embolia pulmonar vão depender do tamanho do êmbolo e do tamanho da região que sofreu infarto.
Vamos descrever três quadros possíveis de embolia pulmonar. Acompanhe a numeração da imagem.
Começamos pela hipótese 3. Imaginemos um êmbolo pequeno que atravesse toda a circulação pulmonar e só obstrua um vaso de pequeno calibre, já na periferia do pulmão, responsável apenas por uma pequena área de parênquima pulmonar. Como o vaso acometido é pequeno e periférico, não há grandes repercussões na circulação de sangue para o resto do pulmão.
Do mesmo modo, como a área morta de pulmão é pequena, há pouca repercussão na capacidade de oxigenação do sangue. O paciente sente apenas uma dor na região tórax, que piora a inspiração profunda. Pode haver também uma tosse seca e eventualmente expectoração com sangue.
Imaginemos agora um êmbolo um pouco maior, que obstrua os vasos pulmonares na altura do número 2. A obstrução por ser mais central acarretará uma área maior de infarto pulmonar. Todos aqueles vasos após o número 2 vão deixar de receber sangue, levando à isquemia de uma área grande do pulmão. Este paciente, além da dor e da tosse, apresentará também súbita falta de ar, palpitações e tosse com expectoração sanguinolenta. Quanto maior for a área infartada, mais grave será o quadro.
Para terminar, vamos ao exemplo 1. Esse é o chamado tromboembolismo maciço. O êmbolo é tão grande que obstrui a circulação sanguínea de praticamente todo o pulmão. Este quadro é gravíssimo, pois além de infartar todo um pulmão, o sangue que não consegue ultrapassar a barreira imposta pelo êmbolo volta para o coração, causando um súbito aumento da pressão dentro deste e uma rápida dilatação do mesmo. O paciente pode morrer em minutos por falência cardíaca aguda.
Diagnóstico
O diagnóstico da embolia pulmonar é feito através de exames, como a angiotomografia computadorizada, cintilografia pulmonar ou angiografia pulmonar.
Uma vez diagnosticada a embolia, é importante investigar a causa para se poder prevenir novas embolias. Quando o paciente foi submetido a uma cirurgia recentemente, a causa é mais ou menos óbvia e não é necessário grandes investigações.
Por outro lado, há pacientes que apresentam quadros de embolia pulmonar sem nenhuma causa evidente. Nestes pacientes é importante investigar trombofilias, ou seja, doenças do sangue que causam formação espontânea de trombos nas veias.
Tratamento
Na maioria dos casos não há tratamento específico para a embolia pulmonar. O tratamento visa manter o paciente estável, controlando a pressão arterial e fornecendo oxigênio nos casos de hipoxemia (baixa de oxigênio no sangue).
Pacientes com pequenas embolias são tratados apenas com anticoagulantes para impedir novos episódios. A área infartada não tem salvação. O que morreu do tecido pulmonar não é recuperável. Em geral, o paciente fica tomando anticoagulantes por pelo menos 6 meses. Os medicamentos anticoagulantes mais usados são a Varfarina e os chamados novos anticoagulantes orais: dabigatran, rivaroxaban, apixaban ou edoxaban.
Nos pacientes que não podem tomar anticoagulantes ou que continuam fazendo tromboses mesmo com a anticoagulação, um filtro pode ser implantado na veia cava, funcionando como uma espécie de coador, impedindo que trombos grandes passem em direção ao coração.
Nas embolias mais extensas pode ser indicado o uso de trombolíticos, substâncias que diluem o êmbolo, na tentativa de restaurar a circulação sanguínea na área afetada. Os trombolíticos apresentam muitos efeitos colaterais e risco de causar sangramentos graves, inclusive sangramentos cerebrais. Por isso, seu uso só está indicado em casos graves, quando o benefício supera os riscos.
Nos casos graves outra opção é a remoção cirúrgica da obstrução. Também é um procedimento com alto grau de complicações.
Prevenção do tromboembolismo pulmonar
O mais importante no tromboembolismo pulmonar é a prevenção (profilaxia). Como a gravidade de uma embolia pulmonar é imprevisível e nos casos mais graves os pacientes nem sequer chegam ao hospital com vida, é imprescindível realizar a prevenção nos casos com maior risco, como nas cirurgias ortopédicas dos membros inferiores.
Os pacientes em qualquer pós-operatório devem se levantar e andar assim que possível. O uso de meias elásticas especiais também está indicado para reduzir o represamento de sangue nas pernas.
A profilaxia é feita normalmente com anticoagulação, iniciada logo antes da cirurgia. A droga mais usada nesse caso é a heparina em doses baixas. Nos pacientes de alto risco, principalmente naqueles que já tiveram um episódio prévio de embolia pulmonar, pode-se indicar a colocação de um filtro na veia cava para evitar que possíveis êmbolos cheguem aos pulmões.
Pacientes internados e acamados por outras causas também devem usar heparina em baixas doses para prevenir a formação de trombos nas pernas.
Pacientes com antecedentes de doenças da coagulação (trombofilias) devem ficar anticoagulados para o resto da vida.
Outros tipos de embolia pulmonar
A principal causa de embolia pulmonar são as tromboses dos membros inferiores, porém, há outros tipos de embolias:
a. Usuários de drogas injetáveis podem sofrer embolização por materiais presentes na droga. O paciente injeta uma droga não adequadamente diluída na veia e fragmentos viajam até o pulmão, funcionando exatamente como um coágulo.
b. Embolia gasosa ocorre se injetarmos ar nas veias. No sangue não há ar livre e bastam 50 ml de ar para que a embolia gasosa possa ser fatal.
c. Embolia gordurosa ocorre quando há fraturas de grandes ossos, como o fêmur ou ossos da pelve, com liberação da medula óssea para a corrente sanguínea. Fragmentos da medula caem na corrente sanguínea e embolizam para os pulmões. A embolia gordurosa surge geralmente 24 a 72 horas após as fraturas.
d. Embolia séptica ocorre quando pedaços de colônias de bactérias viajam pela corrente sanguínea. Este quadro ocorre principalmente na endocardite, que é uma infecção das válvulas do coração.
Falamos com mais detalhes sobre outras formas de embolia no artigo: O que é a embolia?
Referências
- Evaluation of Patients With Suspected Acute Pulmonary Embolism: Best Practice Advice From the Clinical Guidelines Committee of the American College of Physicians – Annals of internal medicine.
- Venous Thromboembolism – National Institute of Health.
- Overview of acute pulmonary embolism in adults – UpToDate.
- Treatment, prognosis, and follow-up of acute pulmonary embolism in adults – UpToDate.
- Clinical presentation, evaluation, and diagnosis of the nonpregnant adult with suspected acute pulmonary embolism – UpToDate.
- Ferri FF. Pulmonary embolism. In: Ferri’s Clinical Advisor 2017. Philadelphia, Pa.: Elsevier; 2017.
- Goldman L, et al., eds. Pulmonary embolism. In: Goldman-Cecil Medicine. 25th ed. Philadelphia, Pa.: Saunders Elsevier; 2016
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.