O que é a doença de Chagas?
A doença de Chagas é uma infecção provocada pelo protozoário Trypanosoma cruzi, adquirida por meio do contato com as fezes do inseto barbeiro. A doença de Chagas é também conhecida pelos nomes: mal de Chagas, chaguismo ou tripanossomíase americana.
Transmissão
A maioria dos casos da doença de Chagas é transmitido pela picada de um grupo de insetos da família do percevejo, conhecidos como barbeiro.
As principais espécies de barbeiro que transmitem a doença de Chagas no Brasil são: T. brasiliensis, Panstrongylus megistus, T. pseudomaculata e T. sordida.
O T. infestans era outra espécie importante, mas medidas de controle do Ministério da Saúde conseguiram interromper a transmissão da doença de Chagas por este tipo de barbeiro.
O barbeiro é um tipo de percevejo que se alimenta de sangue, podendo transmitir a doença de Chagas através da picada.
Durante ou imediatamente após picar uma pessoa, barbeiro defeca sobre sua pele, eliminando grande quantidade do protozoário Trypanosoma cruzi, permitindo que o mesmo penetre no nosso organismo através da ferida da picada. O ato de coçar o local que foi picado aumenta a chance de contaminação. Os barbeiros costumam se alimentar à noite, sendo capazes picar suas vítimas sem as acordar.
Nem todo barbeiro está infectado com o parasita da doença de Chagas. O barbeiro se contamina ao picar animais que estejam infectados pelo Trypanosoma cruzi. Portanto, o barbeiro adquire o parasita picando uma pessoa infectada, permanece com ele em seu intestino pelo resto da vida e o transmite ao picar uma nova vítima.
É importante destacar que o parasita também é capaz de infectar outros animais além do homem, incluindo cães, gatos, porcos, roedores, gambás, morcegos, etc., sendo estes importantes reservatórios para a transmissão da doença de Chagas para humanos.
Os barbeiros costumam viver em folhas de palmeiras ou em casas de construção rudimentar, como as feitas de pau-a-pique. Galinheiros, chiqueiros e ninhos de pássaros também são locais que podem abrigar o inseto. Pessoas que vivem em áreas infestadas pelo barbeiro são as que apresentam maior risco de serem contaminadas pelo Trypanosoma cruzi.
Outras formas de transmissão da doença de Chagas
A transmissão pela picada do barbeiro é a principal via, mas o Trypanosoma cruzi pode ser adquirido também de outras formas, como:
- Transfusão de sangue.
- Transplante de órgãos de doadores infectados.
- Alimentos contaminados por barbeiros, como caldo de cana ou açaí.
- Transmissão vertical da mãe para o feto durante a gravidez.
- Contato de pele ferida, mucosas ou olhos com sangue de pacientes infectados.
Sintomas
Após a contaminação pelo Trypanosoma cruzi, o período de incubação costuma ser de 1 a 2 semanas. Porém, se contaminação tiver sido provocada por transfusão de sangue, os sintomas podem demorar mais de 40 dias para surgirem.
Os sintomas da doença de Chagas são divididos em fase aguda e fase crônica. Falemos um pouquinho sobre ambas.
Fase aguda
A fase aguda da infecção pelo T. cruzi dura de 8 a 12 semanas e é caracterizada pela circulação de grandes quantidades do parasita na corrente sanguínea. Nesta fase, a maioria dos pacientes não apresenta sintomas. Quando o fazem, são sintomas leves e inespecíficos, como febre e mal-estar. A febre não costuma ser muito alta, ficando ao redor de 37,5 e 38,5ºC. Aumento do tamanho do fígado e do baço também podem ocorrer.
Numa minoria de pacientes, pode surgir um nódulo inflamado no local da picada do barbeiro, conhecido como um chagoma. Se a picada for ao redor de um dos olhos, é comum surgir um inchaço da pálpebra superior e inferior, conhecido como sinal de Romaña.
A forma grave de doença de Chagas aguda, com alta mortalidade, ocorre em menos de 1% dos pacientes; as manifestações podem incluir miocardite aguda (inflamação do músculo cardíaco), pericardite (inflamação do pericárdio, membrana que envolve o coração) ou meningite. A transmissão do parasita por alimentos contaminados parece estar associada a um maior risco de doença aguda grave.
É bom ressaltar, todavia, que na maioria dos casos, a fase aguda é branda e os pacientes não se dão conta de terem sido infectados pelo T. cruzi. A fase aguda termina quando os parasitas desaparecem da circulação sanguínea.
Fase crônica
Existem três apresentações distintas da forma crônica da doença de Chagas:
I. Forma indeterminada:
São os pacientes que se mantêm infectados pelo Trypanosoma cruzi, porém, permanecem sem sintomas. Muitos desses pacientes nem sequer sabem que estão infectados.
Cerca de 20 a 30% dos pacientes com forma indeterminada da doença de Chagas crônica evoluem para doença sintomática, com acometimento cardíaco ou gastrointestinal, após anos ou décadas de doença silenciosa. Os outros 70% permanecem assintomáticos para o resto da vida.
II. Forma cardíaca:
Aproximadamente 30% dos pacientes que se contaminam com o Trypanosoma cruzi apresentam acometimento cardíaco pela doença. A infecção pelo parasita provoca destruição das fibras musculares do coração, levando a um quadro de insuficiência cardíaca grave. O comprometimento cardíaco é o principal responsável por mortes nos pacientes com doença de Chagas. Morte súbita, arritmias e insuficiência cardíaca terminal são as principais causas.
III. Forma gastrointestinal:
O acometimento do trato gastrointestinal ocorre em 10% dos pacientes com doença de Chagas. Uma dilatação exagerada do cólon (megacólon) ou do esôfago (megaesôfago) são as principais manifestações desta forma de Chagas crônica.
O megaesôfago provoca dificuldade para engolir alimentos e regurgitação frequente. O megacólon se caracteriza por prisão de ventre e dor abdominal.
É possível um mesmo paciente apresentar acometimento cardíaco e gastrointestinal concomitantemente.
Diagnóstico
Durante a fase aguda da doença de Chagas, como há grande quantidade do parasita circulando no sangue, o mesmo pode ser facilmente identificado ao se analisar uma gota de sangue no microscópio. Na fase crônica o diagnóstico é feito através da sorologia (pesquisa de anticorpos no sangue).
Tratamento
Quanto mais cedo for instituído o tratamento contra a doença de Chagas, melhores são os resultados clínicos. Preferencialmente, todo paciente deve ser tratado na fase aguda, tenha ele sintomas ou não. O problema é que como nem todos os pacientes nesta fase estão cientes de estarem contaminados com o Trypanosoma cruzi, a maioria acaba não procurando atendimento médico precocemente.
O tratamento precoce tem como objetivos curar a infecção pelo T. cruzi, prevenir lesões de órgãos, como coração e intestinos, e diminuir a possibilidade de transmissão do protozoário. O paciente que já apresenta a forma crônica, com grave lesão dos órgãos apresenta pouco ou nenhum benefício com o tratamento.
Portanto, pessoas que vivem em áreas onde há casos de doença de Chagas ou que passaram férias recentemente em uma delas, como na Região Norte, mais especificamente no Estado do Pará, devem ter muita atenção a quadros de febre e mal-estar, mesmo que estes sejam brandos. Às vezes, é preciso ter um grau de suspeição bem elevado para se detectar a doença de Chagas precocemente.
O Benznidazol é a droga de escolha no tratamento da doença de Chagas aguda. O tratamento deve ser feito por 60 dias e a dose varia conforme o peso do paciente. O Nifurtimox é uma alternativa para os casos de intolerância ao Benznidazol. O tratamento com Nifurtimox é feito habitualmente por 90 dias.
Os esquemas mais indicados são:
- Benznidazol: a dose usual para adultos é de 5 a 7 mg/kg/dia, dividida em duas doses diárias, por um período de 60 dias.
- Nifurtimox: a dose varia entre 8 a 10 mg/kg/dia, dividida em três doses diárias, por 60 a 90 dias.
Referências
- Doença de Chagas – Biblioteca Virtual em Saúde – Ministério da Saúde.
- Chagas disease: Acute and congenital Trypanosoma cruzi infection – UpToDate.
- Chagas disease: Chronic Trypanosoma cruzi infection – UpToDate.
- Chagas disease: Epidemiology and prevention – UpToDate.
- Doença de Chagas (também conhecida como tripanossomíase americana) – Organização Mundial de Saúde.
- Doença de Chagas – Doenças infecciosas e parasitárias – Guia de Bolso, Ministério da Saúde.
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.