Introdução
O teste de Schiller é um teste que pode ser usado durante o exame ginecológico para auxiliar o médico a encontrar áreas com lesões suspeitas no colo do útero.
O teste foi batizado em homenagem ao médico Walter Schiller, que ao redor 1930 descreveu o método de pesquisar células cancerígenas no colo do útero através da coloração do mesmo com uma solução à base de iodo, chamada de solução de lugol ou solução de Schiller.
Neste artigo explicaremos o que é o teste de Schiller, quais são as suas aplicações atualmente no rastreio do câncer do colo do útero e o que significam os resultados teste de Schiller positivo e negativo.
Nota: uma forma alternativa de realizar esse teste pode ser feito substituindo o lugol por uma solução de ácido acético (vinagre).
O que é o teste de Schiller?
Um dos objetivos do exame ginecológico é visualizar diretamente o colo do útero, também chamado de cérvix uterino. Em muitos casos, apenas a olho nu é possível notar a presença de lesões no colo do útero, sejam elas lesões inflamatórias típicas das cervicites, úlceras, feridas, etc.
O teste de Schiller e o teste do ácido acético são feitos de forma a aumentar a nossa capacidade de identificar áreas com lesões do colo uterino, que muita vezes podem parecer normais ao olho nu.
O teste é feito com uma zaragatoa, uma espécie de cotonete muito comprido. O ginecologista encharca a ponta da zaragatoa, que é revestida de algodão, com iodo (ou ácido acético) e “pinta” toda a região do colo do útero, como se usasse um pincel. Após um minuto de espera, o médico volta a visualizar o colo do útero para tentar identificar áreas que ficaram pouco coradas.
A lógica por trás do exame é a seguinte: as células normais do colo uterino e da vagina são ricas em glicogênio, uma grande molécula feita de várias pequenas moléculas de glicose. O iodo consegue impregnar os tecidos ricos em glicogênio, mantendo-os escuros (pintados). Já as células cancerígenas ou pré-cancerígenas são pobres em glicogênio e, por isso, não se impregnam com o iodo, mantendo-se mais claras, geralmente amareladas, e facilmente distinguíveis do resto do tecido saudável, que permanecesse corado de marrom (cor do iodo).
Chamamos de teste de Schiller positivo toda vez que houver alguma área amarelada do colo uterino, que não fica corada com o lugol, sugerindo a presença de células atípicas.
Por outro lado, o teste de Schiller negativo ocorre quando todo o cérvix uterino se cora de marrom, evidenciando a presença de tecido rico em glicogênio e, portanto, saudável, por toda a área pintada. Quando há áreas que não se coram, mas não ficam amareladas, em geral, consideramos que o teste é negativo.
O teste do ácido acético tem uma lógica semelhante, mas o mecanismo é diferente. O ácido acético desidratada as células de forma heterogênea, sendo o seu efeito mais pronunciado nas células atípicas que nas células sadias. O resultado final é uma coloração brancacenta em todo o tecido que for composto por células suspeitas.
Não há grandes diferenças de resultado entre ambos os testes. A coloração com o ácido acético deve ser o teste de escolha para as mulheres com história de alergia ao iodo.
A presença de manchas brancas no colo uterino após o uso do ácido acético ou a ausência de impregnação do iodo em certas áreas coradas com o lugol indicam a realização de colposcopia ou biópsia do tecido, caso existam alterações visíveis da morfologia do tecido não corado. Um teste de Schiller positivo não indica necessariamente a existência de um câncer. Ele é apenas o primeiro passo no rastreio de tumores.
Utilidade do teste
A grande vantagem do teste de Schiller é o fato dele ser muito barato, estando disponível mesmo em áreas com poucos recursos técnicos. Outra vantagem é a ausência de efeitos colaterais relevantes e de contraindicações absolutas (os pacientes com alergia ao iodo podem usar o ácido acético).
O teste de Schiller e do ácido acético foram muito utilizados durante décadas pelos ginecologistas como forma de rastrear lesões malignas do colo do útero. Entretanto, nos últimos anos, o seu uso como teste de rastreio tem se tornado menos frequente, principalmente em áreas com fácil acesso a novos recursos médicos e laboratoriais.
Atualmente, a forma mais comum de rastrear o câncer de colo uterino é através do exame de Papanicolau, chamado também de exame de citologia cervical (leia: Exame de Papanicolau – ASCUS, LSIL, NIC1, NIC 2 e NIC 3).
Durante o exame ginecológico, o médico colhe material do colo uterino e do seu orifício com uma espátula e uma escova de forma a captar células para que um médico patologista possa visualizá-las em um microscópio, à procura de células malignas. O material colhido no Papanicolau também pode ser usado para pesquisa do HPV, que é o vírus que causa o surgimento do câncer do colo do útero (leia: HPV | Câncer do colo do útero).
O teste de Schiller e do ácido acético podem estar falsamente positivo nas mulheres na menopausa ou nos casos de cervicite (inflamações/infecções do colo uterino). Também é bom lembrar que nem todas as células pobres em glicogênio são necessariamente malignas ou pré-malignas. Por isso, muitos médicos já não consideram necessária a coloração do cérvix uterino como lugol ou ácido acético, pois o papanicolau é um exame mais confiável e com menores taxas de falsos positivos e falsos negativos.
Porém, apesar de não serem mais utilizados como exame de rastreio, o teste de Schiller ou do ácido acético ainda são úteis para o ginecologista. Se o exame de Papanicolau for sugestivo de lesão pré-maligna, a paciente precisa ser submetida a uma colposcopia com biópsia do colo do útero para descartar a existência de um câncer em fases iniciais. Durante este procedimento, a utilização do lugol ou do ácido acético ajuda o ginecologista a identificar áreas suspeitas e a escolher os melhores pontos para serem biopsiados (leia: Colposcopia e biópsia do colo uterino).
Portanto, atualmente, em áreas com recursos, a utilização do teste de Schiller ou do teste do ácido acético costuma ficar restrita àquelas pacientes que serão submetidas à biópsia do colo uterino. Nos locais mais pobres, com menos recursos e sem acesso ao teste do Papanicolau, o teste de Schiller ainda pode ser utilizado como opção para o rastreio do câncer cervical.
Referências
- Cervical cancer screening tests: Visual inspection methods – UpToDate.
- Vaginal intraepithelial neoplasia – UpToDate.
- Use of Schiller’s test versus Pap smear to increase detection rate of cervical dysplasias – International Journal of Reproduction, Contraception, Obstetrics and Gynecology.
- Schiller’s Iodine Test – Preinvasive Carcinoma of the Cervix.
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.
Deixe um comentário