O que é a febre Zika?
O Zika vírus (ZIKAV ou ZIKV) é um vírus da família Flaviviridae, o mesmo da dengue e da febre amarela. Ele é responsável pelo desenvolvimento de uma doença febril, que costuma apresentar um quadro clínico semelhante ao da febre Chikungunya, que é uma espécie de dengue mais branda.
Assim como a dengue e a febre Chikungunya, a febre Zika também é uma infecção típica de países de clima tropical, transmitida através de mosquitos, como o Aedes aegypti.
A febre Zika é uma doença nova no Brasil. Como esse vírus é transmitido por um mosquito presente em boa parte do território nacional e nunca havia circulado na população brasileira, o que significa dizer que as pessoas não têm imunidade contra essa virose, a doença rapidamente se espalhou por vários estados do país.
O vírus Zika foi identificado pela primeira vez em 1947, em Uganda, em um macaco rhesus que estava sendo utilizado em uma pesquisa sobre febre amarela. Até aquele momento, o vírus era desconhecido e não havia casos relatados de infecção nos seres humanos. A primeira descrição de febre Zika em humanos ocorreu em 1954, na Nigéria. Desde então, casos esporádicos de febre Zika têm sido descritos em países da África tropical e sudeste da Ásia.
Em 2007, porém, o primeiro grande surto de febre Zika foi descrito na Micronésia, no Pacífico sul. De lá pra cá, várias ilhas do Pacífico sul têm apresentado casos frequentes de febre Zika, o que tem chamado a atenção das autoridades de saúde sobre uma possível disseminação do vírus por vários países da Oceania e da Ásia.
Inesperadamente, o vírus Zika foi descoberto no Brasil em maio de 2015, na Bahia, trazido provavelmente por algum turista. Alguns especialistas acham que a introdução do vírus no Brasil se deu durante a maciça vinda de turistas na Copa do Mundo de 2014.
Transmissão do Zika vírus
Assim como o vírus da febre amarela, o vírus Zika pode causar doença em seres humanos e macacos, sendo ambos um reservatório para a contaminação de mosquitos da família Aedes, tais como Aedes aegypti, Aedes africanus, Aedes apicoargenteus, Aedes furcifer, Aedes luteocephalus e Aedes vitattus. Destes, apenas o primeiro existe no Brasil. O Aedes albopictus, outro membro da família Aedes existente no Brasil, é também um provável vetor da febre Zika, apesar do isolamento do vírus neste mosquito ainda não ter sido demonstrado.
O Aedes aegypti infecta-se com o Zika vírus toda vez que ele pica uma pessoa ou macaco previamente infectado. Assim como ocorre na dengue e na febre amarela, o mosquito não se torna imediatamente um transmissor do vírus. Após ser ingerido pelo mosquito, o Zika vírus ainda precisa de cerca de 10 dias para multiplicar-se e migrar do sistema digestivo para as glândulas salivares do Aedes. Só a partir deste momento é que o mosquito passa a ser capaz de transmitir o vírus durante a picada.
A febre Zika não é uma doença contagiosa, portanto, não é preciso impedir que o paciente infectado tenha contato com outras pessoas.
Se você quiser aprender a identificar o mosquito Aedes aegypti, acesse o seguinte link: Reconheça o mosquito da dengue.
Outras formas de transmissão
O vírus Zika pode ser encontrada em fluidos biológicos, como leite materno, urina, sêmen e saliva. Isso NÃO significa, porém, que esses fluidos sejam necessariamente fontes de contaminação.
Até o momento, nenhum estudo conseguiu demonstrar que o vírus é capaz de se replicar no leite materno, o que sugere que há partículas do vírus no leite, mas não vírus viável para contaminação. Portanto, até o momento, não há dados clínicos que indiquem o vírus Zika seja transmitido pelo aleitamento materno. Deste modo, não motivos que justifiquem a suspensão da amamentação por parte de mães que vivem em áreas de epidemia.
A transmissão sexual do vírus Zika também é possível, apesar de ser menos comum que a transmissão por mosquitos. O vírus Zika pode ser encontrado no sêmen mesmo após a cura clínica do paciente, quando já não há mais vírus detectável no sangue. Há relatos de pacientes que ainda apresentavam o vírus nas secreções penianas 30 a 40 dias após terem tido o quadro de Zika. Já nas mulheres o vírus costuma permanecer nas secreções vaginais por menos tempo, ao redor de 11 dias após o desaparecimento dos sintomas.
Portanto, o mais prudente é que pessoas que tiveram Zika recentemente utilizem métodos contraceptivos de barreira, tais como a camisinha, durante cerca de 2 meses, que é o tempo máximo que o vírus costuma estar presente nas secreções genitais. Em casos de homens contaminados com esposas grávidas, a orientação é para o uso da camisinha durante toda a gestação.
Apesar do vírus poder ser encontrado na saliva, não existe nenhum caso relatado de transmissão da febre Zika através do contato com esse fluido, seja através de beijos, tosse ou espirro.
Sintomas
Após ser picado por um mosquito Aedes contaminado, o paciente leva de 3 a 12 dias (período de incubação) para começar a apresentar manifestações clínicas. Estima-se que apenas 1 em cada 5 pessoas contaminadas (20%) irá desenvolver sintomas da febre Zika.
Dentre aqueles que desenvolvem sintomas, o quadro costuma ser de febre baixa (por volta de 38-38,5ºC), dor de cabeça, dor muscular, dor nas articulações, principalmente as pequenas, como dedos das mãos e dos pés, conjuntivite, dor nos olhos, fotofobia, coceira na pele e rash (erupções avermelhadas na pele).
São sintomas menos comuns, mas também possíveis: dor abdominal, diarreia, prisão de ventre, aftas, tontura ou perda do apetite.
As manchas vermelhas que surgem na pele na febre Zika são chamadas de rash maculopapular, o que significa que são pequenas e múltiplas manchas avermelhadas com discreto relevo. Essas pequenas manchas podem se confluir, formando grandes manchas avermelhadas.
O rash da febre Zika costuma ser bem difuso, iniciando-se na face e depois disseminando-se pelo pescoço, tronco e membros. Algumas pessoas queixam-se de coceira intensa. Com 2 a 3 dias, o rash começa a melhorar e desaparece dentro de 1 semana.
A febre Zika é uma infecção benigna, que costuma durar de 2 a 7 dias e não provoca complicações hemorrágicas como a dengue. O quadro de dor nas articulações pode demorar até 1 mês para desaparecer.
A distinção entre a febre Zika, a febre Chikungunya e casos mais brandos de dengue apenas pelos sinais e sintomas é muito difícil de ser feita. Para tal, são necessários exames laboratoriais.
Complicações da febre Zika
Assim como ocorre em outras viroses, uma das complicações possíveis da febre Zika é o desenvolvimento da síndrome de Guillain-Barré (SGB), uma complicação de origem neurológica que causa progressiva e temporária perda de força muscular. Explicamos a SGB em detalhes neste artigo: SÍNDROME DE GUILLAIN-BARRÉ – Sintomas e tratamento.
Febre Zika na gravidez – Microcefalia
No dia 28 de novembro de 2015, o Ministério da Saúde confirmou ser muito provável haver relação causal entre a febre Zika e casos de fetos com a microcefalia, uma malformação neurológica na qual o tamanho da cabeça do feto ou da criança é menor do que o esperado para a idade.
Esse achado é surpreendente, pois é a primeira vez no mundo que essa complicação é descrita. A febre Zika é comum em vários países da Ásia e da África, e esse tipo de malformação nunca havia sido relatada. Os casos no Nordeste brasileiro foram os primeiros a serem notificados.
Aparentemente, o risco de microcefalia é maior se a gestante contrair a febre Zika nos primeiros três meses de gravidez (primeiro trimestre), que é o momento em que o feto está sendo formado. O risco parece existir também, porém em menor grau, quando a virose é adquirida no 2º trimestre de gestação. A partir do 3º trimestre, o risco de microcefalia é baixo, pois o feto já está completamente formado.
O fato de uma gestante ter febre Zika durante a gestação não é garantia de que o feto terá malformações. Por ser uma complicação recentemente identificada, ainda não sabemos exatamente qual é o percentual de gestantes infectadas que acabam por ter filhos com microcefalia. Alguns estudos mais recentes sugerem um risco de 14% caso o vírus seja contraído ainda no primeiro trimestre nas mulheres brasileiras. Isso significa que 1 em cada 7 grávidas contaminadas terá um filho com microcefalia.
É importante destacar, porém, que estudos realizados com grávidas contaminadas pelo vírus Zika no primeiro trimestre na Polinésia Francesa detectaram um risco muito mais baixo, de apenas de 1%. Nesta população, apenas 1 em cada 100 mulheres contaminadas pelo Zika no início da gravidez tiveram filhos com microcefalia. O porquê de o risco de microcefalia ser muito maior no Brasil ainda é um mistério.
Pelo que sabemos até o momento, as mulheres que tiveram a doença e ficaram curadas antes de engravidar não apresentam risco de terem fetos com microcefalia pelo vírus Zika. Porém, o intervalo de dias entre a infecção e a gravidez que pode ser considerado seguro ainda não é muito certo. Atualmente, baseado em estudos preliminares, sugere-se 8 semanas de intervalo após o desaparecimento dos sintomas para que a mulher volte a tentar engravidar, mas essa orientação ainda precisa ser confirmada por mais estudos.
Se você quiser saber mais sobre a microcefalia, leia: Microcefalia – Causas, Sintomas e Tratamento.
Mulheres em áreas com surto de Zika devem evitar a gravidez?
Isso é um assunto polêmico. Apesar de alguns especialistas terem ido à televisão e aos jornais sugerir que as mulheres em áreas de surto não engravidem, o Ministério da Saúde não compartilha dessa mesma opinião. O fato é que se formos olhar com atenção aos números, vamos constatar que nos últimos 3 meses de 2015, época que em que os casos de microcefalia começaram a aumentar de forma alarmante, menos de 0,5% de todas as gestantes em áreas de surto tiveram comprovadamente bebês com microcefalia associada ao vírus Zika. Ou seja, mais de 99,5% das gestantes tiveram filhos nessas regiões sem problemas.
Portanto, apesar de ser uma situação que merece muita atenção, sugerir que a toda a população de várias regiões do Brasil deixe de engravidar parece ser uma solução radical demais no momento.
Diferenças entre febre Zika, Dengue e Chikungunya
Diagnóstico
O diagnóstico de certeza da febre Zika é feito através de um exame de sangue chamado sorologia para o Zika vírus. A sorologia consiste na pesquisa de anticorpos específicos contra o vírus Zika. A lógica por trás desse exame é a seguinte: só terá anticorpos contra o vírus Zika, as pessoas que já foram contaminadas pelo mesmo.
Os primeiros anticorpos contra o vírus Zika costumam surgir com 5 dias de doença. Em geral, sugere-se que o paciente faça o exame de sangue no 5º dia de doença e depois repita-o após 2 a 3 semanas para que os níveis de anticorpos possam ser comparados.
A sorologia é o método mais simples, mas segundo o ministério da Saúde, esse método ainda não está disponível comercialmente no Brasil.
O diagnóstico dos casos de Zika no Brasil é habitualmente feito com uma técnica chamada de PCR, que pesquisa diretamente no sangue do paciente a presença de material genético do vírus. Esse exame é mais confiável, porém é mais caro e não está disponível em todos os locais, apenas nos laboratórios de referência do Ministério da Saúde.
Como a febre Zika é benigna e de curta duração, o diagnóstico acaba servindo muito mais para controle epidemiológico do que para auxílio no tratamento. Na verdade, quando o resultado do exame de sangue fica pronto, a grande maioria dos pacientes já não apresenta mais sintomas da doença.
Tratamento
A febre Zika é uma doença autolimitada, que se cura espontaneamente em poucos dias. A doença não costuma provocar as complicações hemorrágicas comuns na dengue.
Não há nenhum tratamento específico para essa virose. O recomendado é repouso e ingestão de líquidos. Para o tratamento da dor e da febre, o mais recomendado é o paracetamol. Como é difícil a distinção da febre Zika com formas mais brandas ou iniciais de dengue, o uso de ácido acetilsalicílico (aspirina) ou anti-inflamatórios é desencorajado.
Não há vacina para febre Zika, e o controle da doença na população passa pelo controle dos focos de Aedes aegypti.
Reinfecção pelo vírus Zika
Pessoas que já foram infectadas pelo vírus Zika desenvolvem imunidade contra a doença. Porém, ainda não sabemos se essa imunidade é para vida toda e se ela é suficiente para impedir que uma pessoa tenha mais de um episódio de febre Zika ao longo da vida.
Referências
- Zika virus infection: An overview – UpToDate.
- Guia de manejo da infecção pelo vírus zika – Sociedade Brasileira de Infectologia.
- Zika Virus – Centers for Disease Control and Prevention.
- Zika virus – World Health Organization.
- Zika virus infection – BJM Best Practice.
- Mucocutaneous Findings and Course in an Adult With Zika Virus Infection – JAMA.
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.
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