DPOC – Enfisema pulmonar e bronquite crônica

Dr. Pedro Pinheiro

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Tempo de leitura estimado do artigo: 4 minutos

O que é a doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC)?

A doença pulmonar obstrutiva crônica, ou simplesmente DPOC, é termo usado para um grupo de doenças pulmonares caracterizado por obstrução crônica das vias aéreas dentro dos pulmões.

Dentro deste grupo, duas doenças se destacam por serem responsáveis por quase todos os casos de DPOC na prática médica:

  • Bronquite crônica.
  • Enfisema pulmonar.

Para se entender o que é a doença pulmonar obstrutiva crônica é preciso primeiro ter noções básicas da anatomia e do funcionamento dos pulmões.

Como surge

Quando inspiramos, o ar entra pela nossas vias aéreas superiores e chega à traqueia. Esta bifurca-se, formando os brônquios principais, cada um indo em direção a um pulmão. Conforme avançam para o interior dos pulmões, os brônquios se ramificam em segmentos menores, chamados de bronquíolos, que, por sua vez, terminam nos alvéolos.

Os alvéolos são microestruturas em forma de sacos, altamente vascularizadas, responsáveis pelas trocas gasosas. O sangue que chega aos alvéolos recebe o oxigênio inspirado e entrega de volta gás carbônico para ser exalado na expiração.

pulmão

A doença pulmonar obstrutiva crônica caracteriza-se por uma limitação da passagem de ar pelas vias respiratórias dentro dos pulmões, principalmente durante a expiração. O ar consegue entrar, mas apresenta dificuldade para sair, ficando preso dentro dos pulmões. Este aprisionamento do ar ocorre pela destruição do tecido pulmonar e perda da elasticidade dos bronquíolos e alvéolos, que acabam por colapsar durante a fase expiratória do ciclo respiratório.

A destruição dos bronquíolos e alvéolos também é responsável pela perda de capacidade do pulmão em realizar as trocas gasosas, fazendo com que o paciente não consiga aproveitar o oxigênio respirado, nem expelir adequadamente o gás carbônico (CO2) produzido.

A DPOC costuma ser um doença progressiva causada por uma resposta inflamatória anormal dos tecidos pulmonares após exposição crônica a partículas ou gases nocivos, como o fumo, por exemplo. Cerca de 20% dos fumantes desenvolvem DPOC. Outras causas mais raras de DPOC incluem doenças genéticas como deficiência de alfa-1-antitripsina, exposição crônica a poeira tóxica como nos casos de mineração de carvão, fumaça de soldagem ou fumaça de fogo.

Ao contrário dos quadros de asma comum cuja obstrução só existe durante os períodos de crise, a obstrução do DPOC é constante e irreversível. Bronquite é um termo que significa inflamação dos brônquios. Na asma, a bronquite é aguda e reversível. No DPOC ela é crônica e permanente. Porém, é muito comum esses doentes apresentarem episódios de asma sobrepostos a sua doença, ou seja, uma bronquite aguda em cima de uma quadro de bronquite crônica.

Bronquite crônica

Na bronquite crônica a lesão pulmonar se localiza nos brônquios e bronquíolos, tornando-os cronicamente inflamados, espessos e com constante produção de muco. O paciente com bronquite crônica apresenta além dos sintomas de falta de ar e cansaço, um quadro de tosse crônica com expectoração.

Enfisema pulmonar

O enfisema se caracteriza pela destruição e alargamento dos bronquíolos terminais e alvéolos, que perdem sua elasticidade e favorecem o aprisionamento do ar dentro dos pulmões. No enfisema notamos uma hiperinsuflação mantida dos pulmões devido ao ar que nunca sai por completo.

Na prática clínica o que encontramos, na verdade, é um sobreposição entre as duas doenças. O doente com DPOC pode ter um quadro com mais características de bronquite crônica, mas apresenta sempre algum grau de destruição dos alvéolos e hiperinsuflação. O mesmo ocorre no enfisema, que costuma ter também algum grau de produção de muco e tosse crônica. Por isso, o termo DPOC é mais adequado para definir a doença destes pacientes.

Sintomas

A maioria dos pacientes que desenvolvem DPOC apresentam um histórico de fumo prolongado, pelo menos um maço de cigarros por dia durante 20 anos (leia: COMO E POR QUE PARAR DE FUMAR CIGARRO).

A doença começa normalmente a se manifestar após os 40 anos de idade. O primeiro sintoma perceptível costuma ser tosse matinal com expectoração. Porém, um sinal que costuma passar despercebido pelo paciente e seus familiares é o sedentarismo progressivo. Devido ao cansaço e a falta de ar que os esforços começam a produzir, o paciente vai progressivamente limitando suas atividades diárias, até o ponto em que, depois de alguns anos, a doença está tão avançada que mesmo em repouso sente-se cansado e com falta de ar.

Como o DPOC acomete pessoas mais velhas, o cansaço e a falta de ar aos esforços são normalmente atribuídos ao envelhecimento e ao cigarro, não despertando muita atenção inicialmente (leia: FALTA DE AR (DISPNEIA))

Conforme a doença progride, a tosse e a expectoração começam a ficar cada vez mais frequentes. A falta de ar tornar-se limitante. A produção de muco e a destruição dos tecidos pulmonares favorecem o aparecimento de infecções, como pneumonia (leia: SINTOMAS DA PNEUMONIA). O broncoespasmo (chiado no peito) começa a ocorrer com frequência.

Dependendo do tipo de DPOC predominante (bronquite crônica ou enfisema), o paciente costuma apresentar duas aparências distintas.

O enfisematoso é muito magro, desnutrido, com a caixa torácica aumentada, chamada de tórax em barril. É um doente com importante hiperinsuflação do pulmão e dificuldade para pôr o ar para fora, respirando como se estivesse sempre assoprando.

O bronquítico crônico costuma ser mais para o obeso, cianótico (tom arroxeado da pele por falta de oxigenação adequada), com tosse frequente e grande produção de catarro.

Mais uma vez é bom lembrar que estamos falando em extremos de um espectro de manifestações clínicas que podem ocorrer na DPOC. A maioria dos doentes apresenta um pouco de cada uma das figuras acima.

Conforme a DPOC progride, outras doenças podem surgir como complicações. As mais comuns são:

Diagnóstico

Conforme a DPOC destrói o tecido pulmonar e dificulta a eliminação do ar respirado, além da hiperinsuflação, bolhas de ar começam a se formar dentro dos pulmões, podendo ser facilmente identificados na radiografia de tórax ou tomografia computadorizada (TC) do pulmão.

Outro exame útil na avaliação da DPOC é a gasometria arterial, uma simples análise do sangue arterial que fornece os valores de oxigênio e gás carbônico (CO2) circulantes. Como já referido, pacientes com DPOC apresentam oxigenação baixa e elevada retenção de CO2.

Porém, o melhor exame para o diagnóstico da DPOC é a espirometria, também chamada de prova de função pulmonar. Neste exame o paciente respira através de um pequeno tubo enquanto um computador registra vários parâmetros respiratórios que servem para o diagnóstico das doenças pulmonares. A espirometria consegue detectar a DPOC em estágios iniciais, mesmo antes do paciente notar sintomas.

Tratamento

A DPOC não tem cura, costuma ser uma doença progressiva e é fatal em casos avançados. Portanto, ainda que haja tratamento visando retardar sua progressão, a única atitude realmente eficaz é a prevenção, ou seja, NÃO FUMAR.

Uma vez que o paciente já tenha DPOC, o fator individual que mais ajuda a desacelerar a doença é parar de fumar imediatamente.

A terapia medicamentosa visa principalmente aliviar os sintomas e melhorar a qualidade de vida. Broncodilatadores inalatórios como salbuterol, formoterol, ipratrópio e tiotrópio, entre outros, ajudam a diminuir a obstrução dos brônquios temporariamente, facilitando o fluxo de ar dentro das vias respiratórias.

Durante períodos de exacerbação da doença, como há grande inflamação das vias aéreas, o uso de corticóides por via oral ou venosa durante alguns dias é importante para ajudar na reversão da crise (leia: INDICAÇÕES E EFEITOS DA PREDNISONA E CORTICÓIDES). Fora das crises os corticóides só estão indicados naqueles casos com pouca resposta aos broncodilatadores, e mesmo assim, são administrados apenas por via inalatória.

Quando as exacerbações são causadas por infecções, o uso de antibióticos é imprescindível. A vacinação contra gripe e contra o pneumococo (bactéria que mais causa pneumonia) são importantes para diminuir a incidência de complicações respiratórias.

Exercícios de reabilitação pulmonar são importantes por melhorarem a qualidade de vida e reduzirem o número de internações hospitalares.

Nos casos mais avançados, quando o paciente já apresenta hipoxemia (baixa de oxigênio no sangue) persistente, o uso de oxigênio suplementar está indicado. A quantidade e o período em que o paciente deve ficar com oxigênio suplementar é decisão médica, podendo ser indicado apenas ao dormir, durante esforços ou ininterruptamente nos casos mais graves.

Pacientes com DPOC devem evitar viagens de avião sem consentimento médico devido a baixa concentração de oxigênio dentro das cabines (leia: PROBLEMAS DE SAÚDE EM VIAGENS DE AVIÃO). Nestes casos o uso de oxigênio pode ser necessário mesmo para aqueles que não apresentam hipoxemia relevante ao nível do mar.

Quando as bolhas de ar tornam-se muito grande e passam a comprimir os pulmões, pode-se indicar cirurgia para removê-las.

Casos terminais podem ser tratados com transplante pulmonar, se o paciente apresentar condições clínicas para tal.


Referências


Autor(es)

Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.

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36 respostas para “DPOC – Enfisema pulmonar e bronquite crônica”

  1. Alexandra Marto
    Os médicos pensam que meu pai tem DPOC agravado por COVID. Tem o oxigénio a 91 de saturação. Eu tenho um papagaio, será que este pode agravar a doença de meu pai? Se sim dar banho á ave ajuda? O meu pai não está usando oxigénio e a ave está na sala.
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro
      Dr. Pedro Pinheiro
      A presença de um papagaio ou qualquer outro pássaro em casa pode potencialmente agravar a DPOC em algumas pessoas. Isso ocorre porque as aves podem ser fontes de alérgenos e irritantes respiratórios. As penas e as partículas de poeira provenientes das aves podem ser inaladas e causar reações alérgicas ou agravar doenças respiratórias pré-existentes, como a DPOC. Agora, se isso está acontecendo com o seu, não tenho como dizer à distância. O ideal seria manter a ave em um ambiente diferente do que seu pai frequenta, especialmente se ele passa muito tempo na sala.
  2. João Alves Barboza

    Ótimo explanação.

  3. Andreza De Oliveira

    Minha mãe e portadora DPOC está quase em fase terminal não sai da cama se recusa a se alimentar.Devo manter ela em casa ou no hospital

    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro
      Dr. Pedro Pinheiro
      Onde vocês acharem que ela vai ter mais conforto e vai sofrer menos.
  4. Lu Monte
    O que significa broncopatia inflamatória?
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro - MD. Saúde
      Dr. Pedro Pinheiro - MD. Saúde
      Inflamação dos brônquios.
  5. Maria Eugênia
    Qual quantidade (L/min.) máxima de oxigênio que se pode ofertar a um paciente com DPOC?
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro - MD. Saúde
      Dr. Pedro Pinheiro - MD. Saúde
      O ideal é 1 ou 2. Mas se o paciente tem hipoxemia, a quantidade pode ser mais alta.
  6. joao
    quem tem derrame pleural pode usar berotec para aliviar .
  7. Cibele Oliveira
    Muito bom!
    Estava com dúvida sobre quais eram as diferenças de bronquite crônica e enfisema pulmonar. Agora ficou tudo esclarecido.
    Me ajudou bastante!!!! Obrigada, está de parabéns!
  8. Jessika Alves
    Olá Dr. Pedro. O que significa estrias esparsas pelo parênquima pulmonar bilateral de aspecto fibroatectasio. Espessamento da pele e densificação do subcutâneo na região axilar.
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro - MD.Saúde
      Dr. Pedro Pinheiro - MD.Saúde
      São fibroses, ou seja, cicatrizes de algum processo inflamatório atual ou antigo.
  9. Kawanne
    Semplesmente perfeito, muito obrigado me ajudou, linguagem clara e fácil de entender, Parabéns !
  10. Rafael Gomes
    Olá, Dr. Pedro. É possível um jovem sem deficiência da enzima alfa 1 antitripsina desenvolver DPOC abaixo dos 20 anos?
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro - MD.Saúde
      Dr. Pedro Pinheiro - MD.Saúde
      Sim.
      1. Rafael Gomes
        Quais situações poderiam levar à isso? Obrigado pela resposta!
        1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro - MD.Saúde
          Dr. Pedro Pinheiro - MD.Saúde
          Os pacientes com a forma genética mais grave, se forem tabagistas desde muito cedo, podem ter um risco mais elevado de DPOC precoce. Em geral, porém, nos pacientes com menos de 30 anos o fígado costuma ser uma preocupação maior que o pulmão.
        2. Rafael Gomes
          Muito obrigado, Dr. Pedro! Parabéns pelo site! Um abraço.
  11. patricia
    minha mae tem alguns sintomas de dpoc que especialista devo procurar ?e quais exames devo pedir ?
  12. Celiane
    Dr. Pedro e a enfisema envolve lesoes bacterianas no pulmao cercadas por tecido cicatrizado?
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro - MD.Saúde
      Dr. Pedro Pinheiro - MD.Saúde
      Essa não é a lesão do enfisema. Isso indica apenas que há uma infecção nesta região.
  13. rosi
    Dr. Pedro boa tarde, apresentou no meu exame de TC de tórax, pequenas estrias fibroatelectásicas de aspecto residual nos ápices pulmonares, isso tem cura? obrigada.
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro - MD.Saúde
      Dr. Pedro Pinheiro - MD.Saúde
      Isso é cicatriz.
  14. Diego Vitor
    Bom dia, Dr.
    Procurei no site rapidamente e não encontrei sobre atelectasias. Já existe uma postagem com o tema? Se não, não achas que é uma boa pedida?
    Att.
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro - MD.Saúde
      Dr. Pedro Pinheiro - MD.Saúde
      Realmente eu ainda não escrevi especificamente sobre esse assunto. Sugestão anotada.
  15. Vanderlei Silverio
    qual exame pode ser feito para o diagnostico da bronquite
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro - MD.Saúde
      Dr. Pedro Pinheiro - MD.Saúde
      O mais habitual é a espirometria.
  16. Dario Nicolau Sobrinho
    Muito bom a matéria,aproveito para pedir a todos que vierem a ler o artigo que se fumam,parem. Eu fumei por 42 anos,hoje sofro com  o efisema que esta se desenvolvendo dentro de mim,sou um homen de boa apar^necia ,inteligente privilegiado geneticamente e poderia ver até os cem anos,mas por causa do cigarro consegui  reverter tudo isso.
  17. Luis
    estou com essa doença e agora vou tratar e parar de fumar
  18. Falsousa
    Muito bom, estou estudando isso, acrescentou bastante no meu conhecimento. Obrigada
  19. Anjosrodrigues
    o meu marido foi diagnosticado com Efisema  pulmonar pois o exame de expirometria dele naõ passa do numero 2.diagnostico disturbio ventilatorio obstrutivo grave com CVF reduzida. sem resposta ao broncodilatador.A médica passou um remédio por nome de ALENIA e só. E disse que tem que tomar remédio por resto da vida dele ,mas quanto ele tem de vida se ela disse que tem apenas um quarto do pulmão apenas com um Rx eo exame do sopro da pra dar um diagnostico  tão gave assim(ele não é fumante) trabalha muitos anos de moto boy será que foi a poluiçao  que acabou com seu pulmão devido já ser asmatico?
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro - MD.Saúde
      Dr. Pedro Pinheiro - MD.Saúde
      Difícil afirmar.
  20. Wellyta_lima
    Olá… otimo o artigo, mas poderia me explicar se as dores abdominais estão relacionada com o enfisema? Meu avô faz uso de oxigenio terapia 3L/min em media 16 hrs diarias, mas esta tendo fortes dores abdmonias e se queixa de gases, esta sendo internado com frequencia pelas dores, poderia me esclarecer melhor!?
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro - MD.Saúde
      Dr. Pedro Pinheiro - MD.Saúde
      Não há uma relação direta.
  21. Bandafervocarioca
    obrigado dr. bem explicado.