O que é criptorquidia?
Criptorquidia ou criptorquia é um termo de origem grega que significa “testículo escondido” (cripto = escondido + orquis = testículo). A criptorquidia ocorre, portanto, quando um ou ambos os testículos não se encontram na bolsa escrotal no momento do nascimento do bebê.
Na maioria dos casos, o problema surge porque um dos testículos não migrou do abdômen para a bolsa escrotal na fase de formação do feto. Há casos também em que o testículo simplesmente não existe, um fenômeno chamado de agenesia testicular.
Apesar da criptorquidia não provocar sintomas, ela deve ser corrigida cirurgicamente assim que possível, devido aos riscos de complicações a longo prazo, tais como câncer de testículo ou infertilidade na vida adulta.
Como surge
Os testículos começam a ser formados a partir da 6ª semana de gestação na região abdominal, próximo aos rins. Ao redor da 9ª ou 10ª semana, os testículos migram para a região inguinal (virilha), onde permanecem até a 28ª semana de gravidez.
Entre a 28ª e 40ª semana de gestação, os testículos migram lentamente pelo canal inguinal em direção à bolsa escrotal, seu destino final. Em algumas crianças, principalmente nos prematuros, o processo de migração dos testículos só se completa semanas ou meses após o nascimento.
Cerca de 3 a 5% dos bebês nascidos a termo (isto é, após 37 semanas de gestação) apresentam pelo menos um testículo que não completou o seu trajeto de descida. Nos casos dos bebês prematuros, a incidência é bem maior, próxima dos 30%.
Porém, na maioria dos bebês, o testículo acaba migrando naturalmente para a bolsa escrotal nos primeiros meses vida, de forma que ao final do primeiro ano, apenas 1% dos meninos ainda apresentam criptorquidia.
Em 90% dos casos, a criptorquia é unilateral, ou seja, apenas um dos testículos não desce. É mais comum que o testículo criptorquídico seja o esquerdo.
Os locais mais comuns de retenção do testículo são a região abdominal, inguinal e supraescrotal, conforme ilustrado mais abaixo.
Em 80% dos pacientes, o testículo criptorquídico é palpável em algum ponto ao longo do canal inguinal.
Em uma minoria dos casos é possível que a criptorquia surja somente após alguns anos de vida. O menino apresenta os dois testículos na bolsa escrotal ao final do primeiro ano, mas entre os 4 e 8 anos de idade, um dos testículos ascende e fica preso na região inguinal.
Também existem os casos de testículo retrátil, que são os testículos que sobem e descem facilmente, saindo e entrando na bolsa escrotal de tempos em tempos. Esse caso é diferente do testículo ascendente descrito acima porque além do testículo poder voltar espontaneamente para a bolsa escrotal, ele também pode ser facilmente empurrado com os dedos de volta para posição correta.
Por fim, há os casos de criptorquidia provocados por testículos ectópicos, que surgem quando um dos testículos passa pelo canal inguinal, mas em vez de ir para a bolsa escrotal acaba migrando para regiões anômalas, como o períneo, a coxa ou a região suprapúbica.
Fatores de risco
As causas da criptorquidia ainda são desconhecidas. A doença é provavelmente uma combinação de fatores genéticos, ambientais, anatômicos, hormonais e de saúde materna.
Apesar das causas ainda não estarem totalmente elucidadas, os principais fatores de risco já são bem conhecidos. Os mais importantes são:
- Baixo peso ao nascimento.
- Nascimento prematuro.
- História familiar de criptorquidia.
- História familiar de problemas de desenvolvimento genital.
- Ingestão de álcool pela mãe durante a gravidez (leia: Álcool na gravidez: qual é o Limite Permitido?).
- Tabagismo durante a gravidez.
- Exposição dos pais a alguns tipos de pesticidas.
- Malformações do feto, como defeitos do tubo neural, defeitos da parede abdominal, paralisia cerebral ou alterações genéticas que provocam redução da produção de testosterona.
Sintomas
O sinal mais comum da criptorquia é a ausência de um ou ambos os testículos na bolsa escrotal.
A palpação da bolsa escrotal deve fazer parte do exame pediátrico de todos os bebês recém-nascidos do sexo masculino. Se no momento do primeiro exame ao menos um dos testículos não estiver localizado na bolsa escrotal, o médico ira agendar reavaliações até o 6º mês de vida do bebê para acompanhar e ver se o testículo já migrou espontaneamente.
Se após o sexto mês, o testículo ainda não tiver descido, é pouco provável que ele o faça naturalmente. Nesses casos, a correção cirúrgica deve ser avaliada, conforme veremos mais adiante.
Outro sinal bastante comum da criptorquidia é a presença do testículo ao longo do trajeto do canal inguinal, na virilha. O testículo costuma ser uma pequena massa visível e palpável. Em 20% dos pacientes, porém, não conseguimos identificar o testículo criptorquídico através do exame físico.
Fora esses dois sinais, não é comum que o paciente com criptorquidia apresente qualquer outro tipo de sintoma ou queixa.
Complicações
Apesar da criptorquidia em si não provocar nenhum sintoma relevante, a sua correção cirúrgica precoce é importante devido aos riscos de complicações.
As possíveis complicações e sequelas de testículos criptorquídicos incluem:
- Hérnia inguinal.
- Torção testicular.
- Compressão do testículo por traumas na região onde ele está preso.
- Problemas de fertilidade na vida adulta.
- Aumento do risco de câncer do testículo.
Diagnóstico
O diagnóstico da criptorquidia é muito fácil e baseia-se apenas na confirmação, através do exame físico, da ausência de um testículo na bolsa escrotal.
Uma vez confirmada a criptorquidia, o próximo passo é localizar o testículo criptorquídico. Em 80% dos casos, o testículo é encontrado após a palpação da região inguinal ou abdominal. Nos 20% restantes, o testículo está localizado muito profundamente, não existe (agenesia) ou encontra-se muito pequeno e atrofiado.
Nestes casos, a única forma de diagnóstico é através da cirurgia exploradora, pois exames de imagem, tais como a ultrassonografia, só conseguem detectar a localização dos testículos criptorquídicos em metade dos casos. Em contrapartida, a cirurgia é capaz de localizar praticamente 100% dos testículos escondidos.
Tratamento
O tratamento para testículos criptorquídicos é quase sempre cirúrgico. Historicamente, a terapia hormonal foi testada antes da cirurgia, mas esta não se provou ser uma forma eficaz de estimular a descida dos testículos retidos.
O objetivo do tratamento cirúrgico é corrigir a localização do testículo, posicionando-o dentro da bolsa escrotal. Se durante o procedimento for identificado um testículo que apresente sinais de atrofia e inviabilidade, o mesmo deve ser removido.
Tanto o reposicionamento de um testículo saudável quanto a remoção completado de um testículo inviável reduzem o risco de surgirem as complicações da criptorquia já descritas anteriormente.
Quando a criptorquidia deve ser operada?
A cirurgia para reposicionamento do testículo chama-se orquidopexia. Ela deve ser considerada em todas as crianças que ainda apresentem criptorquidia após os 6 meses de idade.
Atualmente, recomenda-se que a orquidopexia seja realizada antes dos dois anos, pois os resultados são melhores quando a cirurgia é feita precocemente, principalmente em relação à fertilidade futura da criança. Por este motivo, a maioria das cirurgias hoje em dia é feita antes da criança completar o seu primeiro ano de vida.
Quando a criptorquidia só é identificada mais tarde, o recomendado é a realização da orquidopexia dentro de um prazo de 6 meses.
A orquidopexia é um procedimento simples, que consiste na retirada do testículo da região inguinal e implantação do mesmo dentro da bolsa escrotal. O procedimento requer um pequeno corte, que pode ser feito na região da virilha ou na bolsa escrotal, e apresenta taxa de sucesso próxima de 100%.
Referências
- Evaluation and Treatment of Cryptorchidism: AUA Guideline – The Journal of Urology.
- Cryptorchidism: A practical review for all community healthcare providers – Canadian Urological Association journal.
- Cryptorchidism – Medscape.
- Cryptorchidism – StatPearls.
- Undescended testes (cryptorchidism) in children: Clinical features and evaluation – UpToDate.
- Undescended testes (cryptorchidism) in children: Management – UpToDate.
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.