Introdução
Tripofobia, que significa literalmente medo de buracos, é o nome que damos para uma condição que faz com que determinadas pessoas sintam aversão ou incômodo ao serem expostas a imagens que criem padrões de buracos ou saliências.
Apesar de muito popular na Internet, a tripofobia não é uma doença, muito menos uma fobia real. Essa condição não é reconhecida pelas comunidades científicas nem é descrita pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V) da Associação Americana de Psiquiatria, que é o manual de categorização dos transtornos mentais mais utilizado em todo o mundo.
É importante destacar que apesar da tripofobia não ser considerada um transtorno mental, isso não significa que não existam milhões de pessoas que se sintam verdadeiramente desconfortáveis ao verem imagens de pequenos buracos em conjunto, principalmente se estes estiverem em ambiente biológico, seja sobre pele humana ou em outro ser vivo (o autor desse texto é uma delas).
Neste artigo explicaremos o que realmente é a tripofobia, quais são as suas causas, os seus sintomas e por que ela é tão pouco estudada cientificamente, mesmo sendo tão comum.
O que é a tripofobia?
Se você mal consegue olhar para as imagens abaixo, se sente uma terrível aflição, sensação de incômodo e até coceira pela pele, você provavelmente tem a chamada tripofobia.
O nome tripofobia, apesar de parecer científico, foi criado na Internet, provavelmente em 2009 em uma página de Facebook. O autor da página notou que sentia aflição ao ver determinadas imagens de buracos e resolveu criar uma comunidade para saber o quanto aquilo que ele sentia era comum. Em pouco tempo, a página tornou-se imensamente popular e o termo acabou pegando.
A palavra tripofobia, portanto, não é um termo científico nem foi criada com o intuído de descrever uma condição amplamente estuda e claramente caracterizada. Dependendo da fonte na qual você pesquisa, as definições podem variar. De modo geral, a tripofobia é uma sensação de aversão a imagens agrupadas de pequenos buracos ou relevos.
Como já referido, a tripofobia é mais comum quando essas imagens de pequenos buracos estão associadas à pele ou a seres vivos, como nas fotos acima. Conforme veremos mais adiante, a tripofobia é mais intensa se ela despertar no indivíduo uma sensação de estar ligada a uma doença ou à presença de um parasito.
Quando utilizamos o mesmo padrão geométrico em imagens que não despertam claramente a ideia de doença da pele, como nas imagens abaixo, o número de pessoas que refere sentir incômodo cai bastante.
O que parece causar o desconforto não são as imagens geométricas em si, mas sim o tipo de lembrança ou sensação que elas despertam. Se os padrões de buracos ou relevos fizerem o indivíduo pensar em doenças, lesões de pele, tocas de animais peçonhentos ou substâncias tóxicas ou contagiosas, a tripofobia é mais provável de surgir.
Tripofobia é uma fobia real?
A tripofobia não é uma fobia real. Consideramos fobia um tipo de transtorno de ansiedade que se caracteriza por medo significativo a um objeto ou situação particular. Classicamente, a fobia leva o indivíduo a ter um comportamento de descontrole e evasão, ou seja, a fugir de medo.
A sensação de medo que uma pessoa com fobia de barata, aranha, altura, avião, agulhas ou lugares fechados sente é infinitamente mais intensa que a sensação incômoda que um conjunto de pequenos buracos provoca na maioria das pessoas. Ver uma imagem desconfortável ou repugnante pode até causar algum desconforto, mas isso nunca irá exercer a mesma influência negativa na sua vida que as reais fobias causam.
As pessoas que se dizem portadoras de tripofobia não se descontrolam ao verem pequenos buracos. Você pode até não conseguir olhar por muito tempo e algumas pessoas referem coceira na pele, mas a sensação de pânico de uma fobia real não existe na imensa maioria dos casos.
Entretanto, é importante salientar que existe fobia para tudo. Não é impossível que existam pessoas com medo real a esses pequenos buracos. Nesses raros casos, porém, o paciente se encaixa no que chamamos de fobia específica, esta sim um transtorno psiquiátrico amplamente reconhecido.
Estudos científicos sobre a tripofobia
Por não ser uma doença real e por não causar nenhum impacto significativo na vida das pessoas, a tripofobia é uma condição muito pouco estudada e praticamente ignorada pelos psiquiatras.
Os poucos trabalhos científicos já publicados focaram nas causas dessa sensação ruim, que aparentemente tem origem evolutiva.
O primeiro estudo publicado sobre o assunto é 2013, na revista Psychological Science. Nele, os pesquisadores especulam que a tripofobia pode ter uma base evolutiva, pois esses grupamentos de furos compartilham características visuais com animais peçonhentos (ou suas tocas) que os humanos e seus ancestrais aprenderam a evitar como uma questão de sobrevivência.
Já um estudo de 2017 do Jornal Cognition and Emotion sugere outra teoria sobre a origem da repugnância a esses buracos e saliências. Os pesquisadores acreditam que esses padrões geométricos lembram doenças contagiosas ou parasitárias que acometem principalmente a pele. A aversão a imagens semelhantes seria, portanto, um mecanismo de defesa para que o indivíduo evite e afasta-se de lesões de pele potencialmente contagiosas.
Sintomas
Os poucos estudos existentes mostraram que há uma grande variedade de sinais e sintomas entre os tripófobos. Nos casos mais leves — e mais comuns —, o indivíduo refere apenas uma sensação de aversão, sem nenhum outro sinal associado. Nos casos mais intensos, os indivíduos estudados aprestaram taquicardia (batimentos cardíacos acelerados), mãos úmidas, coceira pelo corpo, necessidade de esfregar as mãos na pele, enjoos e até episódios de pânico e desmaio.
Nos casos mais intensos, a associação com outros distúrbios psiquiátricos é muito comum, principalmente com outras fobias e transtornos de ansiedade.
Tratamento
Na imensa maioria dos casos, os pacientes com tripofobia não precisam de nenhum tratamento, pois o problema não tem interferência nenhuma na sua qualidade de vida. Se você quiser que as imagens parem de incomodar, o caminho mais simples é ver seguidamente várias imagens de furos e saliências, de forma a habituar o seu cérebro com elas. Com o tempo, você acaba criando tolerância.
Porém, se as imagens provocarem mais do que apenas sensação de repulsa, com sintomas físicos e real ansiedade, você deve procurar a ajuda de um psiquiatra. Nesses casos, o tratamento é basicamente o mesmo dos outros tipos de fobia, através da terapia cognitiva comportamental.
Referências
- Is Trypophobia a Phobia? – Psychological reports.
- Disgusting clusters: trypophobia as an overgeneralised disease avoidance response – Cognition and Emotion.
- Fear of holes – Psychological science.
- Fear of Holes May Stem From Evolutionary Survival Response – Association for Psychological Science.
- Assessment of trypophobia and an analysis of its visual precipitation – The quarterly journal of experimental psychology.
- Trypophobia is predicted by disgust sensitivity, empathic traits, and visual discomfort – SpringerPlu.
- Trypophobia: an investigation of clinical features – Brazilian Journal of Psychiatry.
- Gabbard GO, ed. Specific phobia. In: Gabbard’s Treatments of Psychiatric Disorders. 5th ed. Arlington, Va.: American Psychiatric Association; 2014.
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.