Coma induzido: o que é, para que serve, é perigoso?

Dr. Pedro Pinheiro
Dr. Pedro Pinheiro

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Coma induzido

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O que é o coma?

Dá-se o nome de coma ao estado de redução da consciência com perda parcial ou completa da responsividade aos estímulos externos. Falando de modo mais simples: o coma é uma redução do nível de consciência, de tal forma que o paciente torna-se incapaz de interagir adequadamente com o meio que o cerca.

Há vários graus de coma. Uma pessoa em coma pode estar inconsciente, mas ainda ser capaz de apresentar alguma resposta a estímulos dolorosos ou a chamados vigorosos.

Para avaliar a profundidade do coma, usamos uma escala chamada “escala de coma de Glasgow”, na qual são levados em conta a resposta verbal, motora e abertura dos olhos aos chamados e à dor.

A escala de Glasgow avalia o grau de consciência do indivíduo através de testes físicos simples que servem para observar como o paciente reage a certos estímulos, como dor ou sons.

A classificação varia de 3 a 15 pontos. A pontuação mínima (3 pontos) é dada quando o paciente não responde a nenhum estímulo (coma profundo), e a máxima (15 pontos), em pessoas normais que não estão com seu estado de consciência afetado.

O coma normalmente acontece em casos de agressão ao sistema nervoso central, nomeadamente do tronco cerebral, área que controla o estado de consciência. Alguns comas são reversíveis, outros não.

Exemplos de situações que podem levar ao coma:

  • Traumatismo craniano.
  • Infecção do sistema nervoso central, como no caso de meningite.
  • Tumor do cérebro.
  • AVC.
  • Distúrbios metabólicos, tais como hipoglicemia, hiperglicemia, hipotireoidismo grave, insuficiência renal avançada, etc.
  • Coma alcoólico.

É perigoso estar em coma?

O estado de coma é perigoso porque o indivíduo inconsciente perde a capacidade de proteger suas vias aéreas, podendo facilmente aspirar secreções ou se asfixiar com a própria língua. O paciente comatoso normalmente perde o reflexo da tosse e a capacidade de engolir saliva produzida na cavidade oral.

O processo de aspiração de qualquer material que está na boca, como saliva, água, vômitos ou restos alimentares, é chamado de broncoaspiração. A broncoaspiração costuma causar pneumonias graves, além do risco de provocar parada respiratória por obstrução da via aérea.

Para proteger as vias aéreas, todo paciente com pontuação de Glasgow menor que 8 costuma ser intubado pela equipe médica, de forma a permitir que o mesmo continue respirando sem risco de broncoaspiração.

O que é o coma induzido?

O chamado coma induzido é nada mais do que uma sedação farmacológica controlada, isto é, um estado de inconsciência provocado pela equipe médica através de drogas sedativas.

As pessoas tendem a imaginar que o coma induzido é uma forma de desligar o cérebro para que este descanse e possa se recuperar de uma agressão. Na verdade, o cérebro nunca para. Ele é quem controla funções vitais, como a frequência cardíaca, respiratória, temperatura corporal, etc. A consciência é apenas uma das funções do sistema nervoso central. Se realmente desligássemos o cérebro, o paciente morreria. O que fazemos é dar medicamentos que causam sedação.

Para que serve?

A sedação do paciente pode estar indicada em várias situações. Em geral, a sedação tem como objetivos:

  • Manter a segurança e o bem-estar do paciente.
  • Minimizar a dor física e desconforto.
  • Controlar a ansiedade, minimizar o trauma psicológico e induzir amnésia.
  • Acalmar o paciente e tornar a realização de procedimentos segura.

A causa mais comum para o uso da sedação é a necessidade de ventilação mecânica. O uso dos chamados respiradores artificiais está indicado nos casos em que o paciente não é capaz de manter boas oxigenações sem auxílio médico.

Isso é muito comum nos casos de infecção pulmonar, como em pneumonias graves. Se o pulmão está gravemente doente, ele tem dificuldade em oxigenar o sangue e o paciente pode entrar em insuficiência respiratória.

Pacientes com traumatismos cranianos podem deixar de ser capazes de respirar espontaneamente, sendo esta outra indicação para o uso da ventilação mecânica.

Por que é preciso sedar o paciente na ventilação mecânica?

Imagine um tubo na sua garganta estimulando movimentos respiratórios através de fluxos cíclicos de ar vindos de uma máquina. Imagine você querer expirar e a maquina inspirar; você querendo respirar devagar e maquina respirar rápido; você querer tossir e a máquina não deixar. Para ocorrer uma ventilação mecânica eficaz, o paciente não pode “brigar” com o ventilador. Por isso, a sedação é essencial.

Outras indicações para o coma induzido

Além da ventilação mecânica, existem dezenas de outras indicações para sedar um paciente. Por exemplo, pacientes que apresentam intensa dor também podem ser sedados, isto é comum em politraumatizados e grandes queimados. Nesses casos, a sedação é feita junto com analgesia.

Indivíduos internados com quadro de agitação, que possam cair da cama ou que coloquem em risco seu tratamento, como aqueles que arrancam soros, sondas e cateteres, ou que não colaboram com procedimentos médicos de risco, como biópsias, endoscopias e pequenas cirurgias, também costumam receber sedativos. Nesses casos, porém, a sedação é mais leve, o suficiente apenas para acalmá-los.

Durante as cirurgias com anestesia geral, os pacientes são sedados e ficam em ventiladores mecânicos. Na anestesia, a sedação vem acompanhada de analgesia e relaxamento muscular. O paciente, além de estar inconsciente, não pode sentir dor nem se mover durante o ato cirúrgico.

A sedação da anestesia é feita com drogas de ação muito curta, pois o objetivo é que o paciente consiga acordar quando a cirurgia acaba (leia: Anestesia geral – Quais os riscos?).

Por vezes, ao final do ato cirúrgico, o paciente pode não conseguir manter uma boa oxigenação por conta própria, precisando permanecer sedado e no ventilador por mais algum tempo. Esta situação é mais comum em paciente graves, idosos ou com doença pulmonar ou cardíaca prévia. Pessoas jovens e saudáveis saem facilmente da ventilação mecânica.

Portanto, o coma induzido é uma manobra que nós médicos utilizamos para podermos implementar o tratamento necessário para manter um paciente em estado grave vivo.

Como já foi explicado, não chamamos de coma induzido, mas sim de sedação. Chamamos de coma apenas os casos de redução do nível de consciência não provocados intencionalmente pela equipe médica.

Intensidade da sedação

Existem várias indicações para se sedar o paciente, e para cada uma delas o nível de sedação indicado é diferente.

Assim como a escala Glasgow de coma é usada para aferir o nível de consciência dos paciente em coma, na sedação também há critérios clínicos para controlarmos o grau de sedação do paciente.

Uma das escalas mais usadas é a “escala de Ramsey de sedação”, que é feita da seguinte forma:

  • Ramsey 1: paciente consciente; agitado e/ou inquieto.
  • Ramsey 2: paciente consciente; cooperativo, orientado e tranquilo.
  • Ramsey 3: paciente consciente, mas responde apenas a comandos.
  • Ramsey 4: paciente superficialmente inconsciente, porém com resposta rápida a estímulo auditivo alto ou a toques na glabela (região da testa entre as sobrancelhas).
  • Ramsey 5: paciente inconsciente; resposta lenta a estímulo auditivo alto ou a toques na glabela.
  • Ramsey 6: paciente inconsciente, sem resposta ao toque da glabela ou estímulo auditivo alto.

Por que o paciente em coma também precisa ser sedado?

Mesmo pessoas em coma podem precisar de sedação. Um paciente que sofreu um acidente de carro, por exemplo, pode ter um traumatismo craniano e ter um grau de coma que não seja suficiente para estar consciente, mas também não é tão profundo a ponto de permitir uma ventilação mecânica confortável.

Nesses casos, é necessário sedar o paciente e aprofundar seu coma para que ele possa ser tratado. Depois de alguns dias, dependendo da melhora clínica, retira-se a sedação para se poder avaliar o verdadeiro grau da lesão neurológica.

Pacientes em coma induzido demoram quanto tempo para acordar?

Depende. Alguns pacientes acordam após algumas horas, outros demoram vários dias. Alguns fatores contribuem o paciente demorar a acordar, entre eles podemos citar:

  • Uso prolongado de drogas sedativas.
  • Uso de doses elevadas de drogas sedativas.
  • Uso de drogas sedativas de vida longa.
  • Pacientes com doença grave ou múltiplas doenças.
  • Pacientes idosos.
  • Pacientes com lesão do sistema nervoso central.
  • Pacientes com insuficiência renal ou hepática

É também importante salientar que alguns pacientes podem nunca acordar se houver grave lesão cerebral, como, por exemplo, pessoas com grave traumatismo craniano, AVC hemorrágico ou parada cardíaca prolongada.

Nos casos em que há suspeita de lesão cerebral, as sequelas neurológicas só podem ser definidas após vários dias de suspensão dos sedativos. Enquanto houver fármacos sedativos na circulação, é difícil definir se o paciente apresenta ou não sequelas neurológicas.

Pacientes em coma ou sedados conseguem ouvir os familiares?

Esta é uma das dúvidas mais comuns dos familiares. Como já foi explicado, existem graus distintos de coma e sedação. Um dos modos de se avaliar a profundidade do estado de inconsciência é através da resposta aos sons.

Portanto, há casos em que o paciente pode escutar, sim, as vozes dos familiares. A grande questão é saber se o paciente entende o que lhe dizem. Em casos de sedação ou coma superficial é bem provável que o paciente seja capaz de compreender algumas coisas e reconhecer a voz da família.

O problema é que muitas das drogas usadas na sedação têm efeito amnésico. Essa amnésia para fatos recentes é importante, pois permanecer vários dias no hospital é um evento muito estressante. O paciente sofre muito, seja pela imobilidade, pelas múltiplas picadas de agulha, pelos tubos inseridos em seu corpo, pela falta de noção do tempo, etc. A amnésia torna a situação muito mais suportável e faz com que o paciente não tenha traumas psicológicos após a alta hospitalar.

Portanto, não adianta perguntar ao paciente se ele ouvia algo enquanto estava sedado; mesmo que tenha ouvido, é bem provável que ele não vá se lembrar.

Nos casos de coma ou sedação profunda, é pouco provável que o paciente mantenha algum contato com o meio externo. O cérebro naquele momento não é capaz de processar estímulos externos. Movimentos involuntários podem ocorrer devido a sons, mas isso não significa que o paciente tenha noção do que está ocorrendo.


Referências


Autor(es)

Dr. Pedro Pinheiro

Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.

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