Introdução
Um dos sintomas mais comuns da gravidez é um intenso e aparentemente inexplicável cansaço, que frequentemente vem acompanhado de sono excessivo. A gestante em seus primeiros meses de gravidez cansa-se por tudo e por nada e a cama parece sempre ser o local em que ela melhor se sente.
Mesmo as mulheres que historicamente sempre dormiram pouco, ou que eram cheias de energia, capazes de acumular múltiplas tarefas profissionais e esportivas, acabam sendo derrubadas pelo cansaço e pelo sono na gravidez. Às vezes, nem um capítulo inteiro da novela elas conseguem assistir sem cair no sono.
Para algumas mulheres, a palavra cansaço pode soar até como um eufemismo, pois o que elas realmente sentem é mais do que cansaço, é uma sensação de exaustão.
As primeiras semanas de gestação podem ser terríveis para a futura mãe, pois além do cansaço e do sono, também são muito comuns as náuseas e os vômitos (leia: Náuseas e vômitos na gravidez).
Com o fim do primeiro trimestre, os sintomas tendem a desaparecer e a gestante volta a sentir-se bem. Porém, a fadiga volta no terceiro trimestre, momento em que o bebê já está bem grande e a grávida encontra-se, além do barrigão, com, pelo menos, 10 a 12 quilos acima do seu peso habitual.
Neste artigo faremos uma revisão sobre o cansaço e o sono que acometem as grávidas no primeiro e terceiro trimestres de gestação. Para saber mais sobre outros comuns sintomas de gravidez, acesse o link: 25 Sintomas de gravidez.
Quais são as causas do cansaço na gravidez?
O cansaço e o sono excessivo surgem no primeiro trimestre, não tendo, em um primeiro momento, nada a ver com o peso do feto ou com o tamanho da barriga.
O cansaço e o sono têm origem nas alterações hormonais e fisiológicas que o corpo da mulher começa a sofrer já nas primeiras semanas de gestação. Entre os vários hormônios que se alteram na gravidez, a progesterona é o que se destaca mais. Ao longo da gestação, os níveis deste hormônio chegam a aumentar em mais de 500%. A progesterona é essencial para a manutenção da gravidez e para o desenvolvimento do feto, porém, ela provoca diversos efeitos colaterais, sendo a sensação de cansaço extremo e o sono excessivo um dos seus principais.
Além da ação direta da progesterona no sistema nervoso central, o que provoca intenso sono na gravidez, várias alterações fisiológicas do organismo e do corpo da mulher, muitas delas também estimuladas pela própria progesterona, colaboram para o cansaço.
A grávida nas primeiras semanas, além de desenvolver o feto, precisa gerar a placenta que irá nutrir o bebê ao longo da gravidez. Esse processo demanda muito gasto de energia, fazendo com que o organismo da mulher priorize o desenvolvimento da gravidez em detrimento às suas atividades do dia-a-dia.
A demanda de oxigênio do corpo para manter uma gravidez chega a aumentar em 20%. Um dos efeitos da progesterona é estimular a área cerebral responsável pelo controle da respiração de forma a aumentar a frequência respiratória basal da gestante, compensando, assim, a maior necessidade de oxigênio do corpo.
A grávida, portanto, já respira de forma mais rápida que o habitual e usa parte do oxigênio inspirado para o desenvolvimento do feto e da placenta. Por isso, qualquer atividade física que demande um aumento ainda maior do consumo de oxigênio costuma ser tão mal tolerada, principalmente pelas mulheres que eram sedentárias antes da gravidez e têm uma capacidade cardiopulmonar abaixo da desejada.
O feto e a placenta também demandam sangue, e parte da circulação sanguínea é desviada para o novo ser em desenvolvimento. Além do desvio de sangue, os hormônios da gravidez também estimulam uma redução da pressão arterial, provocada por vasodilatação das artérias. Logo, na gestante, há uma pressão arterial mais baixa para irrigar uma área tecidual maior que a habitual.
Além de tudo isso, a retenção de líquidos dilui o sangue, fazendo com que a grávida tenha uma anemia relativa, o que colabora ainda mais para o cansaço a para a intolerância aos esforços.
Melhoria no 2ª trimestre – retorno do cansaço no 3º trimestre
Ao final do primeiro trimestre, os níveis hormonais se estabilizam e a placenta já se encontra formada. O cansaço e o sono melhoram bastante. Muitas mulheres voltam a se sentir bem-dispostas. O segundo trimestre é conhecido como o “trimestre feliz”, pois todo aquele “desespero” das primeiras semanas costuma desaparecer.
Porém, infelizmente, o bem-estar dura pouco. Conforme o útero e a barriga começam a crescer, o peso do bebê, associado à compressão dos vasos sanguíneos da pelve e do abdômen e à restrição à movimentação do diafragma voltam a deixar a gestante fisicamente esgotada.
A gestante no terceiro trimestre é obrigada a carregar um excesso de peso. O bebê por si só pesa ao redor de 3 quilos. Só de água corporal e líquido aminótico são mais 6 a 8 quilos. Placenta e útero juntos pesam quase 2 quilos.
Portanto, uma gestante, ao final da gravidez, é obrigada a carregar cerca de 12 quilos a mais do que estava acostumada a carregar meses antes. É muito ganho de peso em um intervalo muito curto, não havendo tempo para o corpo de adaptar.
Além disso, a progesterona, sempre ela, também atua nos músculos, tendões, ligamentos e articulações do corpo, alterando o seu funcionamento normal, o que predispõe a gestante a dor e lesões osteo-musculares.
Além do cansaço, o sono volta a incomodar a grávida no terceiro trimestre, desta vez não somente por ação direta da progesterona no sistema nervoso central, mas porque o imenso útero impede que a gestante tenha uma boa noite de sono. Na fase final da gravidez, dormir de barriga para cima ou para baixo é impossível e desaconselhado. A grávida precisa passar a noite de lado e tem grande dificuldade de mudar de posição durante o sono.
Para piorar, a ação direta da progesterona e a compressão da bexiga pelo útero fazem com que a grávida precise urinar a toda hora. Algumas mulheres precisam levantar mais de uma vez durante a noite para fazer xixi, interrompendo o seu já difícil sono.
Portanto, além de todo o cansaço acumulado ao longo do dia pelo excesso de peso, pelas dores, pelo xixi frequente e pela dificuldade de respirar (devido a um útero gigante que comprime o diafragma), a grávida ainda tem dificuldade de repor suas energias durante o sono noturno.
Como atenuar o cansaço da gravidez?
Antes de mais nada, é preciso entender que o sono e o cansaço da gravidez são, na verdade, uma forma do seu corpo lhe avisar que ele precisa de descanso e energia de sobra para desenvolver o bebê. O ponto mais importante é compreender e aceitar isso. As primeiras semanas de gravidez são mesmo para descansar ao máximo e evitar esforços desnecessários.
O sono e a exaustão duram poucas semanas e depois melhoram muito. Durante esse período, evite situações sociais ou profissionais que não sejam essenciais. Dê um descanso para o seu corpo.
O mais importante é dormir sempre que o corpo pede. Obviamente, por questões profissionais, nem sempre isso é possível. Infelizmente, vivemos em uma sociedade que pouco respeita os contratempos de uma gravidez. Se a grávida não tem um barrigão de final de gestação, é pouco provável que algum chefe vá permitir qualquer tipo de alteração nos horários ou na jornada de trabalho, por mais que a gravidez inicial esteja deixando a mulher exausta. De qualquer forma, converse com o seu chefe, veja se você consegue ao longo do dia um ou dois períodos de 15 a 20 minutos para não fazer nada e tentar tirar um cochilo. Pode parecer pouco, mas já ajuda muito.
Se não for possível dormir durante o dia, vá para a cama cedo à noite. Se você já tem filhos, peça ajuda ao marido ou a familiares. Entenda que você precisa dormir mais do que o que estava habituada antes da gravidez. A partir da 16ª semana de gravidez, dê preferência a dormir de lado, principalmente do lado esquerdo; você terá um sono mais agradável.
Evite longos períodos de jejum, pois estes podem piorar o cansaço e os enjoos, e procure se hidratar bem. Beba mais água durante o dia do que à noite para não sentir tanta vontade de urinar de madrugada. Evite bebidas que contenham cafeína, pois esta pode atrapalhar o seu sono.
Coma frutas, verduras, proteínas e carboidratos complexos. Evite alimentos gordurosos. Se você tiver anemia, reposição de ferro costuma ajudar.
Pratique atividades físicas leves, como caminhadas, Yoga ou natação. Por mais que você esteja cansada, leves atividades físicas ajudam a liberar endorfina e melhoram o seu condicionamento cardiorrespiratório, o que, ao longo dos dias, fará você se sentir muito melhor e menos cansada.
Referências
- Sleeping for Two: The Great Paradox of Sleep in Pregnancy – Journal of Clinical Sleep Medicine.
- Daily Sleep and Fatigue Characteristics in Nulliparous Women during the Third Trimester of Pregnancy – Sleep.
- Parity and sleep patterns during and after pregnancy – Obstetrics & Gynecology.
- Living on the edge of being overstretched–a Norwegian qualitative study of employed pregnant women – Health care for women international.
- Sleep patterns and sleep disturbances across pregnancy – Sleep medicine.
- Kryger MH, et al., eds. Sleep and sleep disorders associated with pregnancy. In: Principles and Practice of Sleep Medicine. 6th ed. St. Louis, Mo.: Elsevier Saunders; 2017
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.
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