Colestase da Gravidez – Sintomas e tratamento

A colestase intra-hepática da gravidez é uma complicação que pode surgir no terceiro trimestre de gestação e acomete cerca de 1% das grávidas.
Dr. Pedro Pinheiro
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colestase da gravidez

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Pontos-chaves

O que é: a colestase intra-hepática da gravidez, também conhecida como colestase da gravidez, colestase gravídica ou colestase obstétrica, é uma complicação que pode surgir no terceiro trimestre de gestação e acomete cerca de 1% das grávidas. A colestase se caracteriza pelo aumento dos níveis de bilirrubina no sangue e é causada pela obstrução dos ductos biliares dentro do fígado.

Sintomas: o principal sintoma da colestase da gravidez é uma intensa coceira, principalmente nas palmas das mãos e solas dos pés, que costuma manifestar-se a partir da 30ª semana de gravidez. Icterícia, enjoos e perda do apetite também podem surgir.

Complicações: a colestase está associada a um maior risco de parto prematuro, insuficiência respiratória do recém-nascido e morte intra-uterina.

Tratamento: O tratamento é feito com ácido ursodesoxicólico e indução da gravidez a partir da 37ª semana de gestação.

O que é a colestase intra-hepática da gravidez?

Para que possamos entender a colestase intra-hepática da gravidez, precisamos antes saber o que é a colestase e qual é o papel do fígado e das vias biliares nessa doença.

Nossos glóbulos vermelhos têm uma vida média de 4 meses. Quando eles ficam velhos, são levados para o baço para serem destruídos. Um dos produtos liberados neste processo de destruição é a bilirrubina, um pigmento amarelo-esverdeado.

Todos os dias, milhões de glóbulos vermelhos são destruídos e toda a bilirrubina liberada é levada pela corrente sanguínea para o fígado, onde ela será metabolizada.

No fígado, a bilirrubina vinda do sangue, chamada de bilirrubina indireta, é transformada em bilirrubina direta, que é uma forma hidrossolúvel mais fácil de ser excretada.

Quando o fígado funciona normalmente, a bilirrubina direta é drenada pelos ductos intra-hepáticos em direção ao ducto biliar comum e, posteriormente, em direção aos intestinos, onde ela vai se misturar às fezes e ser eliminada do organismo.

Colestase da gravidez
Vias biliares intra e extra-hepáticas

Chamamos de colestase qualquer situação na qual há redução ou obstrução dessa drenagem da bilirrubina. Dizemos que a colestase é intra-hepática quando a obstrução encontra-se nos ductos dentro do fígado, ou extra-hepática quando o problema está localizado nas vias biliares, fora do fígado.

A obstrução à drenagem da bilirrubina faz com que esse pigmento acumule-se no sangue e subsequentemente na pele.

A colestase intra-hepática da gravidez é, conforme diz o nome, um quadro de colestase que tem origem no fígado e surge durante a gravidez.

Causas

O mecanismo pelo qual a colestase da gravidez se desenvolve ainda não foi completamente esclarecido. A doença provavelmente envolve uma combinação de fatores genéticos, hormonais e ambientais.

Especula-se que os hormônios da gravidez ajam diretamente sobre o transporte da bile nos ductos intra-hepáticos, provocando um atraso considerável do seu escoamento.

As razões pelas quais achamos que o estrogênio e a progesterona têm um papel primordial no surgimento da colestase intra-hepática da gravidez são as seguintes:

  • A colestase surge quase que exclusivamente no 3ª trimestre de gestação, fase em que esses hormônios estão no seu pico.
  • Gestações de gêmeos, que apresentam níveis de estrogênio e progesterona mais elevados, apresentam maior incidência de colestase do que as gestações não-gemelares.
  • O quadro de colestase costuma melhorar rapidamente após o fim da gravidez, junto com a queda abrupta dos níveis hormonais.
  • A colestase costuma surgir ainda no primeiro trimestre de gestação nas mulheres que, quando tentavam engravidar, submeteram-se a estimulação ovariana com hormônios.
  • Fora da gravidez, a colestase é mais comum em mulheres que tomam anticoncepcionais à base de estrogênio e progesterona.

Mas somente os níveis elevados de hormônios não são suficientes para justificar o aparecimento da colestase, que acomete apenas 1 em cada 100 grávidas.

Uma predisposição genética parece também ser necessária e explica porque a doença tem forte componente familiar e étnico. Em algumas populações, a incidência da colestase é bem baixa, ao redor de 1 caso para cada 1000 gestações (0,1%). Em alguns países, porém, como no Chile, a taxa é de 2% e chega a ser de 27% se considerarmos apenas as mulheres de etnia araucana (ameríndios).

Por motivos ainda não esclarecidos, a colestase gravídica é mais comum no inverno, principalmente nos países de clima frio, como a Suécia, Finlândia e o próprio Chile.

Sintomas

Os principais sinais e sintomas da colestase obstétrica surgem a partir do 3º trimestre de gravidez e são provocados pelo aumento da concentração de bilirrubina no sangue e sua consequente deposição na pele.

O sintoma mais característico é a coceira nas palmas das mãos e nas plantas dos pés, que surge sem que haja qualquer lesão visível na pele e pode se espalhar pelo resto do corpo, como barriga, tronco e face. Apesar não haver lesões inicialmente, com o tempo, de tanto ser coçada, a pele pode começar a apresentar escoriações.

Essa comichão é mais comum à noite e a sua intensidade varia de moderada a grave, a ponto de atrapalhar o já atribulado sono da gestante.

É importante ressaltar que é muito comum as grávidas terem algum grau de coceira no final da gravidez, principalmente na barriga, sem que isso tenha qualquer significado clínico. Somente quando o prurido é muito intenso e persistente é que precisamos nos preocupar com a possibilidade de ser colestase gravídica.

Em cerca de 25% das gestantes, uma a quatro semanas após o início da coceira, podem surgir outros sinais e sintomas, tais como Icterícia (pele amarelada), perda do apetite, náuseas, dor abdominal – principalmente no quadrante superior direito do abdômen -, fezes muito claras, esteatorreia (gordura nas fezes), urina escurecida, cansaço e demora para coagular o sangue.

A maioria das grávidas com coceira na fase final da gravidez não tem colestase. Mas se o prurido for intenso e acometer palmas das mãos e solas dos pés, o obstetra deve ser informado.

Complicações

Maternas

Da parte da mãe, o principal problema costuma ser o maior risco de sangramento durante o parto, que decorre da esteatorreia e consequente má-absorção da vitamina K, um fator essencial para a coagulação normal do sangue. Essa complicação, felizmente, é pouco comum.

Fetais

A colestase gravídica é um problema muito mais grave para o feto do que para a mãe. Como a bilirrubina atravessa a barreira placentária, ela acumula-se facilmente no líquido amniótico e no organismo do bebê.

Entre as complicações fetais possíveis da colestase intra-hepática da gravidez as três mais importantes são:

  • Parto prematuro.
  • Síndrome do desconforto respiratório do recém-nascido (provocada pela presença de bilirrubina nos pulmões).
  • Morte fetal intra-uterina.

Diagnóstico

A colestase hepática é diagnosticada quando a gestante apresenta as seguintes alterações:

  • Coceira intensa e persistente, principalmente nas mãos e nos pés, iniciada no 3º trimestre de gravidez.
  • Níveis sanguíneos elevados de bilirrubina.
  • Níveis sanguíneos elevados de transaminases (TGO e TGP).

Tratamento

O tratamento da colestase da gravidez tem dois objetivos: aliviar os sintomas da mãe e reduzir o risco de complicações para o feto.

Para tais fins, um medicamento chamado ácido ursodesoxicólico é atualmente o mais utilizado.

A dose de 300 mg de ácido ursodesoxicólico, 2 ou 3 vezes por dia, é capaz de atingir os seguintes resultados:

  • Redução da coceira em mais de 60% dos casos.
  • Redução dos níveis sanguíneos de TGO e TGP.
  • Redução dos níveis sanguíneos de bilirrubina.
  • Redução de 67% no risco de síndrome do desconforto respiratório do recém-nascido.
  • Redução de 44% no risco de parto prematuro.

Para reduzir a exposição do feto à bilirrubina, atualmente recomenda-se a indução do parto quando a gravidez atinge 37 semanas. Alguns médicos esperam até 38 ou 39 semanas, se o tratamento com ácido ursodesoxicólico tiver sido muito eficaz, com resolução do prurido materno e grande queda nos valores de bilirrubina.

Por outro lado, a interrupção da gravidez com menos de 36 semanas deve ser considerada nos casos mais graves que não respondem ao tratamento.


Referências


Autor(es)

Dr. Pedro Pinheiro

Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.

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