Cistite Intersticial: síndrome da bexiga dolorosa

Dr. Pedro Pinheiro

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Tempo de leitura estimado do artigo: 4 minutos

O que é cistite intersticial?

A cistite intersticial, também conhecida por cistite crônica ou síndrome da bexiga dolorosa, é uma condição que afeta principalmente as mulheres e se caracteriza por dores recorrentes na bexiga, semelhantes àquelas que surgem nos quadros de infecção urinária.

A síndrome da bexiga dolorosa é uma doença ainda pouco conhecida, pela população em geral e até por alguns profissionais de saúde, e suas causas ainda não estão esclarecidas.

Uma definição aceitável para a cistite crônica é: existência de incômodo (dor, ardência, peso, pressão, desconforto etc.) na região da bexiga com duração de pelo menos 6 semanas, associado a outros sintomas de infecção urinária, sem, porém, haver de fato sinais de infecção da bexiga.

Na verdade, o nome síndrome da bexiga dolorosa é melhor que cistite intersticial ou cistite crônica, já que o termo cistite indica inflamação da bexiga, fato que não existe na maioria dos pacientes com esta doença.

Em apenas 10% dos casos é possível encontrar alterações na bexiga que justifiquem a dores. Em geral, são pequenas placas ulcerosas que se tornam visíveis quando a bexiga está muito distendida. Nos 90% dos casos restantes, porém, nem mesmo a biópsia da bexiga é capaz de encontrar alterações relevantes nas células. Acredita-se que os pacientes com síndrome da bexiga dolorosa apresentem alterações no funcionamento dos nervos da bexiga, tornando-os mais sensíveis.

Há uma corrente que trata a síndrome da bexiga dolorosa como uma variante de outras síndromes dolorosas, como a síndrome do intestino irritável ou a fibromialgia. Na verdade, é comum o paciente ter duas ou até essas três doenças ao mesmo tempo.

A síndrome da bexiga dolorosa acomete mais mulheres do que homens. Cerca de 9 em cada 1000 mulheres tem sintomas de cistite crônica. Nos homens, essa taxa é de apenas 0,6 para cada 1000. Praticamente todos os paciente com cistite intersticial são de etnia caucasiana (brancos) e os sintomas costumam surgir após os 40 anos, apesar de também haver casos em crianças.

Sintomas

O principal sintoma da síndrome da bexiga dolorosa é um desconforto da bexiga, geralmente associado ao fato dela estar cheia.

As características deste incômodo variam entre os indivíduos e ao longo do curso da doença. Alguns pacientes queixam-se de dor, enquanto outros descrevem a sensação como “uma pressão” ou “um desconforto”. Ainda há alguns pacientes relatam espasmos da bexiga.

Os sintomas podem variar de um dia para o outro, e a intensidade da dor pode ser descrita como uma leve a pressão até uma intensa dor debilitante.

Em muitos pacientes, a cistite crônica é um quadro de dor crônica incapacitante, influenciando no rendimento no trabalho e nas relações pessoais. A dor, o aumento da frequência urinária e o cansaço podem provocar uma degradação da qualidade de vida. Há pacientes que precisam urinar de 30 em 30 minutos.

Entre os sintomas mais comumente relacionados à síndrome da bexiga dolorosa estão:

SintomasFrequência
Urgência para urinar 57 a 98%
Vontade constante de urinar 84 a 97%
Dor 66 a 94%
Necessidade de acordar à noite para urinar 44 a 90%
Disúria (dor ao urinar) 71 a 98%
Dor na região suprapúbica 39 a 71%
Dor na região do períneo 25 a 56%
Espasmos da bexiga 50 a 74%
Sensação de pressão na região púbica 60 a 71%
Dor vaginal durante o ato sexual 46 a 80%
Depressão 55 a 67%
Hematúria (sangue na urina) 14 a 33%

A localização do desconforto da bexiga é geralmente descrita como sendo acima do púbis ou na região da uretra, embora dor abdominal inferior unilateral ou dor lombar associada à bexiga cheia também sejam observadas em alguns casos.

Quanto ao aparecimento dos sintomas, a maioria dos pacientes descrevem um início gradual, com agravamento do desconforto, urgência urinária e frequência ao longo de um período de meses. Um grupo menor de pacientes descrevem os sintomas como abruptos e graves desde o seu início. Alguns pacientes são até capazes de citar a data exata em que os sintomas começaram.

Exacerbações dos sintomas podem ocorrer após a ingestão de certos alimentos ou bebidas, durante o estresse, quando se fica muito tempo sentado, ou depois de certas atividades, como, por exemplo, exercício físico ou sexo.  A dor da cistite crônica pode também se agravar durante a segunda metade do ciclo menstrual.

Na maioria dos pacientes não é possível identificar um evento que sirva de gatilho para o início dos sintomas. Porém, em alguns, a cistite crônica surge após um episódio de infecção urinária, um procedimento cirúrgico ou trauma na região do cóccix.

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Uma característica importante da síndrome da bexiga dolorosa é o fato do exame de urina não apresentar sinais de infecção urinária. O exame de urina simples (EAS ou urina tipo I) são sempre normais e a urocultura é repetidamente estéril (negativa). Eventualmente, o paciente pode apresentar hematúria (sangue na urina) o que acaba por dificultar o diagnóstico devido a série de outras alterações urinárias que devem ser descartadas antes de se pensar em cistite crônica.

A presença de uma urocultura positiva dentre várias negativas não invalida o diagnóstico de cistite intersticial, pois nada impede que a paciente com síndrome da bexiga dolorosa possa ter uma infecção urinária, como qualquer outra pessoa. O problema é que mesmo tratando e eliminado a bactéria, se paciente tiver mesmo cistite crônica, os sintomas irão persistir.

O exame físico do paciente com suspeita de cistite crônica geralmente inclui um exame ginecológico completo nas mulheres e um exame de toque retal nos homens. Muitas vezes, os pacientes apresentam sensibilidade no abdômen, quadris e nádegas. As mulheres têm sensibilidade na vagina e ao redor da bexiga, e os homens no escroto e pênis. Por esta razão, o exame médico pode ser desconfortável.

Tratamento

Não existe um tratamento simples para eliminar os sinais e sintomas da cistite intersticial. Do mesmo modo, não há um tratamento que funcione para todos. O que pode funcionar para um paciente, pode não fazer efeito algum para outro. Por isso, o paciente com síndrome da bexiga dolorosa pode precisar experimentar vários tratamentos ou combinações de tratamentos antes de encontrar uma abordagem que alivie os seus sintomas.

Um dos objetivos do tratamento é ensinar o paciente a evitar fatores que possam agravar o quadro. Identificar alimentos, atividades e situações que desencadeiam os sintomas é importante para a melhora da qualidade de vida. O cigarro costuma piorar os sintomas, portanto, parar de fumar é importante.

A síndrome da bexiga dolorosa não é um distúrbio psicológico, mas os sintomas podem ser agravados por estresse, ansiedade, depressão ou outros fatores psicológicos. Além disso, a doença em alguns casos é tão severa que pode causar dificuldades nos relacionamentos, no trabalho, na escola e no dia-a-dia em geral. Apoio psicológico pode ser útil para lidar com estes problemas.

Entre as drogas que podem ser usadas para controle dos sintomas estão os analgésicos, anti-inflamatórios e antidepressivos (geralmente amitriptilina).

Há uma droga desenvolvida especificamente para o tratamento da cistite intersticial, chamada polissulfato sódico de pentosana, comercializada sob o nome Elmiron® ou Cistosan®. Este medicamento foi desenvolvido para reparar o revestimento da bexiga em pessoas com síndrome da bexiga dolorosa. Estudos têm mostrado que esta medicação é realmente eficaz em reduzir os sintomas de alguns pacientes, embora, raramente, faça com que os sintomas desaparecem completamente. O polissulfato sódico de pentosana precisa ser tomado por três a seis meses antes que qualquer benefício possa ser identificado.

Uma outra droga muito usada no tratamento da cistite crônica é o dimetilsulfóxido (DMSO), administrada diretamente na bexiga através de um cateter vesical. As administrações são habitualmente semanais por seis a oito semanas. O DMSO não é eficaz em todos os pacientes e, em alguns casos, pode causar agravamento temporário da dor. Esta droga, porém, tem sido usada durante muitos anos, sendo considerada como sendo muito segura e sem efeitos secundários de longa duração.

A estimulação elétrica transcutânea (TENS) usa pulsos elétricos suaves para aliviar a dor pélvica e, em alguns casos, reduzir a freqüência urinária. Fios elétricos são colocados na parte inferior das costas ou logo acima da região pubiana. Pulsos elétricos são administrados por minutos ou horas, duas ou mais vezes ao dia, dependendo da resposta do paciente.


Referências


Autor(es)

Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.

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27 respostas para “Cistite Intersticial: síndrome da bexiga dolorosa”

  1. MARGARETH MARTINS
    sinto dores no canal da urina e ardencia no outro canal, nao consigo andar e sentar e quando estou com gases tenho dificuldade para urinar, costumo entrar no chuveiro entao consigo urinar, nao durmo, pois se ficar muito tempo se urinar nao consigo sozinha, so entrando em baixo da agua no chuveiro
  2. Sônia Sofá Silva
    Muito obrigada , esclarecedor demais,fui em 2 urologista renomados e nao tive um esclarecimento como esse, muito obrigado.O mundo precisa de pessoas assim como o senhor.Orgulho do nosso país.
  3. Andrea
    Dr sinto muita cólica na área dá bexiga urino muito,mas em pequenas quantidades e tbm agora estar se estendendo essa dor para minha lombar pode ser bexiga dolorosa?????
    Me ajude dr Pedro
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro
      Dr. Pedro Pinheiro
      É uma possibilidade, mas o quadro tem que ser bem investigado antes de fechar qualquer diagnóstico.
  4. daurio valdino de lara
    eu ja entendi que eu tenho a Cistite intersticial o que é interessante que leva um bom tempo sem me dar as dores
    mas se tomo uma coca cola ou tomo um suco de limão quase morro de dor, a minha pergunta se existe cura para a Cistite Intersticial Dr. Pedro Pinheiro.
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro - MD. Saúde
      Dr. Pedro Pinheiro - MD. Saúde
      Há em alguns casos. Mas nem todo mundo consegue se livrar das dores.
  5. Maria Garcia
    Dr Pedro, em mulheres gravidas piora? Moro na Inglaterra e aqui so receitam Paracetamol. Nao existe Pyridium aqui, por exemplo. Nunca me encaminharam a um especialista. Vou voltar ao Brasil para ter o bebe, pois aqui e jurassico. O que posso fazer para amenizar?
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro - MD. Saúde
      Dr. Pedro Pinheiro - MD. Saúde
      Pode piorar na gravidez, sim. Sobre o que você pode fazer, lamento, mas à distância eu não posso indicar tratamentos, principalmente para uma gestante.
  6. Karin Gabel
    Olá, há alguns anos eu fui diagnosticada com essa síndrome. Mas não encontrei um tratamento. Os sintomas voltaram agora e estão piores. Saberia me indicar médicos em Belo Horizonte que tratam essa síndrome? Meu e-mail é [email protected] . Muito obrigada!
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro - MD. Saúde
      Dr. Pedro Pinheiro - MD. Saúde
      Lamento, mas eu não vivo no Brasil. Não conheço ninguém para lhe indicar.
  7. Andréia Leivas da Silva
    ola, estou com medo de ter Cistite intersticial (não tenho dor na bexiga, mas um incomodo na uretra). Desde setembro ando tendo varias cistites, no meu EQU feito no mês passado estava tudo OK (não deu nada de errado), mas no EQU que fiz este mês deu: leucócitos – 8 por campo, Tecido epitelial: 6 por campo e presença de cristais de oxalato. Na minha urocultura não apareceu nenhuma bactéria. Pergunta: Cistite intersticial apresenta infecção da bexiga? Se positivo, um dos diagnósticos possíveis no meu caso é CI?
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro - MD. Saúde
      Dr. Pedro Pinheiro - MD. Saúde
      A cistite intersticial é uma inflamação sem infecção. A urocultura é sempre negativa.
  8. Luciana Nogueira
    Oi tenho 34 anos e a pelo menos 12 sofro com ardência ao urinar, vou ao urologista que faz muitos exames de urina, raio x, ultrassom e nada detecta.
    Agora além da ardência também estou com uma sensação de inchaço no pé da barriga, dor na região da bexiga, sensação que tem algo pesado dentro de minha bexiga, vou várias vezes no dia e principalmente a noite ao banheiro urinar.
    Será que setou com essa doença?
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro - MD. Saúde
      Dr. Pedro Pinheiro - MD. Saúde
      É possível.
  9. rosangela dos santos
    ola ..tenho essa doença faz uns 3 anos..nao concegui curala ainda….sindrome da bexiga dolosa..e que o meu urologista falo…..nao sei mais o que faze…fiz varios tratamentos
  10. Kenia Carneiro
    acho que sofro dessa doença ja fui em varios medicos e fiz varios exames ate que largue pq medico nenhum sabia me dizer o que eu tinha um ate chegou a dizer POXA VC ME APERTOU SEM ME ABRAÇAR…
  11. layene
    ola Dr sofro com essa doença desde 17 anos estou com 30 tive bebe com 25 anos na gravidez foi muito difícil mas depois que meu filho nasceu fiquei 5 anos sem ter dor. agora ela voltou com tudo estou tomando antidepressivos e nada de passar a dor. Gostaria de saber se é possível essa doença desaparecer e não voltar mais?
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro - MD. Saúde
      Dr. Pedro Pinheiro - MD. Saúde
      Em alguns casos sim.
  12. Vilma
    Dr.Sofro com CI desde 2001,desde então aconpanho tudo que fale desta doença terrivel.Já fiz hidrodistenção,aplicação com heparina,Botox e dmso.O botox tirou minha dor mas tive efeito colateral,paralisou minha bexiga por 1 ano e dois meses,tive que fazer cateterismo intermitente até 8 vezes ao dia,desde enER COM ESTA DOENÇAIVtão acho que meu quadro piorou com o botox,fiz essa aplicação em 2010.Dr se sabe de algo novo neste tratamento?E muito dificil conviver com esta doença.Estou no auxilio doença desde 2011 pois não tenho condições de retornar ao trabaho.Sem contar que tomo antidepressivo e medicamentos a base de Codeina.
    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro - MD. Saúde
      Dr. Pedro Pinheiro - MD. Saúde
      O texto está atualizado com os tratamentos existentes. A cistite intersticial pode ser realmente uma doença muito difícil de tratar.
  13. Ana
    Excelente matéria. Tenho cistite crônica e meu médico nunca conversou comigo sobre síndrome da bexiga dolorosa. Acho que descobri meu diagnóstico. Obrigado a todos pelo esclarecedor trabalho.
    1. carolina
      ola….eu já tive essa doença. terrivel, foram 9 meses de dor extrema. os medicos queriam operar, colocar algo na bexiga que ate esqueci o nome. mas por sorte encontrei um urologista que me indicou um FISIOTERAPEUTA. e o que a fisioterapia tem a ver ne….tudoooo…fiz uma fisio especifica para a bexiga com ultrassom e mais umas coisas que nao recordo pois faz 6 anos ja….o importante ME CUREI…sou grata por ter encontrado esse anjo. sofri demais e queria te falar isso. bom, nao sao todos fisios q fazem, moro em curitiba ele e daqui. caso queria te passo o tel dele. espero ter ajudado.
      1. Maria Neide da Silva
        Olá Carolina,
        Como eu também estou passando pelo mesmo problema, fiquei feliz de saber que a fisioterapia curou vc. Vou falar com o urologista sobre essa tentativa, pois estou sofrendo muito com isso. Abraços
      2. Leonardo Nepomuceno
        Olá Carolina, tenho uma amiga que está sofrendo demais com esta doença. Ela mora em Cuiabá. Esto fazendo pesquisa na internet para ajudá-la. Você teria o telefone dessa fisioterapeuta?
      3. camieli
        Ola tenho o mesmo problema pode me passar o numero desse fisio por favor
      4. Tiana
        eu gostaria de saber se alem da Fisio vc tomo medicamento??
  14. Rodrigo
    Acho que tenho isso ai