Estresse pós-traumático: sintomas e tratamento

Dr. Pedro Pinheiro

Atualizado em

comment 3 Comentários

Tempo de leitura estimado do artigo: 4 minutos

O que é o transtorno do estresse pós-traumático?

O transtorno do estresse pós-traumático é um problema de saúde mental que algumas pessoas desenvolvem após eventos traumatizantes, tais como acidentes, desastre natural, violência urbana, abuso sexual, terrorismo ou situações de guerra.

O evento traumatizante não precisa necessariamente ter ocorrido com o paciente, ele pode simplesmente ter sido uma testemunha da tragédia, como, por exemplo, ver alguém sendo assassinado.

É importante destacar que é absolutamente normal ter memórias perturbadoras, sentir-se inseguro ou ter dificuldades para dormir após qualquer evento que tenha posto a sua vida em risco. Em geral, esses sentimentos vão ficando mais brandos conforme o tempo passa, e o indivíduo consegue manter-se profissional e socialmente estável.

No transtorno do estresse pós-traumático, porém, os sintomas de angústia e estresse não melhoram mesmo após meses ou anos. Em muitos casos, eles até pioram e passam a atrapalhar a vida pessoal e profissional do paciente.

Conforme veremos mais adiante, as pessoas que possuem TEPT apresentam uma série de sinais e sintomas físicos e emocionais e costumam sentir-se estressadas ou assustadas mesmo quando claramente não estão em perigo.

Causas

Várias são as situações de trauma que podem resultar no quadro de estresse pós-traumático.

Até 20% das pessoas expostas a eventos traumáticos acabam desenvolvendo o TEPT. Esse número sobe para quase 70% quando consideramos apenas situações de tragédias.

Estima-se que em toda a população, até 8% das pessoas irão desenvolver um quadro de estresse pós-traumático ao longo das suas vidas.

Um estudo da Harvard Medical School com mais de 47 mil pessoas em 24 países pesquisou o surgimento da TEPT após 29 tipos de eventos traumáticos diferentes e chegou aos seguintes números:

  • 33% dos casos foram provocados por violência sexual, como estupro, abuso sexual infantil ou violência do parceiro.
  • 30% ocorreram por experiências traumáticas com familiares ou amigos próximos, como, por exemplo, morte inesperada de uma pessoa próxima, doença potencialmente fatal de um filho ou um evento traumático envolvendo um familiar.
  • 14% surgiram em situações de violência organizada, tais como zonas de guerra, refugiados, sequestros, assaltos, terrorismo, encontrar acidentalmente cadáveres ou testemunhar assassinatos.
  • 12% dos casos foram causados violência interpessoal, como abuso físico na infância, agressão física, bullying, ameças de violência ou testemunho de violência contra outros.
  • 11% foram provocados por eventos traumáticos acidentais, como, por exemplo, colisão grave de veículo, sobreviventes de acidentes aéreos, desastres naturais ou exposição a substâncias químicas tóxicas.

Nas mulheres, a violência sexual é disparada a causa mais comum de TEPT, representando mais de 60% dos casos.

Sintomas

Os sintomas do transtorno do estresse pós-traumático costumam surgir nos primeiros 3 meses após o evento traumático. Em cerca de 25% dos pacientes, porém, a TEPT só surge após 6 meses. E há também os casos nos quais os sinais do estresse pós-traumático surgem somente após vários anos.

A maioria dos indivíduos que experimentam um episódio relevante de trauma reage de forma negativa quando se lembra do ocorrido. Nos pacientes com TEPT, no entanto, essa resposta negativa é muito mais intensa e provoca alterações afetivas e comportamentais. Muitas vezes, o paciente revive o trauma como se ele estivesse acontecendo novamente naquele exato momento.

Os pacientes com transtorno do estresse pós-traumático sabendo que essa reação negativa é incontrolável tentam de tudo para evitar qualquer situação que possa lembrá-los do trauma. Isso pode resultar em entorpecimento emocional, interesse diminuído nas atividades diárias e, em casos extremos, pode resultar em desapego aos amigos e familiares.

Se o quadro de estresse surgido após um evento traumático tiver duração de apenas 4 semanas, dizemos que o paciente teve um transtorno de estresse agudo. Por outro lado, se o quadro persistir após 4 semanas, dizemos que o paciente tem transtorno do estresse pós-traumático.

Para que o diagnóstico do TEPT possa ser feito, o paciente precisa ter idade superior a seis anos e apresentar todos os critérios de A a H descritos abaixo:

A. Exposição ou ameça real de morte, lesão grave ou violência sexual em uma ou mais das seguintes maneiras:
1. Experimentando diretamente o evento traumático.
2. Testemunhando pessoalmente o evento traumático de outras pessoas.
3. Tomando ciência de que o evento traumático ocorreu a um familiar próximo ou amigo íntimo.
4. Experimentando exposição repetida ou extremamente detalhada de eventos traumáticos (por exemplo: profissionais que coletam restos humanos de acidentes ou crimes ou policiais repetidamente expostos a detalhes de abuso infantil).

B. Presença de um ou mais dos seguintes sintomas de intrusão (lembranças indesejadas) associados ao evento traumático em uma ou mais das seguintes maneiras:
1. Recordação angustiante do evento traumático que surge de forma recorrente, involuntária e intrusiva.
2. Pesadelos recorrentes nos quais o conteúdo do sonho está relacionado ao evento traumático (nas crianças, os pesadelos podem não ter conteúdo reconhecível).
3. Reações dissociativas, tipo flashbacks, nos quais o indivíduo desliga-se do mundo e reage como se o evento traumático esteve novamente acontecendo (nas crianças os flashbacks podem surgir em forma de brincadeiras).
4. Sinais de angústia marcada após exposição a fatos que simbolizam ou se assemelham ao  evento traumático.

C. Fuga constante de estímulos que possam estar associados ao evento traumático em pelo menos uma das seguintes maneiras:
1. Esforços constantes para evitar lembranças, pensamentos ou sentimentos angustiantes associados ao evento traumático.
2. Esforços constantes para evitar o contato com elementos externos que despertem lembranças, pensamentos ou sentimentos angustiantes sobre evento traumático, tais como pessoas, lugares, conversas, atividades ou objetos.

D. Alterações negativas da cognição e do humor associadas ao evento traumático evidenciada por dois ou mais dos seguintes:
1. Incapacidade de se lembrar de detalhes importantes do evento traumático, geralmente devido à amnésia dissociativa.
2. Exageradas crenças ou expectativas negativas sobre si mesmo ou outros, como, por exemplo: “Eu sou uma pessoa má”, “Ninguém é confiável”, “O mundo é muito perigoso” ou “Meu sistema nervoso inteiro está permanentemente arruinado”.
3. Percepção distorcida sobre as causas ou consequências do evento traumático, que levam o indivíduo a culpar a si próprio ou outros pelo ocorrido.
4. Persistente estado emocional negativo (medo, terror, raiva, culpa ou vergonha).
5. Redução marcante do interesse ou da participação em atividades que antes eram comuns.
6. Sentimentos de desapego ou distanciamento de amigos ou familiares
7. Incapacidade de experimentar emoções positivas (felicidade, satisfação, carinho ou sentimentos amorosos).

E. Exagerada excitação ou reação associadas ao evento traumático evidenciada por dois ou mais dos seguintes:
1. Irritação frequente ou explosões de raiva, sem motivo justificável, normalmente expressa como agressão verbal ou física em relação a pessoas ou objetos.
2. Comportamento imprudente ou autodestrutivo.
3. Hipervigilância.
4. Persistente estado de alarme.
5. Problemas com a concentração.
6. Perturbação do sono.

F. Os sinais e sintomas descritos nos critérios B, C, D e E apresentam duração superior a uma mês.

G. Os sintomas causam comprometimento significativo nas áreas sociais, profissionais ou familiares.

H. O quadro clínico não pode ser atribuído a outras doenças ou ao uso de substâncias químicas, tais como drogas, álcool ou medicamentos.

Tratamento

O tratamento efetivo do TEPT inclue medicamentos e psicoterapia.

Psicoterapia

Existem diversas técnicas de psicoterapia que auxiliam no tratamento da TEPT. A mais utilizada é a chamada terapia de exposição.

A terapia de exposição ajuda os pacientes a confrontar suas memórias de uma forma terapêutica. Reviver o trauma através desta forma de terapia permite que o paciente processe emocionalmente seus sentimentos, tornado-os menos dolorosos.

Ao confrontar repetidamente suas memórias traumáticas, o indivíduo pode revivê-las de forma segura até que ele entenda que as lembranças em si não são perigosas e que o evento traumático real já acabou.

Muitos pacientes evitam suas memórias a todo custo, não só porque a sensação é muito ruim, mas também porque creem que relembrar o trauma agrava o seu quadro psicológico. Porém, o que ocorre é o oposto. Com o tratamento, cada lembrança vai se tornando menos angustiante e mais fácil de ser lidada.

A terapia de exposição muitas vezes utiliza locais ou situações associadas ao evento traumático, como, por exemplo, voltar ao local do acidente automobilístico. Os eventos traumáticos também podem ser revividos através de descrição verbal, escrita ou por meios mais modernos, como a realidade virtual.

A terapia de exposição costuma estar associada a técnicas de controle da ansiedade e de relaxamento.

Medicamentos

Os antidepressivos da classe dos inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRS) são os medicamentos de primeira linha no tratamento do transtorno do estresse pós-traumático. Entre os fármacos mais utilizados podemos citar: paroxetina, sertralina, fluoxetina ou escitalopram.

Outra opção viável são os antidepressivos inibidores seletivos da recaptação da serotonina-norepinefrina (ISRSN), como a venlafaxina.

O tratamento costuma ser feito por, pelo menos, 6 meses a 1 ano.

A quetiapina e a risperidona são as opções para os pacientes que não respondem satisfatoriamente aos antidepressivos de primeira linha.

Nos pacientes com pesadelos, o anti-hipertensivo prazosin associado ao tratamento de primeira linha costuma ter boa resposta.


Referências


Autor(es)

Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.

Saiba mais

Artigos semelhantes

Ficou com alguma dúvida?

Comentários e perguntas

Deixe um comentário


3 respostas para “Estresse pós-traumático: sintomas e tratamento”

  1. Aline

    Hoje, minha psicóloga disse que tenho características de quem sofre de TEPT. Lendo seu artigo, vi que realmente me identifico com vários itens de todos os critérios. :/

  2. Roberta

    A pandemia do Covid pode causar estresse pós-traumático?

    1. Avatar de Dr. Pedro Pinheiro
      Dr. Pedro Pinheiro
      Sim, com certeza, tanto para os pacientes, quanto para os familiares e para os profissionais de saúde.